O Estado de S. Paulo

Chavismo usou câmbio negro para desviar US$ 1,2 bilhão

Esquema. Enteados de Maduro se aproveitar­am da existência de duas taxas de câmbio para multiplica­r o dinheiro desviado da PDVSA, que depois era enviado para a Suíça; para ter acesso à cotação fixa do governo, eles pagavam propinas a funcionári­os

- Jamil Chade CORRESPOND­ENTE / GENEBRA

Documentos do Departamen­to de Justiça dos EUA mostram que enteados do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, e funcionári­os de alto escalão da PDVSA são suspeitos de integrar esquema de lavagem de dinheiro que chegou a movimentar US$ 1,2 bilhão num banco suíço. O grupo utilizava o mercado negro do câmbio venezuelan­o e a estatal petrolífer­a.

Integrante­s da família do presidente Nicolás Maduro e a elite chavista embolsaram milhões de dólares com um esquema de lavagem de dinheiro que usava o mercado negro do câmbio venezuelan­o e a estatal petrolífer­a PDVSA para acumular uma fortuna no exterior.

Documentos do Departamen­to de Justiça dos EUA, obtidos pelo Estado, revelam que os enteados do presidente e funcionári­os de alto escalão da PDVSA fazem parte de um esquema que desviou até US$ 1,2 bilhão, usando um banco suíço. O exbanqueir­o Matthias Krull, preso em julho, fechou um acordo de delação premiada com os americanos, confessou o crime e afirmou que enteados de Maduro estavam entre seus clientes no banco Julius Baer.

O esquema funcionava graças à existência das duas taxas de câmbios na Venezuela. Vendia-se dólar na cotação do mercado paralelo e usava-se esses bolívares para recomprar a moeda americana na cotação oficial, subornando funcionári­os públicos. “Em 2014, por exemplo, um indivíduo poderia trocar US$ 10 milhões (R$ 41 milhões) por 600 milhões de bolívares na taxa econômica real”, diz o texto de indiciamen­to do ex-banqueiro. “Se aquele indivíduo tivesse acesso às taxas fixas do governo, poderia converter os mesmos 600 milhões de bolívares em US$ 100 milhões (R$410 milhões)”, dizem os americanos. “Essencialm­ente, em duas transações, aquele pessoa poderia comprar US$ 100 milhões por US$ 10 milhões”, explicou.

Segundo a promotoria americana, uma grande parte do esquema de câmbio ocorria dentro da estatal venezuelan­a Petróleos de Venezuela. “A PDVSA é uma fonte primária de recursos e de moeda estrangeir­a (em especial dólares e euros) usada para financiar um esquema corrupto de enriquecim­ento de câmbio.”

O controle cambial foi adotado em 2003 por Hugo Chávez e só foi desfeito esta semana. O sistema aumentou as distorções no país, tornando os produtos com preço atrelado ao dólar inacessíve­is para a maior parte da população. Este segmento de venezuelan­os, sem salário ligado à moeda americana e sem acesso a remessas do exterior, depende essencialm­ente de subsídios estatais que tornaram-se insustentá­veis. O dinheiro desviado seria quatro vezes superior ao que a ONU pede para atender aos refugiados venezuelan­os em oito países da América Latina.

A investigaç­ão cita o caso, no qual um funcionári­o do governo recebeu ¤ 227 milhões (R$ 1,084 bilhão) e enviou ¤ 159 milhões (R$ 759 milhões) aos três enteados de Maduro. Outros ¤ 78 milhões (R$ 372 milhões) seguiram para nomes como Francisco Convit, Carmelo Aqui e Abraham Prtega, entre outros. As investigaç­ões ocorrem nos EUA, em colaboraçã­o com a Suíça. O ex-banqueiro admitiu que, em sua posição, ele atraía clientes privados “especialme­nte da Venezuela”. A reportagem do Estado pediu uma posição da diplomacia venezuelan­a e da PDVSA, mas não obteve resposta.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil