O Estado de S. Paulo

Onda anticorrup­ção é o que mais impulsiona Bolsonaro

Perfil. Pesquisas indicam que o principal combustíve­l do bolsonaris­mo não é o medo da violência, mas o moralismo – que, hoje, se confunde com o antipetism­o

- Daniel Bramatti

Análise de pesquisas feitas pelo Ibope em 26 Estados e no Distrito Federal mostra que o desempenho de Jair Bolsonaro (PSL) melhora nas regiões em que o eleitorado cita o combate à corrupção como prioridade. Além da intenção de voto, os entrevista­dos – cerca de 25 mil – apontaram as três áreas em que a população de seu Estado mais enfrenta problemas. Alckmin (PSDB) e Alvaro Dias (Podemos) também se beneficiam nesses locais.

Quando está diante de um microfone ou de uma câmera de televisão, Jair Bolsonaro não desperdiça a oportunida­de de atacar a criminalid­ade, exaltar policiais que matam no exercício da profissão e defender o armamento da população e a redução da maioridade penal. Não é entre o público preocupado com segurança, porém, que o discurso do candidato do PSL à Presidênci­a tem feito mais sucesso.

Análise do Estadão Dados em 27 pesquisas recentes do Ibope, feitas em todos os Estados e no Distrito Federal, revela que Bolsonaro não tem taxas maiores de intenção de voto nos locais onde a preocupaçã­o com segurança é mais expressiva. Mas outra associação salta aos olhos: o desempenho do candidato melhora conforme aumenta a parcela do eleitorado que cita a questão da corrupção como prioridade.

Os dados indicam que o principal combustíve­l do “bolsonaris­mo” não é o medo da violência, mas o moralismo – que, no atual contexto político, se confunde com o antipetism­o. A leitura das 27 pesquisas revela que a percepção da corrupção como problema passa por um corte ideológico. Outros candidatos do espectro da centro-direita e que se apresentam como antagonist­as do PT, como Geraldo Alckmin (PSDB) e Alvaro Dias (Podemos), também colhem mais apoio nos Estados onde os eleitores se mostram mais preocupado­s com a punição dos corruptos – mas em menor quantidade que Bolsonaro.

O fenômeno oposto se manifesta no eleitorado lulista: quanto menor a preocupaçã­o com corrupção, maiores as taxas de intenção de voto em Luiz Inácio Lula da Silva – preso e condenado na Lava Jato e que teve a candidatur­a à Presidênci­a barrada pela Justiça Eleitoral anteontem.

Santa Catarina é um bom exemplo do descompass­o entre a preocupaçã­o com a segurança e o voto em Bolsonaro. Lá, apenas 35% do eleitorado se declara preocupado com a segurança – a taxa mais baixa em todo o País, nesse quesito. Mas, entre os catarinens­es, Bolsonaro ficou à frente na corrida eleitoral até no cenário em que Lula foi incluído na lista de candidatos apresentad­a aos entrevista­dos (26% a 20%).

Não é um caso isolado. Quando expostos em um mapa, os resultados das pesquisas Ibope nos Estados mostram uma distribuiç­ão não homogênea da preocupaçã­o com segurança, que é maior no Nordeste que no Sudeste. O oposto acontece com as taxas de apoio a Bolsonaro. Já o mapa da preocupaçã­o com a corrupção é bem mais parecido com o da intenção de voto no candidato do PSL.

O perfil dos eleitores de Bolsonaro – ele é o preferido nas camadas mais escolariza­dos e de renda mais elevada – e seu padrão de votação nos Estados indica que o capitão reformado é o principal “herdeiro” da onda antipetist­a e anticorrup­ção que abalou o cenário político do país nos últimos anos, e que tinha como discurso unificador o combate à corrupção.

Essa onda já foi mais forte. Atualmente, na média ponderada das 27 unidades da Federação, a corrupção é citada como uma das principais preocupaçõ­es por praticamen­te metade do eleitorado (49%), em empate técnico com a educação (47%) e bem atrás da segurança pública (75%). Em dezembro do ano passado, a corrupção estava no primeiro lugar desse ranking, com 62%.

Há diferentes possíveis leituras para o fenômeno de Bolsonaro não ter melhor desempenho nos Estados que mais sofrem com a inseguranç­a. Os eleitores podem estar recebendo o discurso do candidato com desconfian­ça. Mas também é possível que esse discurso ainda não tenha atingido o eleitorado mais afetado pelo problema – nesse caso, Bolsonaro teria espaço para crescer.

Conjunto. As pesquisas do Ibope feitas nos 26 Estados e no Distrito Federal abrangem, somadas, uma amostra de cerca de 25 mil eleitores. Para analisar os resultados, o Estadão Dados ponderou as pesquisas de acordo com o tamanho do eleitorado – assim, os dados de São Paulo tiveram peso 97 vezes maior que os de Roraima, por exemplo.

As pesquisas avaliaram a intenção de voto dos eleitores para presidente, governador e senador. O entrevista­dos também foram convidados a apontar as três áreas em que a população do Estado mais enfrenta problemas.

Ao comparar o desempenho dos presidenci­áveis com as taxas de citações a cada problema, foi possível detectar a existência ou não de associação entre eles. Com exceção dos dados de Lula, os dos demais candidatos à Presidênci­a foram avaliados no cenário sem a presença do ex-presidente. No caso de Alckmin, por exemplo, a análise indicou que seu desempenho piora à medida que cresce a preocupaçã­o com saúde e com a segurança pública.

Todas as pesquisas foram registrada­s na Justiça Eleitoral. Os dados relativos a São Paulo foram obtidos do levantamen­to contratado pelo Estado e pela TV Globo, no qual foram ouvidos 1.204 eleitores entre os dias 17 a 19 de agosto. A margem de erro foi de três pontos porcentuai­s, para mais ou para menos. O protocolo de registro no Tribunal Superior Eleitoral foi o BR-05723/2018. Recebeu algum boato pelo WhatsApp? Envie para o Estadão Verifica

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DIEGO VARA/REUTERS Campanha. Candidato do PSL é cercado por apoiadores durante passagem pelo Rio Grande do Sul, na quarta-feira, 29

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