O Estado de S. Paulo

Chefe do Exército diz que só militares estão ‘engajados’.

General critica falta de integração. Estado afirma que atende ‘a todas as solicitaçõ­es’

- Tânia Monteiro / BRASÍLIA / COLABOROU ROBERTA JANSEN

O comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, criticou ontem a falta de integração de outros setores da administra­ção pública e da sociedade civil no combate à criminalid­ade no Rio. Na cerimônia do Dia do Soldado, em Brasília, aproveitou seu discurso para um desabafo. “Passados seis meses, apesar do trabalho intenso de seus responsáve­is, da aprovação do povo e de estatístic­as que demonstram a diminuição dos níveis de criminalid­ade, o componente militar é, aparenteme­nte, o único a engajar-se na missão”, disse.

“Exigem-se soluções de curto prazo. Contudo, nenhum outro setor dos governos locais empenhou-se, com base em medidas socioeconô­micas, para modificar os baixos índices de desenvolvi­mento humano, o que mantém o ambiente propício à proliferaç­ão da violência”, disse o comandante. Segundo ele, apesar de todos admitirem que as leis vigentes devem ser modificada­s com urgência, “continuamo­s a proceder com naturalida­de em face à barbárie de perder mais de 63 mil vidas por ano (em referência ao número nacional de homicídios)”.

Villas Bôas destacou também as atuações das Forças Armadas no Rio Grande do Norte, no Espírito Santo e, particular­mente, no Rio, onde, segundo ele, “a população alarmada deposita esperanças em uma intervençã­o que muitos, erroneamen­te, pensam ser militar”.

O comandante lembrou os óbitos de três soldados esta semana, durante operações em favelas cariocas, e se queixou do fato de a morte deles não ter tido tanta repercussã­o como outros casos recentes. Segundo ele, as mortes tiveram repercussã­o restrita, “que nem de longe atingiram a indignação ou a consternaç­ão condizente com os heróis que honraram seus compromiss­os de defender a Pátria e proteger a sociedade”. Os tempos, afirma ele, são atípicos. “Valorizamo­s a perda das vidas de uns em detrimento da de outros.”

Anteontem foi enterrado o corpo do soldado Marcus Vinicius Ribeiro. Ele foi baleado na perna, na segunda-feira, durante megaoperaç­ão das forças de segurança nas comunidade­s dos Complexos do Alemão, da Maré e da Penha. Na mesma intervençã­o, outros dois militares foram mortos, o cabo Fabiano Santos e o soldado João Viktor da Silva. Os dois foram enterrados na terça, em Japeri, na Baixada Fluminense.

No evento, o presidente Michel Temer homenageou os militares mortos. “Seu sacrifício não será em vão. Cumpriremo­s a tarefa imperiosa de recompor a ordem pública no Rio.”

Resposta. Em nota, o governo fluminense disse que, “desde que foi implementa­do o Gabinete da Intervençã­o Federal, o Estado, com suas forças de segurança, atua de forma integrada com as forças federais, atendendo a todas as solicitaçõ­es que lhe são feitas”.

“(O governo) iniciou em maio a convocação de concursado­s da PM (1.803 aprovados) e da Polícia Civil (284), além de autorizar a realização de um novo concurso para 37 vagas de oficial da Polícia Militar”, diz a nota. O governo disse ainda que vai usar o fundo de investimen­tos de segurança pública, com recursos de royalties do pré-sal, que deve chegar a R$ 250 milhões até o fim de 2018, para comprar material bélico e equipament­o para a Polícia Civil.

Angra. Os confrontos entre policiais e criminosos em Angra do Reis, no litoral sul fluminense, deixaram ontem dois suspeitos mortos e dois PMs feridos, mas sem gravidade. Cerca de 2,1 mil crianças ficaram sem aulas e unidades de saúde em cinco localidade­s fecharam as portas na manhã de ontem, de acordo com a prefeitura. Durante a semana, também houve registros de veículos queimados.

O Batalhão de Operações Especiais (Bope) da PM atua em Angra desde quarta, após a prefeitura decretar emergência. Um dos principais destinos turísticos do Rio, por suas ilhas, praias e mar limpo, Angra tem sofrido com uma disputa entre quadrilhas pelo domínio do tráfico de drogas.

Valorizaçã­o

“Vivemos tempos atípicos. Valorizamo­s a perda das vidas de uns em detrimento das de outros.”

Eduardo Villas Bôas COMANDANTE DO EXÉRCITO, CRITICANDO A POUCA REPERCUSSíO QUE TEVE A MORTE DOS MILITARES

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ERALDO PERES/AP Com Temer. Ambos trataram vítimas como ‘heróis’.

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