As pressões por verbas
Duas semanas depois de o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) ter divulgado que poderá suspender os investimentos em pesquisa, caso não receba em 2019 os recursos orçamentários que pediu ao Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) anunciou que, se não obtiver as verbas que solicitou, ficará sem condições de promover o Censo Demográfico de 2020.
Segundo o IBGE, o custo da realização do Censo Demográfico, dentro de dois anos, será de R$ 3,4 bilhões. O valor pedido pelo órgão para os preparativos em 2019, que exigirão a contratação de 240 mil funcionários temporários, foi de R$ 344 milhões. Realizada a cada dez anos, a pesquisa é um levantamento estatístico fundamental para que o País tenha ideia de sua dimensão, em termos de população, educação e renda. As informações coletadas ajudam, por exemplo, a apontar prioridades em matéria de saneamento básico e a atualizar outras pesquisas que medem o desemprego e o nível de pobreza do País. Também são utilizadas para definir o repasse de recursos federais para Estados e municípios.
A proposta de Orçamento para 2019 tem de ser enviada ao Congresso até o dia 31 de agosto. O problema é que, como a arrecadação de impostos vem caindo por causa da recessão e o déficit primário para 2019 está estimado em R$ 139 bilhões, as autoridades orçamentárias foram obrigadas a fazer uma previsão de gastos para o próximo ano menor do que era esperado pelos Ministérios e pelas autarquias e fundações federais. Desde então, esses órgãos pressionam o Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão para tentar reduzir eventuais reduções em seus respectivos orçamentos.
Uma semana antes de o CNPq anunciar que poderá zerar os investimentos em pesquisa científica, o conselho da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) já havia distribuído uma nota técnica informando que, se o corte de verbas for confirmado, terá de interromper, a partir de agosto de 2019, o programa de residência pedagógica, o programa de formação de professores do ensino básico, os mestrados para qualificação de docentes da rede pública e o pagamento de 200 mil bolsas de pós-graduação. E, na mesma semana em que o IBGE protestou contra a redução de seu orçamento, dirigentes do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), vinculado ao Ministério da Educação (MEC), afirmaram que o não atendimento dos recursos orçamentários pedidos prejudicará o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2019, comprometendo o processo seletivo das universidades federais.
As pressões dos diferentes setores da máquina governamental sobre as autoridades orçamentárias e o risco de paralisia de algumas áreas estratégicas, decorrentes de quadro generalizado de falta de recursos, mostram que um dos desafios que o poder público até hoje não enfrentou é aprender a definir prioridades. Num cenário de crise fiscal, os governantes têm de decidir se querem gastar recursos escassos, por exemplo, em cultura ou em educação básica, em qualificação docente ou em esporte ou inovação tecnológica. Têm, igualmente, de zelar pela qualidade do gasto público. Foi por ter desprezado este requisito elementar que o governo da presidente Dilma Rousseff desfigurou o programa de crédito educativo, concedendo financiamento sem critério e sem exigir dos beneficiários qualquer garantia, o que levou a uma inadimplência de cerca de R$ 116 bilhões, entre 2010 e 2016 – valor que poderia financiar a realização de vários Censos Demográficos.
Acima de tudo, a crise fiscal e as pressões dos órgãos federais por recursos revelam o quanto o poder público ainda carece de experiência, competência e determinação política em matéria de definição de prioridades, eficiência e consciência de que o Estado pode ter, em diferentes momentos, diferentes funções, adequadas a diferentes objetivos.