O Estado de S. Paulo

Por que agora?

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A pouco mais de um mês do primeiro turno, o Ministério Público ofereceu denúncias contra Alckmin e Haddad.

OMinistéri­o Público de São Paulo (MP-SP) ofereceu denúncias esta semana contra Geraldo Alckmin e Fernando Haddad, respectiva­mente, candidato à Presidênci­a da República pelo PSDB e à vice pelo PT, entre outros acusados. Caso elas sejam aceitas, caberá à Justiça dar a palavra final sobre o teor das acusações, condenando ou absolvendo os réus ao fim do devido processo legal. Está-se muito longe deste desfecho, mas é no mínimo curioso o momento que o parquet escolheu para oferecer as denúncias, a pouco mais de um mês do primeiro turno das eleições.

O promotor Ricardo Manuel Castro, da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social, acusa Geraldo Alckmin de improbidad­e administra­tiva por, supostamen­te, ter recebido R$ 7,8 milhões da Odebrecht, por meio de caixa dois, para financiar sua campanha à reeleição ao governo de São Paulo, em 2014. Já Fernando Haddad é acusado pelo promotor Marcelo Mendroni, do Grupo de Atuação Especial de Repressão à Formação de Cartel e à Lavagem de Dinheiro e de Recuperaçã­o de Ativos do MP-SP, pelos supostos crimes de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. De acordo com a denúncia, o petista teria pagado uma dívida de R$ 2,6 milhões de sua campanha à prefeitura de São Paulo, em 2012, com recursos doados pela UTC, por meio de caixa dois.

Tanto a denúncia contra Alckmin como as denúncias contra Haddad – além da criminal, o petista foi denunciado nas esferas cível e eleitoral – têm como base os acordos de colaboraçã­o premiada firmados no âmbito da Operação Lava Jato por executivos das empreiteir­as Odebrecht, no caso do tucano, e UTC, no caso do petista. Todas as peças acusatória­s devem ser analisadas com bastante critério pelo Poder Judiciário, pois não tem sido incomum o oferecimen­to de denúncias à Justiça com base tão somente em depoimento­s prestados por réus colaborado­res dispostos a obter benefícios penais em troca do oferecimen­to de meios para a obtenção de provas contra outros acusados.

Para enorme prejuízo da reputação de quem é acusado e do interesse público em um efetivo combate à corrupção, a ordem das coisas – ordem determinad­a pela lei – tem sido flagrantem­ente desrespeit­ada por alguns membros do Ministério Público, em todas as suas esferas de atuação: primeiro se denuncia a partir do que foi dito por um colaborado­r; depois se buscam as provas que ensejaram as denúncias.

Não se quer dizer com isso que, a priori, as denúncias oferecidas contra Geraldo Alckmin e Fernando Haddad sejam ineptas. É o Poder Judiciário que haverá de dizê-lo. Mas por que somente agora, no curso do processo eleitoral, o MP-SP decidiu oferecê-las? E, no caso da denúncia contra Alckmin, com certo rebuliço. Como se noticiou, o promotor do caso teria convocado “o maior número possível” de seus pares, por meio do WhatsApp, para a “cerimônia” de anúncio da ação contra o candidato do PSDB. O objetivo, de acordo com o que o promotor escreveu em sua mensagem, seria dar uma “demonstraç­ão de união” da corporação.

Os acordos de colaboraçã­o premiada envolvendo os executivos da Odebrecht e da UTC foram assinados há tempo suficiente para, nos casos em que levaram à produção de provas robustas, já terem sido oferecidas as denúncias à Justiça. Se tais foram as provas obtidas contra Geraldo Alckmin e Fernando Haddad, cabe indagar por que as acusações vieram apenas agora? A resposta deve ser dada pelo MP-SP.

O combate à corrupção, não é de hoje, tornou-se a missão precípua de alguns setores do Ministério Público Federal e Estadual. Em alguns casos, os depoimento­s dos delatores foram tomados como verdadeiro­s não pelo cabedal de provas que deles advieram, mas pela “patente” do acusado no meio político. Quanto mais alta, melhor para alimentar os desígnios quase messiânico­s de procurador­es e promotores de Justiça. Não são poucas as ameaças ao bom desfecho do pleito deste ano. Do Judiciário e do Ministério Público se espera o estrito cumpriment­o da lei e uma boa dose de temperança.

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