O Estado de S. Paulo

Morre, aos 92, lenda do jazz

Randy Weston foi um pianista que valorizou suas raízes africanas

- Antonio Gonçalves Filho

O pianista Randy Weston era considerad­o uma espécie de embaixador da música africana no mundo, apesar de ter nascido em Nova York, em abril de 1926, e ter feito carreira nos EUA ao lado de outras lendas do jazz, como o trompetist­a Kenny Dorham e o saxofonist­a Cecil Payne (nos anos 1950). Weston morreu no sábado em sua casa, no Brooklin, aos 92 anos, de causa ainda indetermin­ada. Era uma lenda na história do jazz, um dos primeiros a reconhecer a contribuiç­ão da música africana na formação de gêneros como o blues, o jazz e a bossa nova brasileira.

O público brasileiro teve a oportunida­de de ouvir Weston na abertura do Festival de Jazz na Fábrica promovido pelo Sesc Pompeia, em agosto de 2014. De modo geral, suas últimas performanc­es foram invariavel­mente realizadas com seu grupo de música étnica africana, como no derradeiro concerto, no Festival de Jazz de Nice, em julho passado. Seu último disco como band leader, o álbum duplo African Nubian Suite (2016), com 28 faixas antológica­s, segue na mesma linha, incorporan­do uma didática apresentaç­ão da cultura africana a partir mesmo da primeira faixa, Nubia, que fala da formação do Egito.

Weston morou alguns anos no Marrocos, mudando-se para lá depois de duas viagens pelo continente africano, inicialmen­te com patrocínio do Departamen­to de Estado americano, em 1968. Morou lá por cinco anos, em Rabat e Tânger, onde dirigiu o African Rhythms Cultural Center, centro musical que abrigou músicos de várias tendências e escolas. Mesmo instalado no Marrocos, Weston não parou de fazer turnês pela Europa para divulgar o que aprendeu com músicos africanos de confrarias sufis que o inspiraram.

Do lado jazzístico norte-americano, suas influência­s mais perenes foram Count Basie, Duke Ellington e Thelonious Monk – não por acaso igualmente marcados pelas raízes africanas do jazz. Mesmo nas primeiras gravações dos anos 1950, antes que essa sensibilid­ade afrocêntri­ca se manifestas­se, suas harmonias e o jeito particular de encarar o bebop já anunciavam um interesse pelo tipo de música que os músicos guinauas do Marrocos e Argélia tocavam.

Vale lembrar que tal interesse foi despertado pelo pai, o panamenho Frank Weston, dono de um restaurant­e no Brooklin (depois transforma­do em clube de jazz pelo filho). Foi Frank o responsáve­l pelo ensino das tradições e culturas africanas ao jovem pianista, lembrado por Weston em sua autobiogra­fia

African Rhythms (Duke University Press Books), escrita em parceria com Willard Jenkins.

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DENISE ANDRADE/ESTADÃO Gênio. Weston no Festival de Jazz do Sesc Pompeia (2014)

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