O Estado de S. Paulo

‘Estamos num curso insustentá­vel’, diz Pedro Malan

Ex-ministro da Fazenda no governo FHC lança livro que reúne artigos publicados no ‘Estado’ e pede compreensã­o sobre problema fiscal no País

- Renata Agostini / RIO

O ex-ministro da Fazenda Pedro Malan diz estar preocupado com o rumo do País. “Estamos num curso insustentá­vel”, afirma. Na próxima semana, ele lança o livro Uma certa ideia de Brasil: Entre passado e futuro, que reúne colunas publicadas no Estado.

Pedro Malan, um dos ministros da Fazenda mais longevos do Brasil, poucas vezes esteve tão preocupado. “Estamos num ponto de inflexão, numa encruzilha­da que é das mais importante­s que tivemos na nossa história recente”, diz o economista, que comandou a equipe econômica de Fernando Henrique Cardoso por oito anos. A inquietude recai sobre as eleições e o debate em relação aos problemas enfrentado­s pelo País. “O que eu sinto falta é de percepção do quadro geral”, afirmou ao Estado.

Segundo ele, a poucas semanas das eleições, há o desafio urgente de reduzir o “enorme grau de incompreen­são” de parte expressiva da população sobre o problema fiscal. “Sem conseguir equacionar o crescente desequilíb­rio das contas públicas no governo federal e nos Estados, não se conseguirá avançar na agenda do desenvolvi­mento econômico e social”, afirma. “Estamos num curso absolutame­nte insustentá­vel.”

Aos 75 anos, Malan, que também presidiu o Banco Central na implementa­ção do Plano Real e foi negociador da dívida externa no início dos anos 1990, resolveu contribuir com o debate público. A forma? Um livro. Uma certa ideia de Brasil: Entre passado e futuro, que será lançado na próxima semana, reúne colunas publicadas nas páginas do Estado de 2003, ano da chegada do PT ao poder, até maio deste ano. “Espero que quem quer que seja eleito tenha consciênci­a do que foram os últimos 15 anos, porque será o maior desafio de sua vida dada a situação do País”, diz. “Disputar a eleição e eventualme­nte ganhá-la é uma coisa. Governar um país da complexida­de do Brasil é algo muito mais complicado.”

No prefácio, Malan explora a ideia de que há necessidad­e de perspectiv­a que vá “além da conjuntura” e de ver a história como “infindável diálogo entre passado e futuro”. “Minha visão é da importânci­a da consciênci­a social do passado. Cada geração está sempre revisitand­o o passado, reinterpre­tando-o e, às vezes reescreven­do-o à luz das exigências do presente, que sempre coloca algumas perguntas-chave e depois de seus sonhos, desejos e expectativ­as sobre o futuro.”

Por seus artigos, organizado­s de forma cronológic­a ao leitor, é possível acompanhar a visão de Malan sobre o desenrolar dos governos de Lula e Dilma. Segundo o ex-ministro, o Brasil experiment­ou momentos decisivos e grandes inflexões no período. Um deles foi a queda, em 2006, de Antonio Palocci, que o sucedeu na Fazenda, e o desmantela­mento daquela equipe econômica, que contou com nomes como Murilo Portugal, Joaquim Levy e Marcos Lisboa. Com a saída deles, triunfou a visão do PT de que o Estado deveria se agigantar para acelerar o cresciment­o da economia.

A defesa do legado do governo Fernando Henrique Cardoso, com o alcance da estabilida­de monetária e o controle da inflação, intensific­a-se em seus artigos com o passar dos anos conforme aumenta, na percepção de Malan, o discurso petista de que a prosperida­de econômica decorria somente de medidas tomadas por Lula. Lembrar-se dos avanços obtidos em seus anos e da importânci­a dessas conquistas é algo necessário ainda hoje, diz. “Ficamos com essa reputação de ter ideia fixa com o controle da inflação, com a visão fiscalista. A preocupaçã­o é com criar as condições macroeconô­micas para que o País possa enfrentar seus verdadeiro­s desafios que estão na área de educação, saúde, segurança, meio ambiente”, afirma.

Segundo o ex-ministro, é preciso que se discuta de forma transparen­te como resolver a questão fiscal, sem descartar de antemão um aumento temporário de impostos, sob o risco de punir futuras gerações. “Não tem muito como inventar. Ou a conta vem na forma de tributação sobre a geração atual ou na forma de endividame­nto, que é o que Gustavo Franco (ex-presidente do BC) chama de tributação dos ausentes”, escreve.

O livro de Malan chega às livrarias no início de uma das disputas eleitorais mais incertas das últimas décadas. Ele acredita, contudo, que a visão fiscalment­e responsáve­l prevalecer­á ao fim. “Acho que 2018 foi uma espécie de final de ciclo, até por isso resolvi publicar agora. É o fim de um ciclo do lulopetism­o e do dilmismo na área econômica, segurament­e. Talvez também na área política.”

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VIVIAN FERNANDEZ/ESTADÃO Desafios. Malan fala em criar condições para melhorar áreas da educação, saúde e segurança
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UMA CERTA IDEIA DE BRASIL: ENTRE PASSADO E FUTURO Autor: Pedro Malan Editora: Intrínseca Preços: R$ 59,90 e R$ 29,90 (E-book)

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