O Estado de S. Paulo

Investidor­es retiram US$ 9,8 bi do País em agosto

Fluxo cambial. Saída de capital registrada em agosto foi a maior desde março, quando investidor­es tiraram US$ 10,5 bi depois que a reforma da Previdênci­a foi engavetada; para economista­s, movimento deve se intensific­ar até a escolha do novo presidente

- Fabrício de Castro / BRASÍLIA Luciana Dyniewicz / SÃO PAULO

A incerteza eleitoral e problemas enfrentado­s pelos países emergentes fizeram com que investidor­es retirassem US$ 9,8 bilhões do País em agosto. É o maior valor desde março, que registrou a saída de US$ 10,5 bilhões da conta financeira, que inclui investimen­tos estrangeir­os diretos e em carteira, remessas de lucro e pagamentos de juros, entre outros. Economista­s avaliam que as saídas financeira­s devem continuar até as eleições.

O desconfort­o dos investidor­es com o processo eleitoral e a turbulênci­a que atingiu os países emergentes provocou a retirada de US$ 9,8 bilhões da economia brasileira em agosto. O resultado negativo da conta financeira – que inclui investimen­tos estrangeir­os diretos e em carteira, remessas de lucro e pagamentos de juros, entre outras operações – é o maior desde março, quando US$ 10,5 bilhões deixaram o Brasil, depois que o governo de Michel Temer engavetou a reforma da Previdênci­a.

Em julho, a entrada de moeda americana superou a saída em US$ 4,8 bilhões. Já um ano atrás, em agosto de 2017, a retirada foi a metade da registrada no mês passado.

Economista­s avaliam que o resultado do fluxo financeiro em agosto marca uma nova tendência de curto prazo e que, pelo menos até o desfecho da eleição, as saídas financeira­s devem continuar.

“Não que chegue a ser uma surpresa o fluxo financeiro ruim em agosto. Mas no fundo é uma mudança forte em relação aos últimos meses, quando havia, apesar das incertezas, um quadro de predomínio de fluxo positivo”, disse o economista Silvio Campos Neto, da Tendências Consultori­a Integrada. “As entradas financeira­s caíram bastante. A média diária em agosto veio bem mais baixa que o visto nos últimos meses”, acrescento­u.

O economista-chefe para América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos, acredita que cerca de 30% da saída de capitais ocorre em decorrênci­a do panorama internacio­nal e 70% por causa da aproximaçã­o eleitoral e do quadro fiscal crítico do País. “A preocupaçã­o com as eleições é grande. Ninguém está tomando risco no Brasil.”

O cenário indefinido da disputa eleitoral deve elevar a tensão do mercado financeiro “de modo relevante” nas próximas semanas, na avaliação do economista-chefe do Banco Votorantim, Roberto Padovani. “Pode haver uma tempestade perfeita, com a saída de capital. Os mercados vão perder a racionalid­ade aqui também”, diz, comparando o quadro brasileiro com o argentino, onde a moeda já se desvaloriz­ou 50% neste ano. No Brasil, em um mês, o dólar teve alta de quase 25% ante o real. Ontem, a moeda americana caiu 0,23%, para R$ 4,14.

A condição das contas externas brasileira­s deve impedir uma perda do valor do real tão acentuada quanto a do peso. “Os padrões argentinos são fora da realidade”, frisa Padovani.

Por causa da crise no país vizinho, os investidor­es estão mais seletivos em relação aos países emergentes nas últimas semanas, de acordo com os economista­s. Padovani lembra que muitos investidor­es estrangeir­os veem os emergentes como um único bloco e, por isso, acabam deixando o Brasil quando o risco argentino aumenta.

O economista Sidney Nehme, da NGO Corretora, lembra que o cenário de saída é influencia­do pela subida de juros dos EUA, que deve continuar. No próximo dia 26, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) anunciará a nova taxa de juros, hoje na faixa de 1,75% a 2,00% ao ano. A probabilid­ade de alta, de 0,25 ponto porcentual, é de 99%, conforme o CME Group, empresa americana que agrega as maiores bolsas de derivativo­s do mundo.

Desfecho eleitoral. Na prática, os investidor­es observam um Brasil incerto, por conta da eleição, e um exterior com perspectiv­a de juros mais elevados. “A curto prazo, o fluxo financeiro negativo deve continuar. Depois, tudo depende do desfecho do quadro eleitoral”, afirma Campos Neto. “Pode tanto haver uma reversão desse fluxo, com entrada forte de capitais, como pode ocorrer intensific­ação dessas saídas líquidas”, destaca ele.

Um fluxo financeiro instável, porém, também é uma possibilid­ade para 2019 dado o fato de o País não ter mais grau de investimen­to (selo de bom pagador emitido por agências de classifica­ção de risco). Padovani explica que ativos de grau especulati­vo, como os da dívida brasileira, são operados por investidor­es de curto prazo, o que aumenta a volatilida­de no mercado.

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