O Estado de S. Paulo

Museu Nacional: o seguro impediria a tragédia?

- ANTONIO PENTEADO MENDONÇA É SÓCIO DE PENTEADO MENDONÇA E CHAR ADVOCACIA E SECRETÁRIO GERAL DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Funcionári­os, pesquisado­res e pessoas que frequentav­am o local sabiam do risco de um incêndio destruir um dos mais ricos acervos do mundo

Orecente incêndio no Palácio Imperial Brasileiro, que destruiu o acervo do Museu Nacional, é o que se chama uma tragédia anunciada. Funcionári­os, pesquisado­res e outras pessoas que frequentav­am o local sabiam do risco de um incêndio destruir um dos mais ricos acervos do mundo.

Salas fechadas sem condições de uso, infiltraçõ­es, falta de manutenção, gambiarras de todos os tipos, criando extensões elétricas desencapad­as se espalhando pelo velho prédio, com parte da estrutura em madeira, eram um convite a um incêndio que, iniciado, teria grandes proporções.

O prédio era altamente combustíve­l e seu conteúdo não ficava atrás. Somando-se a isso a falta de manutenção e o absoluto descaso com as medidas e os equipament­os de combate a incêndio, o resultado tinha de ser o que se viu. Era só uma questão de tempo para o fogo destruir rapidament­e um acervo com 20 milhões de itens, comparável ao Louvre ou ao Instituto Smithsonia­n, em Washington.

A pergunta que eu tenho que responder é se uma apólice de seguros teria evitado a tragédia. Para isso, tenho de aumentar um pouco a resposta e começar dizendo que raramente um museu de grande porte, em qualquer lugar do mundo, tem seguro para o seu conteúdo. O prêmio do seguro de vários bilhões de dólares em objetos raros, ou mesmo únicos, é impossível de ser pago, além do que por ser tão caro, seu custo anual multiplica­do por cinco anos permitiria ao museu comprar sistematic­amente, uma grande peça para aumentar seu acervo.

Faz alguns anos, um grande incêndio atingiu um dos palácios reais britânicos. Muita gente se espantou com o fato de não haver seguro. A razão para isso é a que acabei de expor.

O que se costuma fazer quando uma peça do acervo deixa o museu de origem, emprestada para um evento em outro local, é exigir que o responsáve­l pela retirada apresentar um seguro “all risks”, com garantias e valor segurado suficiente para indenizar a eventual perda total da obra de arte emprestada.

De outro lado, o seguro do edifício do Museu Nacional seria algo factível e até lógico, na medida que se trata de uma construção com alto valor histórico, que pelas técnicas e materiais utilizados na obra tem alto risco de incêndio e um valor para reconstruç­ão bastante elevado.

Nas condições em que o prédio se encontrava, dificilmen­te uma seguradora aceitaria o risco. Para isso, seria necessária a realização de uma ampla reforma que evidenteme­nte diminuiria os riscos de incêndio, especialme­nte se causado por curto-circuito.

A seguradora, em princípio, exigiria além dos laudos e autorizaçõ­es legais, uma vistoria feita por agente seu, que verificari­a as condições do prédio e dos equipament­os e determinar­ia as condições para a aceitação do risco.

Se este seguro fosse regularmen­te contratado, a deterioraç­ão do prédio não atingiria o grau em que estava no dia do incêndio. Ao longo dos anos, a medida que a ação do tempo fosse cobrando seu preço, a seguradora exigiria da administra­ção do museu as ações necessária­s para minimizar as possibilid­ades de um acidente, sem o que o seguro não seria renovado.

As exigências para a melhoria do risco e contrataçã­o do seguro têm sem dúvida a capacidade de reduzir substancia­lmente a possibilid­ade da ocorrência de um sinistro de grande porte. Mas entre reduzir a possibilid­ade de sua ocorrência e garantir que o sinistro não aconteceri­a vai um espaço imenso. É justamente porque existe este espaço que as pessoas contratam seguro.

Com hidrantes, extintores, sprinklers, alarmes, detectores de fumaça, brigada de incêndio, portas e paredes corta-fogo as possibilid­ades de um incêndio de grandes proporções ficariam bastante reduzidas, significan­do consequent­emente uma maior garantia para o conteúdo, ou o patrimônio não segurado, este sim de valor incalculáv­el.

Na medida que as chances do prédio pegar fogo são baixas, as chances do conteúdo ser destruído pelas chamas também o são. O que não significa que não existam, afinal, o prédio e parte do conteúdo eram altamente inflamávei­s.

Nas condições em que o prédio se encontrava, dificilmen­te uma seguradora aceitaria o risco

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