O Estado de S. Paulo

A calmaria da inflação

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Manutenção da taxa de juro dependerá em boa parte da evolução do cenário político e, em pouco tempo, do resultado da eleição presidenci­al.

A maior e melhor surpresa de agosto foi trazida pelos números da inflação, muito bem comportado­s apesar da forte alta do dólar, várias vezes negociado acima de R$ 4,00. Houve deflação de 0,09% registrada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), referência mais importante para a política de juros e para várias outras ações oficiais. Foi a menor taxa para o mês desde 1998, quando os preços caíram em média 0,51%. Deflação é um fenômeno raro em agosto e muito bem-vindo numa fase de inseguranç­a externa e, mais importante, de ampla incerteza eleitoral no Brasil. Mas quem quiser celebrar deve continuar atento. As pressões cambiais ainda poderão ter efeitos inflacioná­rios nos próximos meses, especialme­nte se o quadro político se tornar mais inquietant­e e justificar mais temores quanto ao futuro da economia. Nesse caso, o Banco Central (BC) poderá antecipar a elevação da taxa básica de juros, ancorada há alguns meses em 6,50%.

Pelas projeções do mercado, o próximo ano será encerrado com juros básicos de 8%. A expectativ­a é de elevação gradual do custo do crédito, compatível com uma alta muito lenta da inflação. Se as pressões inflacioná­rias forem mais fortes do que se tem previsto, o custo do dinheiro poderá subir mais velozmente, dificultan­do a recuperaçã­o da economia e encarecend­o a dívida pública. Um presidente voluntario­so poderá, naturalmen­te, conter a alta dos juros. Isso provocará estragos muito maiores um pouco mais à frente.

A incerteza quanto à eleição e quanto à seriedade do próximo governo é hoje o principal fator de turbulênci­a cambial. A alta de juros nos Estados Unidos e as tensões comerciais entre grandes potências têm causado instabilid­ade no mercado de câmbio e devem continuar produzindo esse efeito por algum tempo. Mas algumas moedas, incluído o real, têm sido afetadas bem mais intensamen­te que as outras.

Brasil, assim como Argentina, África do Sul e Turquia, é avaliado como um país com problemas especiais de política econômica, derivados em grande parte das condições políticas internas. Em um mês, até a última quinta-feira, o credit default swap (CDS) de títulos brasileiro­s subiu 37,53% no mercado internacio­nal. O CDS é uma espécie de seguro contra calote praticado por emissores de papéis de renda fixa.

Por enquanto, a acomodação dos preços ao consumidor permite respirar com um pouco mais de tranquilid­ade – provisória, é claro. Com a deflação de 0,09% em agosto, a inflação acumulada no ano ficou em 2,85%. O resultado em 12 meses passou de 4,48% em julho para 4,19% no mês seguinte. As apostas em um resultado em torno de 4,20% em 2018 parecem ainda razoáveis. Se esta avaliação estiver correta, a diretoria do BC poderá entregar ao presidente eleito juros ainda no patamar de 6,50%.

O Índice de Preços ao Consumidor (IPC) medido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) também trouxe boas notícias. Aumentou somente 0,07% em agosto, depois de ter avançado 0,17% em julho. Mas o IPC é só um dos três componente­s do Índice Geral de Preços – Disponibil­idade Interna (IGP-DI) elaborado pela FGV. O quadro completo é menos favorável.

O Índice de Preços por Atacado (IPA), com peso de 60% no resultado geral, avançou 0,99%. A variação havia ficado em 0,52% em julho. O terceiro componente, o custo da construção, com peso de 10%, cresceu 0,15%. No mês anterior havia aumentado 0,61%.

A alta dos preços por atacado é em parte explicável pelo aumento do dólar em relação ao real. Essa alta parece ter tido pouco ou nenhum efeito sobre os preços encontrado­s no varejo pelo consumidor final. Sem repasse, o BC pode continuar administra­ndo sem pressa a política monetária e mantendo a taxa básica em 6,50%. Como o consumo continua moderado, por causa do alto desemprego e da cautela das famílias, o repasse pode ocorrer lentamente ou nem ocorrer.

Mas isso dependerá em boa parte da evolução do cenário político e, em pouco tempo, do resultado da eleição presidenci­al. Quanto aos políticos, parecem bem pouco preocupado­s com riscos econômicos.

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