‘NOSSA MEMÓRIA ESTÁ VIRANDO CINZAS’
Dom João de Orleans e Bragança está se dispondo a ceder parte de seu acervo para o governo federal na tentativa de ajudar na reconstrução da história do Brasil, conforme publicou ontem o blog na coluna. Até a mesa onde foi assinada a Lei Áurea está na casa onde mora, em Paraty. Há também fotografias da coleção de D. Pedro II, gravuras e telas . “Isso será decidido com a direção do Ibram e do Museu Nacional”, contou ontem à coluna. Arrasado com o incêndio no museu, no domingo, explicou: “Sigo o dever histórico da família imperial de estar presente e servir ao Brasil sempre.” Os moldes do “empréstimo” seriam os mesmos usados ao montar o Museu Imperial de Petrópolis, a Pinacoteca de São Paulo e ao Instituto Moreira Salles.
O sucessor mais popular da família – conhecido como “Joãozinho príncipe” – acredita que o episódio foi “mais um resultado do saque que nossos dirigentes fazem ao Brasil”, ressaltando que não havia água nos hidrantes, não havia “recursos de defesa contra fogo” aprovados pelo Corpo de Bombeiros e só uma escada Magirus servia, solitária, para combater as chamas. Ele esteve ontem no local para verificar o estrago. Para o também fotógrafo, que mora boa parte do ano em Paraty – onde mantém uma imobiliária e a Pousada do Príncipe –, o desastre é o retrato da decadência humana e política a que chegou o Brasil. “A memória, a identidade, a nossa história, tudo reduzido a cinzas.” Este, desabafa, “é o quadro do País”
onde não existe “nenhum interesse cívico, da nação, com o futuro. Só a rapinagem de esquerda e de direita, sem limites. São todos culpados”.
Diferentemente de outros membros na família, ele não acha que os sucessores da família imperial deveriam entrar na política. Entretanto, tem certeza de que os governantes brasileiros não têm mais condição de dar nada ao País. “Ou se reforma a máquina do Estado e do governo ou tudo vai continuar igual, com os centrões e os ‘golpistas’ aliados aos ‘golpeados’. Para mim, a maior parte dos líderes da esquerda e direita perderam a moral, a ética e o respeito. Não deveriam se candidatar.”
A criação de museus e instituições de cultura faz parte da valorização da identidade de uma Nação – e, segundo Joãozinho, D. João VI sabia que o Brasil seria em breve independente
–e assim precisaria se conhecer e se valorizar como povo. “Quatro anos antes da independência, D. Pedro I adquiriu para o museu uma coleção de múmias numa época em que não havia grande interesse pela história egípcia.” E a imperatriz Tereza Cristina, trisavó de dom Joãozinho, trocou com seu irmão, rei das Duas Sicílias, vasos etruscos por peças e ornamentos indígenas brasileiras então de grande interesse na Europa. Quanto às promessas de reconstrução, ele diz que “estão mentindo. O acervo de 20 milhões de peças catalogadas se perdeu para sempre. Como também se perderam 200 anos de trabalho de quem se dedicou à construção e à pesquisa no Museu Nacional, funcionários e educadores”.