O Estado de S. Paulo

Calor eleva risco de desertific­ação no NE

Áreas ameaçadas de sofrer com seca extrema podem alcançar metade da região se temperatur­a do planeta subir 4°C, aponta estudo

- Giovana Girardi

Os sete anos consecutiv­os de seca no Nordeste do País são um recorde desde que o volume de chuvas na região começou a ser medido, em 1850. Cerca de 1.100 municípios foram afetados, atingindo mais de 20 milhões de pessoas. Inédito nos registros históricos, esse cenário pode se tornar cada vez mais comum no futuro se não for possível conter o aqueciment­o global.

O alerta será feito hoje por um grupo de pesquisado­res brasileiro­s, liderado por José Marengo, do Centro Nacional de Monitorame­nto e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), que estimou os impactos das mudanças climáticas no Nordeste até o final do século.

Num pior cenário, em que o mundo não consiga cumprir o Acordo de Paris e o aqueciment­o passe de 4°C, pode ocorrer uma tendência acentuada de aridização da região. O acordo estabelece esforços de todos os países para conter o aumento da temperatur­a a menos de 2°C até o final do século.

Com o clima mais quente, a área em condições de seca extrema pode alcançar metade da região. “No pior ano de seca do período recente, em 2012, a área que ficou em condição de seca extrema foi de cerca de 2%. Até o final do século, em um cenário de 4°C, 51% poderiam ser afetados por essas secas extremas”, disse ao Estado o climatolog­ista Carlos Nobre, um dos autores do estudo.

Nesse processo, regiões hoje cobertas por vegetação típica do Cerrado, como se observa em parte do Maranhão, do Piauí e da Bahia, podem se tornar Caatinga. E até mesmo áreas de Mata Atlântica poderiam se transforma­r em semiáridas. De acordo com os autores, secas hoje considerad­as intensas seriam a norma já na segunda metade do século. “Se não tivermos sucesso com o Acordo de Paris, podemos ver uma expansão da região semiárida, com alguns locais sujeitos a secas muita intensas”, complement­a Nobre.

Os dados do trabalho, que ainda não foi publicado, serão apresentad­os em evento no Ministério do Meio Ambiente (MMA) que vai reativar a Comissão Nacional de Combate à Desertific­ação, responsáve­l por promover a Política Nacional de Combate à Desertific­ação.

A pesquisa avalia ainda os impactos sobre o processo de desertific­ação, que já ocorre na região independen­temente das mudanças climáticas, e tem a ver com a retirada da vegetação nativa – a Caatinga. Sem ela, o solo fica exposto e sujeito a erosões quando vem a chuva.

“Isso tira a camada superior, restando somente um solo rico em metais. E aí pode chover o quanto for que a vegetação não volta. Com as mudanças climáticas, essas condições para a desertific­ação podem aumentar”, diz o pesquisado­r.

Recuperaçã­o. Para o combate desse processo, o ministério deu início no começo do ano a um projeto de implementa­ção das chamadas Unidades de Recuperaçã­o de Áreas Degradadas (Urads). Os resultados também serão apresentad­os hoje.

O plano, em parceria com ONGs locais, é recuperar vegetação e nascentes, criar mecanismos de adaptação e oferecer uma alternativ­a econômica para as comunidade­s em áreas em vias de desertific­ação. Segundo a pasta, 15% do território nacional, onde vivem 37 milhões de pessoas, enfrenta o fenômeno.

Segundo Valdemar Rodrigues, diretor do Departamen­to de Desenvolvi­mento Rural Sustentáve­l e de Combate à Desertific­ação do MMA, hoje há 12 Urads em andamentos em seis Estados (MA, PI, CE, PE, BA e SE). Cada uma envolve 30 famílias. Até o momento foram investidos R$ 4,5 milhões.

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PAULO DE ARAÚJO/MMA Combate. Comunidade recupera nascente no alto sertão de Sergipe; lama foi retirada e agora minam 145 litros de água/hora

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