Fortuna de filho de ditador africano deve ir a leilão
Diplomatas de Guiné Equatorial atribuíram apreensão a ‘período eleitoral’ e a um desentendimento entre o Itamaraty e a Receita Federal
A fortuna de US$ 16 milhões confiscada de Teodoro Nguema Obiang, vice-presidente de Guiné Equatorial, no Aeroporto de Viracopos, na sextafeira, deverá ter dois destinos – cerca de US$ 1,4 milhão e R$ 50 mil em dinheiro vivo serão encaminhados ao Banco Central e as joias e relógios cravejados de diamantes vão a leilão.
Este é o procedimento de rotina em casos como o de Obiang, flagrado pela Receita Federal quando desembarcava em Campinas. Diante da resistência da comitiva em entregar as chaves de duas malas – onde estava guardada a fortuna –, a Receita chamou a Polícia Federal.
Será aberto um processo de perdimento dos bens. A investigação abre prazo para a defesa se manifestar antes da execução do sequestro. A Receita realizará as autuações, perdimento de bens, representações fiscais para fins penais e cautelares fiscais.
A Embaixada de Guiné Equatorial no Brasil disse ontem que o incidente foi um “desacerto entre duas autoridades políticas e administrativas brasileiras, que só pode ser atribuído ao período de campanha eleitoral que se vive neste momento”.
Em nota, diplomatas do país africano fizeram referência a um desentendimento entre o Itamaraty, que teria pedido a liberação das bagagens sem vistoria, e a Receita Federal, que insistiu em fazer a fiscalização e apreendeu os itens. Fontes do Ministério das Relações Exteriores, no entanto, negam que esse conflito tenha ocorrido. Segundo elas, a chancelaria deu sinal verde para a ação dos fiscais.
Questionado sobre a razão de a nota fazer referência ao período eleitoral, o primeiro-secretário da embaixada, Leminio Akuben, atualmente a autoridade máxima de Guiné Equatorial no Brasil, não soube explicar. “Foi um pequeno lapso”, disse ele ao Estado, por telefone.
No fim de semana, circulou nas redes sociais a suspeita de que o dinheiro trazido pelo vice-presidente seria destinado a uma campanha eleitoral. “Isso é uma mentira. Nada a ver. Absolutamente, não”, enfatizou Akuben
Em depoimento à PF, o auditor fiscal Alessandro Grisi Pessoa afirmou que a comitiva de Obiang levou 4 horas para entregar as chaves. Em ação rápida e decisiva, a Receita abordou integrantes da equipe de Obiang e frustrou uma eventual tentativa de driblar a fiscalização.
A aeronave em que estava o vice-presidente pousou com 11 passageiros. Obiang foi recepcionado e, em razão das prerrogativas do cargo, não foi inspecionado, mas sua equipe passou pelo crivo da Receita, que descobriu a fortuna.
Tratamento. O secretário da Embaixada de Guiné Equatorial, Leminio Akuben Mikue, afirmou à PF que o vice-presidente veio ao Brasil para “tratamento médico” e seguiria depois para Cingapura em “missão oficial”. Mikue afirmou que os US$ 16 milhões – entre cédulas de dólares, relógios e joias – estavam relacionados à missão oficial.
Ontem, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, afirmou que causou “estranheza” a quantidade de dinheiro em espécie apreendida com uma comitiva de Guiné Equatorial e nenhuma hipótese está descartada sobre a origem e a destinação do recurso e dos relógios apreendidos pela Receita Federal.
Segundo o ministro, um inquérito foi aberto para apurar o caso. Questionado se a quantia de US$ 1,4 milhão em espécie poderia ser destinada a partidos políticos, neste momento de campanha eleitoral, Jungmann respondeu que nem mesmo essa hipótese foi desconsiderada.
“Não tenho informação da PF até aqui, mas sempre costumo dizer que nenhuma hipótese, essa ou outra, está descartada. Vamos analisar todas as possibilidades para que a gente possa exatamente concluir o inquérito indicando responsáveis e suas responsabilidades”, disse o ministro. “Essa quantidade de dinheiro vivo, causa estranheza e espécie em qualquer momento, eleitoral ou fora do eleitoral. É muito dinheiro e é preciso saber a sua origem e a sua finalidade”.