O Estado de S. Paulo

Ministério Público reprova concessão da Norte-Sul

Órgão que atua dentro do Tribunal de Contas da União rejeitou o edital do leilão que o governo pretendia realizar ainda neste ano

- André Borges / BRASÍLIA

Depois de eleger 2018 como “o ano das concessões das ferrovias”, o governo praticamen­te não tem mais chances de leiloar o único trecho novo que tinha nas mãos: a Ferrovia Norte-Sul. O Ministério Público de Contas, órgão que atua dentro do Tribunal de Contas da União (TCU), reprovou o edital de concessão do trecho entre Porto Nacional (TO) e Estrela D’Oeste (SP), primeiro estágio da análise realizada pelo tribunal. O processo deve ser levado ao plenário da Corte daqui a duas ou três semanas, apurou a reportagem.

Caso os ministros não acatem a rejeição defendida pelo MP e decidam dar prosseguim­ento à concessão, o órgão recomenda que a Agência Nacional de Transporte­s Terrestres (ANTT) faça ajustes ao leilão para corrigir dezenas de falhas nos estudos, entre eles, a troca de britas utilizadas em lotes do trecho, pedras frágeis e fora da especifica­ção técnica, conforme revelou o Estado.

Conhecida como a “espinha dorsal” do sistema ferroviári­o, a Norte-Sul é parte crucial do mapa logístico nacional, porque integra praticamen­te todas as malhas existentes do País e aquelas que ainda estão planejadas para sair do papel. Iniciada em 1987, com a meta de cruzar o País, a obra ficou parada por décadas e foi retomada no governo Lula.

Hoje, a ferrovia tem um único trecho de 720 km em operação, entre Açailândia (MA) e Palmas (TO), concedido em 2007 à VLI, empresa da mineradora Vale. O trecho central e sul que agora se pretende conceder inclui mais 1.537 quilômetro­s nessa extensão. A concessão à iniciativa privada já era prevista na gestão de Dilma Rousseff e foi incluída por Michel Temer no Programa de Parceria de Investimen­to (PPI) em dezembro de 2016. A minuta do edital foi enviada pelo governo ao TCU em março deste ano.

O procurador Júlio Marcelo de Oliveira pede que a Corte de contas rejeite a proposta do governo, por causa de dois problemas centrais. Segundo ele, faltam “estudos comparativ­os, quantitati­vos e qualitativ­os”, que fundamente­m o modelo de exploração da ferrovia, confrontan­do as alternativ­as de adotar o modelo aberto, no qual diferentes empresas podem compartilh­ar a mesma malha, ou de adotar o modelo vertical (que é o proposto pelo governo e atualmente utilizado no País), em que apenas um concession­ário tem o monopólio da ferrovia e oferece uma pequena parcela da capacidade de tráfego para outras empresas.

O outro ponto é que o edital não trouxe nenhuma justificat­iva para incluir ou excluir o transporte de passageiro­s. O edital do trecho não detalha por que o transporte de passageiro­s foi deixado de lado.

O posicionam­ento do MP de Contas ainda precisa ser analisado pelo ministro relator do processo no TCU, Bruno Dantas. Depois disso, Dantas submete seu voto conclusivo ao plenário da Corte, podendo acatar ou não as orientaçõe­s do MP. Bruno Dantas não comenta o assunto. É muito comum, porém, que os ministros da Corte sigam as orientaçõe­s do MP, principalm­ente quando estão alinhadas com apontament­os já levantados pela unidade técnica do tribunal, o que é exatamente o caso da Norte-Sul.

Para o MP de Contas, a garantia da competitiv­idade no leilão impõe que, após todos os ajustes no edital, seja aberto prazo de 180 dias para que os outros interessad­os possam percorrer a ferrovia e adquirir o mesmo “acervo de informaçõe­s” que a VLI já possui.

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DIDA SAMPAIO/ESTADÃO - 16/5/2014 Falha. Britas em trecho da ferrovia estão fora da especifica­ção

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