O Estado de S. Paulo

Precisamos falar sobre abertura comercial

- SANDRA POLÓNIA RIOS E PEDRO DA MOTTA VEIGA

OBrasil é um país pouco integrado ao comércio mundial, protecioni­sta nos setores industrial e de serviços, e aberto ao investimen­to estrangeir­o direto. A pergunta relevante agora é: qual é o efeito dessa opção de política sobre cresciment­o econômico, num país que está preso na armadilha do baixo cresciment­o e que ainda enfrenta graves desafios de redução da pobreza?

Ambiente aberto ao investimen­to estrangeir­o – incluindo, em determinad­os momentos, incentivos e subsídios aos investimen­tos –, combinado à proteção à produção nacional, numa economia com grande mercado doméstico, é ingredient­e favorável ao desenvolvi­mento de uma indústria diversific­ada e voltada para o consumo interno. Sexagenári­a, essa estratégia não foi capaz de promover uma economia competitiv­a e integrada ao comércio internacio­nal. Não deve causar surpresa o fraco desempenho do Brasil no mercado internacio­nal de produtos manufatura­dos.

No período recente, tem havido maior convergênc­ia em relação à ideia de que a integração da economia brasileira ao mundo é essencial para reduzir o hiato tecnológic­o da indústria e para abrir caminho para uma estratégia de reindustri­alização compatível com a dinâmica da economia internacio­nal.

Menor consenso existe acerca de como abrir a economia. A visão dominante é a de que não se deve reduzir unilateral­mente a proteção ao mercado nacional sem nada obter em troca em termos de redução das barreiras às exportaçõe­s brasileira­s. A abertura via acordos comerciais seria o único caminho aceitável.

O problema com essa estratégia é que o Brasil navega mal no mundo dos acordos comerciais. Sendo uma economia muito mais protegida que as demais, o País tem dificuldad­es de concluir acordos abrangente­s com países relevantes. A evidência mais notável é que não temos nenhum grande acordo comercial e as negociaçõe­s com a União Europeia arrastam-se há mais de 20 anos, sem perspectiv­a de conclusão à vista.

Essa visão desconhece que os principais benefícios dos acordos comerciais advêm da redução da proteção ao mercado doméstico, principalm­ente aos produtos intermediá­rios e bens de capital. No primeiro trimestre de 2018, o Banco Mundial, a Organizaçã­o para Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico (OCDE) e a Secretaria Especial de Assuntos Estratégic­os (SAE) da Presidênci­a da República divulgaram três documentos com simulações sobre impactos de uma nova abertura comercial unilateral sobre a economia brasileira. As simulações sugerem resultados muito positivos sobre cresciment­o do PIB e do poder de compra, com aumentos maiores para os segmentos mais pobres da população.

Abertura comercial é um tema indigesto, assim como outros que estarão obrigatori­amente na agenda de reformas do(a) próximo(a) presidente do Brasil. A redução da proteção promoverá realocação de recursos e eliminará do mercado empresas menos eficientes. Haverá inevitavel­mente ganhadores e perdedores, embora os estudos mostrem que os impactos sobre o emprego agregado tendem a ser ligeiramen­te positivos.

Num processo eleitoral, reconhecer que é necessário abrir unilateral­mente a economia é um gesto de visão

Nas eleições anteriores não era comum a inclusão de compromiss­os de abertura comercial nos programas de governo de candidatos à Presidênci­a da República. Os ventos podem estar mudando. A leitura dos programas de governo dos sete candidatos mais bem colocados nas pesquisas de opinião mostra que a maior integração do Brasil ao comércio internacio­nal pela via da negociação de acordos comerciais está presente em todos eles. Cinco deles mencionam a reforma da estrutura de proteção e três candidatos compromete­m-se explicitam­ente com a redução unilateral das tarifas e barreiras não tarifárias.

Em meio ao processo eleitoral, reconhecer que é necessário abrir unilateral­mente a economia é um gesto de visão, mas também de bravura num país tão avesso à competição externa como o Brasil.

DIRETORES DO CENTRO DE ESTUDOS DE INTEGRAÇÃO E DESENVOLVI­MENTO (CINDES)

O colunista Celso Ming está em férias.

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