Reajuste para servidores faz folha subir 14% além da inflação
Aumento salarial do funcionalismo entre 2017 e 2019 resultará em R$ 38 bilhões de gastos extras para União
A decisão do presidente Michel Temer de não barrar o reajuste dos servidores públicos no próximo ano fará com que a folha de pagamento do funcionalismo da União cresça 13,7% acima da inflação de 2017 a 2019. Com ajuda do Congresso, o funcionalismo obteve aumentos que resultam em R$ 38,1 bilhões a mais de gastos. O sucessor de Temer terá de arcar já em 2019 com um aumento real de 4,4% nas despesas com salários, aposentadorias e pensões. São R$ 6,9 bilhões a mais, recursos que teriam sido economizados caso Temer tivesse decidido bancar o adiamento nos reajustes, conforme propôs a equipe econômica. Sem o adiamento do reajuste dos servidores
de 2019 para 2020, o governo deve ter R$ 94 bilhões no ano que vem para investimentos e despesas não obrigatórias. O valor é considerado extremamente baixo.
Com a decisão do presidente Michel Temer de não barrar o reajuste dos servidores públicos no ano que vem, a folha de pagamento do funcionalismo da União vai crescer 13,7% acima da inflação de 2017 a 2019. Com forte pressão no Congresso, essas categorias conseguiram emplacar aumentos salariais que correspondem a R$ 38,1 bilhões a mais de despesas nas contas do governo federal.
O sucessor de Temer terá de arcar já no ano que vem com um aumento real de 4,4% nas despesas com o pagamento de salários, aposentadorias e pensões, segundo cálculos do economista-chefe da Tullet Prebon, Fernando Montero. São R$ 6,9 bilhões que teriam sido economizados, caso o presidente tivesse decidido bancar o adiamento nos reajustes como propôs a equipe econômica.
A remuneração dos servidores é bancada por tributos pagos por toda a população. Com os sucessivos aumentos salariais concedidos ao funcionalismo desde 2017, o custo salarial dos servidores para cada brasileiro aumenta em R$ 150, a partir de 2019, para R$ 1.501 ao ano.
Os funcionários públicos ganham acima da média dos trabalhadores do País e também têm obtido reajustes maiores. No ano passado, o aumento da folha foi de 6,5% acima da inflação. Já neste ano, a alta real é estimada em 2,3%. Enquanto isso, o rendimento médio dos brasileiros cresceu 2,4% acima da inflação no ano passado e aumentou 1,1% no segundo trimestre de 2018 ante igual período de 2017, segundo dados do IBGE. A taxa de desemprego no País chega a 12,4% da força de trabalho.
Com os reajustes, o governo terá de cortar outras despesas, como investimentos, para equilibrar o Orçamento, colocando em risco o funcionamento da máquina pública. O teto de gastos, criado em 2017 para vigorar por 20 anos, prevê que os gastos do governo não podem crescer em ritmo superior ao da inflação. Mas, nos primeiros três anos de sua vigência, as despesas com salários dos servidores federais invariavelmente furam este critério.
O presidente do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Sindifisco), Claudio Damasceno, diz não ver fundamento nesse tipo de análise. “O funcionário público não é o vilão pelo fato de o País não conseguir fazer investimentos. O que mais consome o dinheiro do Orçamento é pagamento de juros da dívida pública, não o sustento da máquina”, diz.
Segundo dados do Ministério do Planejamento, a folha salarial é a segunda maior despesa primária do governo, atrás apenas dos benefícios previdenciários. Na lei que estabelece as diretrizes para o Orçamento do ano que vem, a previsão é que a folha custe R$ 322 bilhões.
Impacto adicional. Os cálculos de Montero não consideram o reajuste de 16,38% aprovado pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) nos próprios salários. Temer admitiu ontem que negocia para conceder esse aumento em troca do fim do auxílio-moradia – um dos penduricalhos que levam muitos juízes a ganhar acima do teto do funcionalismo, hoje em R$ 33,7 mil mensais.
Como o reajuste dos ministros levará esse teto para R$ 39,2 mil mensais, servidores de outros poderes passarão a receber mais automaticamente. Só para a União, o custo adicional pode ser de R$ 1,4 bilhão em 2019, incluindo todos os Poderes.
Governo terá de cortar investimentos após reajuste
Sem o adiamento do reajuste dos servidores de 2019 para 2020, o governo deve ter um espaço de R$ 94 bilhões no ano que vem para fazer investimentos e bancar gastos como conta de luz e outras despesas não obrigatórias. O valor, considerado “extremamente baixo” pela equipe econômica, é R$ 30 bilhões inferior ao deste ano.
“O próximo presidente já vai começar o governo com a tarefa de fazer cortes no Orçamento”, afirmou a pesquisadora da área de Economia Aplicada do FGV IBRE, Vilma Pinto. “Em 2017, com mais recursos do que o previsto para 2019, até a emissão de passaportes chegou a ser paralisada por falta de verba.”
Para Vilma, o ideal para manter o funcionamento da máquina pública seria que essas despesas não obrigatórias tivessem orçamento entre R$ 115 bilhões e R$ 120 bilhões por ano. “É provável que os investimentos continuem insuficientes para cobrir apenas a manutenção do patrimônio público no próximo ano”, completou.
Caso a proposta de adiamento fosse levada adiante, a folga para as despesas não obrigatórias seria de R$ 101 bilhões. Mas Temer confirmou ao Estadão/Broadcast que desistiu de insistir na medida. A economia esperada com a postergação dos aumentos desses servidores seria de R$ 6,9 bilhões – maior do que o impacto total de R$ 1,4 bilhão para a União ao reajustar os salários dos ministros do STF e do Judiciário.
A medida era considerada essencial pela equipe econômica para reduzir despesas obrigatórias no Orçamento do ano que vem e abrir espaço dentro do teto (mecanismo que proíbe que os gastos cresçam em ritmo superior à inflação) para bancar gastos com custeio dos órgãos e ministérios, já estrangulados pela falta de recursos.
Teto de gastos
Orçamento mais apertado para 2019 pode elevar a pressão por mudanças no teto de gastos, mecanismo que proíbe que gastos cresçam acima da inflação Investimentos. A tesourada deve se concentrar principalmente nos investimentos, já que os gastos que garantem o funcionamento do governo estão muito próximos do limite mínimo. Segundo apurou a reportagem, os investimentos totais devem ficar na casa dos R$ 35 bilhões no ano que vem. No ano passado, esses gastos somaram R$ 45,7 bilhões. Já no primeiro semestre de 2018, foram R$ 21,2 bilhões em investimentos.
Uma fonte da área econômica avalia que a decisão de Temer implica entregar para o próximo presidente da República um Orçamento muito mais apertado e de difícil execução, o que pode elevar a pressão por mudanças no teto de gastos. Segundo essa fonte, o próprio governo que criou o limite de despesas está inviabilizando sua implementação.
O Banco Mundial divulgou nesta semana recomendações aos presidenciáveis que incluem a retirada dos investimentos do alcance do teto de gastos, justamente porque o avanço das despesas obrigatórias como salários e benefícios previdenciárias tem achatado qualquer gasto “produtivo”. A instituição lembrou que o investimento público tem potencial maior para alavancar o crescimento econômico. /