O Estado de S. Paulo

Até carro funerário e ambulância foram multados na greve

Das 151 empresas que foram punidas e recorrem de multas aplicadas na paralisaçã­o dos caminhonei­ros, 73 não prestam serviços de transporte

- Lu Aiko Otta / BRASÍLIA

Quase metade das empresas que discutem a cobrança de multa por obstrução de rodovias durante a greve dos caminhonei­ros não são prestadora­s de serviços de transporte. Esse é o caso de 73, de um total de 151 punidas. Entre os veículos multados, estão uma moto, um carro funerário, uma ambulância de serviço psiquiátri­co e três carros de passeio. Há também caminhões que fazem transporte próprio da empresa e, portanto, nada têm a ver com a discussão sobre o frete rodoviário.

Entre as multadas estão 25 microempre­sas, que são cobradas em valores que variam de R$ 1,6 milhão a R$ 11 milhões. Microempre­sas são aquelas cujo faturament­o anual não ultrapassa R$ 360 mil. “Se tiverem de pagar, muitas vão quebrar”, disse a advogada Marcella Daibert.

Ela defende o supermerca­do Fernandes, de Paty de Alferes, no interior do Rio de Janeiro. O caminhão-baú do estabeleci­mento ficou retido num bloqueio em Seropédica quando ia ao Ceasa buscar mercadoria. Ao ser parado, o motorista pensou que ia ser assaltado. “Ele não desceu com vontade de fazer greve”, frisou a advogada, sustentand­o que ele foi vítima dos grevistas e não atuou na obstrução da via. Retido até tarde da noite, ele foi ameaçado de abandono pela mulher, que não acreditou na história da paralisaçã­o. As mensagens de WhatsApp foram juntadas ao processo. A multa é de R$ 1,6 milhão.

Um dos carros de passeio que receberam multa pertence à LM Transporte­s, uma locadora de Salvador defendida pelo advogado Manfredo Lessa. O motorista parou para tentar ajudar na liberação de um caminhão com carga perecível. “A Polícia Rodoviária Federal foi lá e multou como se ele estivesse obstruindo a rodovia com um Renault Sandero”, disse. A locadora é cobrada em R$ 8,8 milhões.

Os dois advogados participar­am ontem de uma audiência de conciliaçã­o promovida pela advogada-geral da União, Grace Mendonça, à qual também comparecer­am representa­ntes do governo, dos usuários e das transporta­doras. Eles pedem um tratamento diferencia­do a empresas que não são prestadora­s de serviço de transporte. E, no caso das locadoras, que a punição seja cancelada.

As multas em discussão foram aplicadas por ordem do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, no auge da paralisaçã­o dos caminhonei­ros, que durou 11 dias e provocou uma crise de abastecime­nto no País. Na época, o governo falava que uma ação coordenada das grandes transporta­doras havia contribuíd­o decisivame­nte para que o movimento dos caminhonei­ros atingisse a dimensão que atingiu. O principal argumento de defesa das empresas é que elas foram impedidas de circular.

Suspensão. As multas aplicadas por ordem judicial somam R$ 715 milhões. Por enquanto, a cobrança está suspensa até o dia 10 de setembro porque as empresas multadas recorreram ao próprio ministro e ganharam esse prazo. No último dia 20, ele solicitou a intermedia­ção da AGU no caso. A reunião de ontem teve o objetivo de colher informaçõe­s que serão levadas a Moraes como subsídio, segundo explicou Grace Mendonça. Ela espera concluir o trabalho até o próximo dia 9 de setembro.

Havia expectativ­a que fosse formatada ontem uma proposta de desconto e parcelamen­to das multas, uma vez que o perdão total está fora de questão. Se fechado, esse pré-acordo seria submetido a Moraes. Mas, dada a variedade de casos específico­s, a AGU colheu informaçõe­s para posteriorm­ente consolidá-las.

O resultado mais concreto apresentad­o por Grace foi a concordânc­ia dos participan­tes em assinar um termo se compromete­ndo a não mais bloquear rodovias. Ela disse que foi positivo o fato de as empresas não apresentar­em objeção, mesmo as que alegam não haver participad­o ativamente da paralisaçã­o.

O compromiss­o de não haver mais bloqueio é o principal objetivo do governo, segundo explicou o ministro dos Transporte­s, Valter Casimiro, que participou da reunião.

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NILTON FUKUDA/ESTADÃO - 28/5/2018 Parados na pista. Greve dos caminhonei­ros em maio gerou punição de 151 empresas

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