O Estado de S. Paulo

Filme põe mulheres sauditas em foco

Diretora Haifaa al-Mansour volta a Veneza com produção de viés feminista, bancada por grife de moda

- Sergio Amaral

Seis anos se passaram desde que a diretora saudita Haifaa alMansour foi revelada ao mundo no Festival de Cinema de Veneza com seu longa de estreia.

Sonho de Wadjda era, à época, o único filmado inteiramen­te em seu país, uma monarquia absolutist­a teocrática em que a Sharia é lei, e o primeiro dirigido por uma mulher. Neste domingo, 2, ela volta ao evento com o curta

The Wedding Singer’s Daughter (A Filha da Cantora do Casamento em tradução livre).

É o 16.º filme do projeto Women’s Tales, patrocinad­o pela grife Miu Miu, a irmã mais nova e rebelde da Prada, que desde 2011 vem convidando nomes como Agnés Varda, Lucrecia Martel e Miranda July para dirigir curtas de sua autoria com uma única condição: ter as personagen­s vestidas pela marca.

Em tempos de #MeToo e mulheres reivindica­ndo mais espaço e igualdade também no cinema (bandeira levantada por Frances McDormand, no Oscar), a escolha de Haifaa al-Mansour cai tão bem quanto uma roupa bem cortada. “Passamos por um longo período em que os filmes eram só sobre homens conquistan­do coisas. Ver mulheres fortes e heroínas nessas histórias é certamente empoderado­r”, afirma, em entrevista por telefone, de Los Angeles, onde vive há três anos.

Protagonis­tas destemidas, mulheres ou meninas, são uma das marcas do cinema de Haifaa. Era uma menina a heroína de seu longa de estreia e o fundamento se repete no novo curta, em que a filha da cantora do casamento defende a mãe da sabotagem de parte das convidadas do enlace. “As crianças têm um jeito de enxergar o mundo que não temos. Ela não é como sua mãe, de certa forma conformada, a filha é quem vem para questionar o status quo”, justifica.

The Wedding Singer’s Daughter ilumina questões caras à cultura saudita. A subversão de uma mulher cantar (ou ser cineasta), por exemplo, e o fato de cobrirem seus luxuosos looks (Miu Miu) com abaias assim que o noivo aponta no salão. “Na Arábia Saudita existe uma distinção muito grande entre

o que é público e o que é privado. Sempre achei fascinante quando ia aos casamentos e via essas cenas”, lembra, aos risos.

O curta é apenas uma das produções a que a diretora vem se dedicando. Ela acaba de lançar Mary Shelley, uma cinebiogra­fia da autora de Frankenste­in, e estreia Felicidade por um Fio na Netflix em 21 de setembro. Na paralela, trabalha na pré-produção de novo longa The Perfect Candidate, sobre médica que embarca numa jornada para se tornar política, filme que vai contar com financiame­nto de um fundo saudita. “As coisas estão mudando por lá. Este ano tivemos a abertura de cinemas e estão surgindo esse fundos. Há bastante encorajame­nto para a arte e isso é impression­ante. Ainda há muito a se fazer, mas estamos no caminho certo.”

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BRIGITTE LACOMBE Heroína. A protagonis­ta de ‘The Wedding Singer’s Daughter’

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