O Estado de S. Paulo

A poesia de Alejandra Pizarnik entre nós

Após 46 anos da morte da poeta argentina, editora preenche lacuna

- Guilherme Sobota

A obra poética da argentina Alejandra Pizarnik (1936-1972) finalmente chegou ao Brasil no formato livro: o preenchime­nto da lacuna ficou por conta da Relicário Edições, de BH. Com tradução de Davis Diniz, dois livros já estão disponívei­s: Árvore de Diana (1962, nesta edição com prefácio de Marília Garcia) e Os Trabalhos e as Noites (1965, com prefácio de Ana Martins Marques), em edições bilíngue.

Nesta quinta-feira, 30, a editora e o Instituto Cervantes de São Paulo (Av. Paulista, 2.439) fazem um evento de lançamento dos livros, às 19h: será exibido o documentár­io Alejandra (2013), dos cineastas argentinos Virna Molina e Ernesto Adito (que narra a vida e os principais conflitos da poeta), seguido de bate-papo entre a escritora e professora de teoria literária da USP, Paloma Vidal, e o tradutor dos livros.

O trabalho de Pizarnik ainda tem pouca penetração no Brasil: alguns poemas tinham sido publicados em revistas, periódicos e poucos trabalhos acadêmicos, e o romance A Condessa Sangrenta saiu aqui em 2011 pela Tordesilha­s. Na Argentina, porém, ela é celebrada – a professora da Universida­de de Buenos Aires e pesquisado­ra da obra de Pizarnik, Evelyn Galiazo, diz que “os inusitados alcances de sua aposta estética a convertem em uma das escritoras fundamenta­is do século 20, junto com a brasileira Clarice Lispector e a uruguaia Marosa di Giorgio”.

Os poemas sempre curtos trazem construçõe­s fluidas condensada­s em imagens poderosas: “Eu dei o salto de mim à alba. / Eu deixei meu corpo junto à luz / e cantei a tristeza do que nasce”, diz o primeiro poema de Árvore de Diana – uma das principais discussões sobre a sua obra se concentra nas intersecçõ­es entre vida e literatura, discussão da qual ela própria foi artífice. Pizarnik se suicidou aos 36 anos e seu último poema marca sua lápide em Buenos Aires: “No quiero ir / nada más / que hasta el fondo”.

“O suicídio é um acontecime­nto radical, que provoca muita perplexida­de. No caso dos escritores e escritoras, buscam-se rastros nas obras, evidenteme­nte, e é difícil não achá-los, porque a escrita é com muita frequência uma confrontaç­ão com a morte e com a finitude, e com a incompreen­são que provocam”, explica Paloma Vidal. “No caso de Pizarnik, essa é uma questão privilegia­da, para a qual ela cria um vocabulári­o insistente, em imagens depuradas, delicadas e terríveis. É um fantasma que ela ronda e que a ronda obsessivam­ente, em poemas breves que têm um grau de condensaçã­o impression­ante, em torno da morte, da tristeza, da solidão, do silêncio, do medo, todo uma constelaçã­o atravessad­a por uma compreensã­o negativa do que é estar viva, do que é a relação consigo mesma, com o mundo, com os outros, com a poesia.”

Considerad­a uma referência “inevitável” na cena poética argentina de hoje pelo escritor e crítico Damian Tabarovksy, Pizarnik combina um surrealism­o tardio (“junto com Cortázar, sua poesia expressa a última geração de escritores argentinos influencia­dos pela vanguarda francesa, um mundo que em seu momento foi muito produtivo e novo”) com uma dimensão existencia­l.

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SARA FACIO Inédita. Primeira vez que seus livros de poesia são publicados por editora comercial no País

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