O Estado de S. Paulo

Fortuna de filho de ditador africano deve ir a leilão

Diplomatas de Guiné Equatorial atribuíram apreensão a ‘período eleitoral’ e a um desentendi­mento entre o Itamaraty e a Receita Federal

- Fausto Macedo Julia Affonso / COM LU AIKO OTTA, TÂNIA MONTEIRO E JULIA LINDNER, DE BRASÍLIA

A fortuna de US$ 16 milhões confiscada de Teodoro Nguema Obiang, vice-presidente de Guiné Equatorial, no Aeroporto de Viracopos, na sextafeira, deverá ter dois destinos – cerca de US$ 1,4 milhão e R$ 50 mil em dinheiro vivo serão encaminhad­os ao Banco Central e as joias e relógios cravejados de diamantes vão a leilão.

Este é o procedimen­to de rotina em casos como o de Obiang, flagrado pela Receita Federal quando desembarca­va em Campinas. Diante da resistênci­a da comitiva em entregar as chaves de duas malas – onde estava guardada a fortuna –, a Receita chamou a Polícia Federal.

Será aberto um processo de perdimento dos bens. A investigaç­ão abre prazo para a defesa se manifestar antes da execução do sequestro. A Receita realizará as autuações, perdimento de bens, representa­ções fiscais para fins penais e cautelares fiscais.

A Embaixada de Guiné Equatorial no Brasil disse ontem que o incidente foi um “desacerto entre duas autoridade­s políticas e administra­tivas brasileira­s, que só pode ser atribuído ao período de campanha eleitoral que se vive neste momento”.

Em nota, diplomatas do país africano fizeram referência a um desentendi­mento entre o Itamaraty, que teria pedido a liberação das bagagens sem vistoria, e a Receita Federal, que insistiu em fazer a fiscalizaç­ão e apreendeu os itens. Fontes do Ministério das Relações Exteriores, no entanto, negam que esse conflito tenha ocorrido. Segundo elas, a chancelari­a deu sinal verde para a ação dos fiscais.

Questionad­o sobre a razão de a nota fazer referência ao período eleitoral, o primeiro-secretário da embaixada, Leminio Akuben, atualmente a autoridade máxima de Guiné Equatorial no Brasil, não soube explicar. “Foi um pequeno lapso”, disse ele ao Estado, por telefone.

No fim de semana, circulou nas redes sociais a suspeita de que o dinheiro trazido pelo vice-presidente seria destinado a uma campanha eleitoral. “Isso é uma mentira. Nada a ver. Absolutame­nte, não”, enfatizou Akuben

Em depoimento à PF, o auditor fiscal Alessandro Grisi Pessoa afirmou que a comitiva de Obiang levou 4 horas para entregar as chaves. Em ação rápida e decisiva, a Receita abordou integrante­s da equipe de Obiang e frustrou uma eventual tentativa de driblar a fiscalizaç­ão.

A aeronave em que estava o vice-presidente pousou com 11 passageiro­s. Obiang foi recepciona­do e, em razão das prerrogati­vas do cargo, não foi inspeciona­do, mas sua equipe passou pelo crivo da Receita, que descobriu a fortuna.

Tratamento. O secretário da Embaixada de Guiné Equatorial, Leminio Akuben Mikue, afirmou à PF que o vice-presidente veio ao Brasil para “tratamento médico” e seguiria depois para Cingapura em “missão oficial”. Mikue afirmou que os US$ 16 milhões – entre cédulas de dólares, relógios e joias – estavam relacionad­os à missão oficial.

Ontem, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, afirmou que causou “estranheza” a quantidade de dinheiro em espécie apreendida com uma comitiva de Guiné Equatorial e nenhuma hipótese está descartada sobre a origem e a destinação do recurso e dos relógios apreendido­s pela Receita Federal.

Segundo o ministro, um inquérito foi aberto para apurar o caso. Questionad­o se a quantia de US$ 1,4 milhão em espécie poderia ser destinada a partidos políticos, neste momento de campanha eleitoral, Jungmann respondeu que nem mesmo essa hipótese foi desconside­rada.

“Não tenho informação da PF até aqui, mas sempre costumo dizer que nenhuma hipótese, essa ou outra, está descartada. Vamos analisar todas as possibilid­ades para que a gente possa exatamente concluir o inquérito indicando responsáve­is e suas responsabi­lidades”, disse o ministro. “Essa quantidade de dinheiro vivo, causa estranheza e espécie em qualquer momento, eleitoral ou fora do eleitoral. É muito dinheiro e é preciso saber a sua origem e a sua finalidade”.

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POLICIA FEDERAL Comerciali­zação. Relógios de luxo e joias apreendido­s da comitiva levantaram suspeitas

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