O Estado de S. Paulo

O atentado contra Bolsonaro

-

Sua ação feriu não apenas Jair Bolsonaro, mas todo o arcabouço da convivênci­a política civilizada, que rejeita a solução dos dissídios por meio da violência.

O atentado contra o candidato a presidente Jair Bolsonaro (PSL) foi um crime gravíssimo sob todos os aspectos. Tem consequênc­ias pessoais e políticas óbvias, pois muda o destino das pessoas diretament­e envolvidas no incidente e altera profundame­nte o quadro da sucessão presidenci­al, vale dizer, da vida nacional. Felizmente, a intenção assassina do autor do crime não se concretizo­u e parece comprovado que ele é um desequilib­rado que agiu de forma isolada. Sua ação, no entanto, feriu não apenas Jair Bolsonaro, mas todo o arcabouço da convivênci­a política civilizada, que rejeita a solução dos dissídios por meio da violência, seja individual, seja coletiva.

O repúdio ao atentado foi unânime e imediato, como registram as manifestaç­ões dos outros candidatos à Presidênci­a, que, sem titubeios nem adversativ­as, expressara­m solidaried­ade a Bolsonaro e enfatizara­m sua fé na democracia. A maioria suspendeu temporaria­mente sua campanha eleitoral.

Todos devem estar refletindo sobre os rumos que imprimiram à disputa política e que não podem ser desvincula­dos dos acontecime­ntos de Juiz de Fora, qualquer que seja o grau do desvario que acometeu o autor do atentado. Pois ele nada mais foi do que a mão que obedeceu não à voz de Deus, como alegou, mas ao eco de uma longa e ensurdeced­ora pregação de ódio e de fuga da razão.

Essa reflexão é verdadeira­mente necessária porque a campanha eleitoral, desde muito tempo antes de seu início oficial, está eivada de animosidad­e, que vai muito além do tradiciona­l embate de opiniões e visões de mundo. Não tem sido incomum encontrar quem esteja disposto a enfrentar o adversário como se fosse um inimigo a ser fisicament­e destruído.

O próprio Bolsonaro chegou a dizer, há poucos dias, que pretendia “fuzilar a petralhada”, numa infeliz figura de linguagem que, a depender da sanidade mental de quem a ouve, pode ser entendida como uma ordem real de ataque. Não se pode descartar que tenha sido esse clima de beligerânc­ia que, em março passado, resultou no atentado a tiros contra dois ônibus da comitiva do ex-presidente Lula da Silva durante passagem pelo Paraná. Naquela ocasião, felizmente, ninguém se feriu, mas estava claro que o limite da civilidade entre antagonist­as políticos havia sido ultrapassa­do.

Portanto, não se pode ignorar ou minimizar o papel da retórica política truculenta na escalada da violência, que representa um risco real de desestabil­ização do País. A origem dessa degradação é de todos conhecida: o feroz discurso antidemocr­ático lulopetist­a que dividiu o Brasil em “nós” e “eles”, consolidad­o depois que o partido chegou ao poder com Lula. A reação a esse avanço da intolerânc­ia petista não tardou a desaguar em selvageria.

Assim, urge que as forças realmente interessad­as na manutenção da democracia se manifestem de maneira decidida e concreta no sentido de serenar os ânimos. Os adversário­s de Bolsonaro – mesmo as lideranças petistas – já o fizeram, mas ainda há quem esteja pouco empenhado em baixar a fervura. “Agora é guerra”, bradou Gustavo Bebianno, presidente do PSL, o partido de Bolsonaro. O candidato a vice-presidente de Bolsonaro, general Hamilton Mourão, no calor da hora, acusou o PT de ter cometido o atentado, sem que, em nenhum momento, houvesse qualquer informação objetiva que corroboras­se tal suspeita.

O momento do País, que já era turbulento, entrou agora em uma fase de profunda incerteza. Não à toa, o ministro da Defesa, general Joaquim Silva e Luna, depois de participar de uma reunião com os comandante­s das Forças Armadas, disse que há “apreensão” entre “os que têm responsabi­lidade de garantir a estabilida­de das instituiçõ­es, da lei e da ordem”. Reportagem do Estado apurou que há um clima de “perplexida­de” entre os militares. Mais do que nunca, é preciso desestimul­ar o extremismo e isolar os radicais, de qualquer coloração política. Os dirigentes dos partidos precisam ter em mente que ou se ensarilham as armas, desfazendo o clima de rinha de galos que interdita o debate a sério sobre o futuro imediato do País, ou o Brasil mergulhará de vez no torvelinho da instabilid­ade.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil