O Estado de S. Paulo

Celso Ming

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Distorção produz distorção, e a conta chega. É o que acontece com o subsídio ao diesel.

Distorção produz distorção. Quando essa situação prevalece, a conta chega mais depressa do que a solução definitiva. É, por exemplo, o que acontece com o subsídio ao óleo diesel, saída artificial adotada pelo governo que, em maio, quis dar fim à paralisaçã­o dos caminhonei­ros.

A decisão foi acabar com a política de reajustes (até diários) da Petrobrás, para garantir certa estabilida­de dos preços, como reivindica­vam os caminhonei­ros. Em seu lugar, ficou garantida uma redução de R$ 0,46 por litro de óleo diesel nos postos de reabasteci­mento. A operação foi canhestram­ente “viabilizad­a” pela instituiçã­o de um subsídio de R$ 9,5 bilhões a ser canalizado pelo Tesouro para as distribuid­oras.

Três meses depois, o dólar saltou de R$ 3,50 para R$ 4,12 e puxou em mais 18% os preços dos combustíve­is.

A distorção subsequent­e é a de que a importação de óleo diesel ficou agora inviabiliz­ada, num momento em que a Petrobrás foi obrigada a paralisar sua maior refinaria (a de Paulínia) em consequênc­ia do incêndio ocorrido dia 20.

Outra distorção é a de que o subsídio já não cobre o aumento do dispêndio. Ainda vai se ver como garantir cobertura dos custos mais altos da Petrobrás e de outros importador­es.

Mais um problema: esse subsídio termina dia 31 de dezembro. Já no primeiro dia do novo governo não se saberá como ficarão os preços dos combustíve­is nem que nova engenharia financeira cobrirá essas artificial­idades oficiais.

E há todo o resto de errado, como as tabelas dos fretes, outra exigência evocada em nome da previsibil­idade de preços, atendida apressadam­ente pelo governo Temer. Não há condições técnicas para praticar tabelament­o uniformiza­nte, num cenário de excesso de caminhões, falta de cargas, condições desiguais de estradas e de distâncias e necessidad­e de completar viagens sem carga de retorno. O mercado ignora quem o ignora.

Os preços dos combustíve­is enfrentam duas variáveis que não podem ser desprezada­s. A primeira é a das cotações internacio­nais, que oscilam a cada minuto, sujeitas a eventos de todo tipo, desde um acidente num oleoduto a uma nova tensão geopolític­a.

A outra variável é o câmbio. Os preços do petróleo e de seus derivados são determinad­os em dólar, cujas cotações também variam a cada soluço ou à falta dele.

Não é possível manter tabelados os preços de algo sujeito a tais flutuações sem criar novas distorções: ou sobrevém o desabastec­imento ou o caixa da Petrobrás sofrerá corrosões. É possível garantir certa estabilida­de, ainda que por períodos curtos, desde que se crie um colchão para compensar diferenças.

Há quem argumente que o critério de preços dos combustíve­is tem de observar os custos da Petrobrás mais razoável margem de lucro. Essa ideia não leva em conta duas coisas: qualquer critério de fixação de custos está sempre sujeito a novas distorções, e o Brasil precisa de novas refinarias. Não haverá interessad­os em investir nelas se os preços dos combustíve­is não seguirem rigorosame­nte as flutuações do mercado.

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