Fazendinha, a ‘casa da vovó’ do time
Aos 90 anos, Estádio Alfredo Schürig resiste ao tempo no Parque São Jorge: em seu gramado, seis títulos foram festejados e craques passaram por lá
O torcedor Edson Gomes tem espaço de sobra nas arquibancadas da Fazendinha para ver Corinthians e Inter de Limeira pelo Campeonato Paulista Sub-20. Menos de cem torcedores procuram a sombra atrás do gol na tarde escaldante de sábado, 1.º de setembro, dia em que clube completou 108 anos. O resto está vazio. Mas ele não foi lá para se esparramar ao sol. Queria matar a saudade de um estádio importante para a memória do clube. Enquanto a Arena Corinthians representa a modernidade, o Estádio Alfredo Schürig é um afago no passado. “Ir à Fazendinha é como visitar a casa da vó”, compara Fernando Wanner, historiador do clube.
Durante décadas, a Fazendinha dividiu com o Pacaembu a simbologia de ser “a casa do Corinthians”. Tudo isso antes de a Arena de Itaquera ser inaugurada em 2014. Construído em 1928, o estádio localizado dentro do complexo do Parque São Jorge recebeu 469 jogos ao longo de sua história. Wanner explica que a Fazendinha atrai torcedores – mesmo com o sucesso da arena de Itaquera – por ter sido uma casa vitoriosa. O time perdeu pouco lá. Foram 347 vitórias, 60 empates e 62 derrotas. E seis títulos paulistas.
A partir da década de 1940, a arena perdeu terreno para o Pacaembu, que passou a receber os grandes clássicos. Durante décadas, a Fazendinha continuou recebendo os jogos diante dos adversários do interior.
Edson Gomes se lembra de um amistoso de 1994, quando Viola voltou consagrado da Copa dos EUA após a conquista do tetracampeonato com a seleção brasileira. “Gosto muito da Arena Corinthians, mas a Fazendinha guarda muito da essência do time”, analisa. Rodrigo Macuco, que está desempregado atualmente, costumava ir ao estádio com o pai para ver o time na década de 1990. “Esse estádio foi importante para a minha infância”, diz ao Estado.
A forte ligação da torcida com a Fazendinha ficou evidente nos últimos meses. Em julho, quando completou 90 anos oficialmente, os torcedores foram convidados para participar de uma reforma que incluía a pintura das arquibancadas. Em dois fins de semana, cerca de 40 voluntários deram cara nova ao
local. A decisão das cores – preto e branco, óbvio, foram as escolhidos – contou com centenas de votos na internet. Recentemente, o clube realizou obras de acessibilidade, ficou mais moderno e reduziu sua capacidade para dez mil torcedores –
na década de 1990, era de 18 mil.
A chance de reviver o passado convive – ironicamente – com um olhar para o futuro. A Fazendinha recebe hoje os jogos das categorias de base do time. É possível acompanhar nomes que podem ganhar chance no
grupo de cima. Um deles é o meia Fabricio Oya, que chegou a atuar com Carille. Rafael Bilu e Fessin são outros cotados. Boa parte dos torcedores nas arquibancadas é familiar de algum atleta. O microempresário Vagner Mora é pai do goleiro da
Inter, rival do Corinthians naquele sábado. Ele também se chama Vagner. “A estrutura é diferente da Arena Corinthians, mas é um estádio agradável”, opina. Jogadores como Rivellino passaram por lá.
A Fazendinha não oferece a mesma quantidade de serviços do estádio em Itaquera. Não existe lanchonete perto das arquibancadas, por exemplo. Prevenidos, muitos torcedores levaram o próprio lanche e fizeram quase um piquenique no cimento branco e preto.
Preferência. Para o técnico Marcos Soares, do sub-17, os jogadores gostam de atuar no local por onde passaram dezenas de ídolos. “Eles ficam emocionados.” Existem questões técnicas nessa preferência. Soares explica que o gramado da Fazendinha é um “tapete” e que a localização facilita os deslocamentos, pois a base costuma treinar no Parque Ecológico do Tietê.
Por outro lado, a comissão técnica prefere que as decisões da base sejam realizadas em Itaquera. Aí, o passado fica de lado. Os técnicos querem que os atletas sintam o clima do time profissional, de olho no próximo passo da carreira de jogador.