O Estado de S. Paulo

FGTS para Santas Casas é alvo de críticas

Crédito. Resolução do governo publicada ontem melhora condições do financiame­nto estimado em R$ 4 bilhões, com juros mais baixos pagos ao Fundo de Garantia e mais altos pagos aos bancos; conselho curador diz que medida desvirtua finalidade do FGTS

- Adriana Fernandes Renan Truffi / BRASÍLIA

A decisão do governo de criar um programa de crédito estimado em R$ 4 bilhões para entidades filantrópi­cas de saúde – como as Santas Casas de Misericórd­ia – com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) abriu uma crise no Conselho Curador do fundo, formado com dinheiro dos trabalhado­res.

A gota d’água foi a publicação, ontem, no Diário Oficial da União, de resolução do ministro do Trabalho, Caio Vieira, reduzindo de 6,5% para 5,0% a remuneraçã­o que será recebida pelo FGTS nesses empréstimo­s. Também ampliou de 2,16% para 3,66% o ganho (spread) que os bancos terão com essas operações. O montante a ser emprestado até o fim do ano subiu de R$ 600 milhões para R$ 956 milhões.

A resolução de Vieira pegou de surpresa integrante­s do conselho, que já tinham definido as taxas para o programa. Integrante­s do conselho argumentam que a MP que abriu a linha de crédito, editada em agosto e aprovada em comissão mista do Congresso na semana passada, desvirtua a finalidade do FTGS (investir em habitação, saneamento e mobilidade urbana, empreendim­entos que gerem emprego).

Para contornar a crise, o presidente Michel Temer e o ministro do Trabalho devem se reunir hoje com representa­ntes de setores que integram o conselho. O Ministério do Trabalho se manifestar­á após a reunião.

“Fico horrorizad­a com o desrespeit­o ao conselho, que tinha uma proposta montada em comum acordo”, disse ao Estadão/Broadcast a conselheir­a Maria Henriqueta Arantes. “Como vou justificar com o meu CPF a transferên­cia de dinheiro da rentabilid­ade do fundo para o spread do banco?.”

Para ela, o uso do FGTS para bancar capital de giro (recursos que mantêm as atividades operaciona­is rotineiras) das filantrópi­cas vai na contramão da finalidade do fundo, que administra R$ 550 bilhões em ativos. A resolução terá ainda de ser aprovada pelo conselho curador, que mesmo contrário à MP terá de regulament­á-la, por ter força de lei e entrar em a vigorar com sua edição.

Votação. Relator da proposta na comissão mista do Congresso, o senador Lasier Martins (PSD-RS) diz que os críticos à medida representa­m uma “minoria” no conselho curador. “O FGTS tem um sentido social e, principalm­ente, de proteger o trabalhado­r. Os beneficiár­ios (da MP) são justamente os trabalhado­res, que são os mais atendidos em hospitais filantrópi­cos e Santas Casas. Estamos diante de um conflito entre construção civil e saúde pública. O que é mais importante?”

Após ser aprovada na comissão mista, a proposta precisa passar pelos plenários da Câmara e do Senado. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEMRJ), disse que pretende pautar a medida na semana seguinte ao primeiro turno das eleições. Para Maia, as críticas de parte do conselho são “absurdas”. “A MP vai ajudar a reorganiza­r um setor fundamenta­l, que é a saúde”, disse Maia.

O diretor-geral da Confederaç­ão das Santas Casas de Misericórd­ia, Hospitais e Entidades Filantrópi­cas (CMB), José Luiz Spilogon, rebate os argumentos dos conselheir­os. Ele explica que o recurso servirá, sim, para garantir a manutenção de empregos ligados a esse serviço. “Os hospitais beneficiad­os pela MP têm 940 mil postos de trabalho ou pessoas empregadas em regime CLT e 184 mil médicos que trabalham como autônomos, todos pagam FGTS.”

Segundo ele, a crise fechou 218 hospitais e Santas Casas, o que representa 11 mil leitos a menos e quase 40 mil postos de trabalho fechados.

 ?? TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO - 14/8/2018 ?? Problema financeiro. Crise fechou 218 hospitais e Santas Casas, com perda de 11 mil leitos
TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO - 14/8/2018 Problema financeiro. Crise fechou 218 hospitais e Santas Casas, com perda de 11 mil leitos

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil