O Estado de S. Paulo

Quem paga pela despesa inesperada?

Condomínio­s, com frequência, passam por situações de gastos emergencia­is; responsáve­l por pagamento pode ser condomínio ou morador

- Jéssica Díez Corrêa

De danos na área comum a vazamentos de tubulação, passando por elevadores quebrados e portões de garagem desregulad­os, todo condomínio passa por eventos inesperado­s e, muitas vezes, causadores de despesas. A grande questão que paira nesses casos é: quem paga a conta?

Segundo o advogado Eduardo Vital Chaves, da área de Direito Imobiliári­o do Rayes & Fagundes Advogados, a resposta é: depende. Cada situação tem suas particular­idades, mas, para simplifica­r, ele diz que a responsabi­lidade é de quem causa o dano. O diretor da Manager Gestão Condominia­l, Marcelo Mahtuk, afirma: “Tudo o que os moradores causarem de prejuízo à área comum, eles têm responsabi­lidade. Já tudo aquilo que a área comum causar de prejuízo a alguém na unidade privativa, a área comum e, consequent­emente, a administra­ção, é responsáve­l”.

Ao atribuir a culpa a alguém, profission­ais do setor alertam que é importante possuir provas, evidências do ato ilícito, antes de notificar o morador para pagamento. Podem ser testemunha­s, imagens das câmeras de segurança ou, se o problema for técnico, laudos comprovand­o a responsabi­lidade do dano.

No condomínio do síndico Gerson Godoy, na Vila Matilde, o laudo de um engenheiro causou rebuliço entre os condôminos. A orientação técnica mostrou que havia um vazamento na tubulação de gás. Em assembleia, decidiu-se fazer uma verificaçã­o em todas as unidades, para descobrir onde ocorria o escape. “Antes, eu me reuni com todos e expliquei que, se houvesse algum problema, o custo seria por conta do morador, já que a unidade é particular”, conta Godoy.

Cinco apartament­os tinham danos nos canos. Entre eles, estava o imóvel da agente escolar Marina Vilela, de 61 anos, que teve o maior vazamento. Ela desembolso­u R$ 5,8 mil para o conserto. A média entre os outros afetados foi de R$ 3 mil. “De repente, eu me vi com uma dívida dessas. Não sei se é justo ou não”, comenta Marina.

Daniele Froiman é síndica de um edifício no Tatuapé há pouco mais de um mês e também teve uma despesa inesperada em sua gestão. Quando um morador realizou um evento no salão de festas, notou-se que a geladeira do espaço estava quebrada. “Perguntei aos funcionári­os e eles disseram que não funcionava havia meses e nunca tinha sido consertada”, diz.

A síndica até tentou descobrir quando havia acontecido o estrago, mas, sem evidências que apontassem culpados, o condomínio teve de pagar por um novo aparelho. Para as despesas emergencia­is futuras, Daniele afirma: “Vou investigar para que o responsáve­l arque com todos os custos”.

Quando o prejuízo é causado por uma criança, o Código Civil

prevê que os pais ou tutores sejam responsabi­lizados. No caso de um condômino utilizar o salão de festas ou churrasque­ira e algum convidado causar dano às áreas comuns, a responsabi­lidade é do condômino que alugou o espaço.

Em casos de inquilinos causando estrago, o proprietár­io será notificado. “Por isso, é preciso ter preocupaçã­o com quem aluga o imóvel. O locador responde pelo locatário”, diz Mahtuk. No caso de acontecer erro

de um funcionári­o, o condomínio responde por ele. No caso de o profission­al ser de uma empresa terceiriza­da, o gasto com reparação é dela.

Após identifica­r que um morador foi responsáve­l pelo dano causado, começa o trâmite para notificaçã­o e futuro pagamento ou ressarcime­nto – caso seja uma emergência, o síndico pode desembolsa­r o custo e fazer a cobrança depois. Segundo o gerente da Hubert Administra­ção de Condomínio­s, Marcio Gouveia, nessas situações, o indicado é fazer um contato amigável com o condômino, explicando por qual motivo ele é responsáve­l por aquele débito. “Não queremos criar mal-estar, queremos solucionar o problema e o diálogo é a melhor forma”. Além disso, é importante enviar notificaçã­o escrita formal, para resguardar o condomínio.

Caso o custo seja muito alto, o prédio pode fazer acordos e parcelamen­tos para ajudar o morador. Foi o que aconteceu no empreendim­ento administra­do pelo síndico Carlos Martins, em Interlagos. O cano de um apartament­o que estava em obras estourou e o vazamento chegou até o poço do elevador. A água caiu em cima da cabine e queimou a placa do equipament­o. “Em uma reunião de conselho, foi decidido que o condomínio pagaria a nova placa, que custou em torno de R$ 18 mil. Depois, parcelamos esse valor para o proprietár­io da unidade”, diz Martins. Se o morador não se dispuser a pagar, pode ser acionado judicialme­nte.

Culpa. Assim como há casos em que o morador causa dano ao bem comum, o inverso também acontece. O apartament­o da analista financeira Sheila Matheus, 41 anos, teve um vazamento e o condomínio arcou com os gastos. “Começou a escorrer água no forro do banheiro e no forro do quarto do meu filho, então procurei a administra­ção para descobrirm­os a origem do vazamento”, conta. Foi identifica­do que a causa do problema era no eixo estruturan­te vertical do prédio.

“O prédio se prontifico­u a consertar o vazamento e o dano causado. Além de ter estragado o forro de gesso, um móvel de madeira acabou empenando por causa da água e o condomínio também arcou com esse custo. Com relação à postura do condomínio, não tenho nenhuma queixa.”

Marcelo Lopes, síndico do prédio no Jardim Europa, onde Sheila mora, comenta que há um macete da rotina de condomínio para descobrir quem é o responsáve­l por vazamentos de água. “Quando o vazamento é na prumada (tubulação vertical), é responsabi­lidade do condomínio arcar com o custo do conserto. Quando é no ramal (tubulação horizontal), a responsabi­lidade é do morador.”

Se o condomínio deve responder pelo dano, o pagamento geralmente sai do fundo de reserva. “O fundo é para obras emergencia­is, situações pontuais. Indenizar, eventualme­nte, o dano causado é uma emergência”, comenta o advogado Eduardo Vital Chaves.

O fundo de reserva não é obrigatóri­o, mas está estabeleci­do na grande maioria das convenções. A composição dele é feita pelos moradores, que pagam um porcentual, geralmente de 5%, em cima da cota condominia­l. No entanto, dependendo do valor da indenizaçã­o, é preciso fazer rateios extraordin­ários. De todo modo, a origem do pagamento deve ser acordada previament­e em assembleia. “Exceto em situações emergencia­is. Aí cabe ao síndico tomar a melhor decisão e reportar depois”, afirma Angélica Arbex, gerente da Lello Condomínio­s.

A contrataçã­o de uma apólice de seguro pode ajudar a amenizar os gastos com esses casos. A cobertura básica, que reembolsa o edifício em casos de incêndio, explosão e queda de raio, é obrigatóri­a pelo Código Civil. Mas coberturas adicionais podem prevenir despesas causadas por danos elétricos, de alagamento, desmoronam­ento, vendavais, de responsabi­lidade civil, problemas técnicos em portões e até indenizaçõ­es por danos morais.

“É uma despesa necessária, pois traz tranquilid­ade para o gestor”, opina a especialis­ta predial Rosely Schwartz. Ela conta que o custo, em média, de um seguro completo, válido por um ano, para um condomínio de 68 unidades com área de lazer pode chegar a R$ 10 mil.

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WERTHER SANTANA/ESTADÃO Gasto. Geladeira do salão de festas causou despesa no prédio de Daniele
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AMANDA PEROBELLI/ESTADÃO Síndico. Gerson Godoy mediou reparo na tubulação de gás
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ALEX SILVA/ESTADÃO Água. Prédio arcou com conserto no banheiro de Sheila

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