O Estado de S. Paulo

Quem manda em quem

- ELIANE CANTANHÊDE E-MAIL: ELIANE.CANTANHEDE@ESTADAO.COM TWITTER: @ECANTANHED­E ELIANE CANTANHÊDE ESCREVE ÀS TERÇAS E SEXTAS-FEIRAS E AOS DOMINGOS

Enquanto Fernando Haddad (PT) não perde uma chance de reforçar que é pau-mandado do ex-presidente Lula, Jair Bolsonaro (PSL) faz o contrário e põe nos seus devidos lugares o vice, general Hamilton Mourão, e o “Posto Ipiranga”, economista Paulo Guedes.

Do hospital, onde continua ativo nas redes sociais, o capitão Bolsonaro cortou as asinhas do general Mourão, que estava doido para substituir o paciente em debates e sabatinas – ou seja, assumir o papel de candidato à Presidênci­a. Bolsonaro foi direto: ou ele vai pessoalmen­te aos debates, ou ninguém vai.

Também cuidou de conter os arroubos do economista Paulo Guedes, que defende imposto único e avançou o sinal ao admitir a recriação da CPMF. “Chega de impostos”, bradou Bolsonaro, tarde demais. Os adversário­s estão fazendo uma festa e reforçando a percepção de que, como o candidato não entende nada de economia (aliás, não só de economia...), o governo seria, na prática, de Guedes. Ou do general, que já defendeu intervençã­o militar.

Todo o episódio confirma o alerta do economista Persio Arida: que o “estatizant­e e corporativ­ista” Bolsonaro vai para um lado e o privatizan­te e liberal Guedes vai para o outro. E aí, que governo sai dessa confusão, caso subam a rampa do Planalto? Ou, como indagam os apressados do mercado, que pularam cedo na campanha Bolsonaro por medo do PT: “E a autonomia do Guedes?”. Não é tanto assim, até porque presidente é presidente, ministro da Fazenda é muito importante, mas é só ministro.

Do lado oposto, Lula é a força e a fraqueza de Haddad. A mais contundent­e confirmaçã­o disso foi a forma tortuosa e sofrida com que reagiu à pressão para dizer se, eleito, iria ou não tirar Lula da cadeia via indulto. Foram muitos talvez, quem sabe, muito pelo contrário, até que o governador de Minas, Fernando Pimentel, disse o que parece óbvio: sim, Haddad no Planalto significa Lula fora da cadeia.

Do ponto de vista eleitoral, trata-se do clássico “pregar para convertido­s”, porque a ideia agrada a quem já naturalmen­te vota no PT. E não atrai votos de quem até simpatiza com o jeitão de Haddad, mas não é petista e não quer soltar Lula a qualquer custo, muito menos admite a volta dele no tapetão.

Foi por isso que, na milésima vez que lhe perguntara­m a mesma coisa, Haddad jogou a toalha e garantiu que não, não vai dar indulto a Lula. Se é verdade ou não, não se sabe, mas ele mandou um recado para Pimentel, que teve de se retratar: ninguém fala por ele (a não ser Lula, claro).

Com essa balbúrdia, os dois favoritos dão farta munição a Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB) e Marina Silva (Rede). “O Brasil não aguenta mais um presidente fraco, que tenha de consultar o seu mentor”, atacou Ciro, ao lembrar o desastre Dilma Rousseff, outro “poste” de Lula. Ciro perdeu o segundo lugar para Haddad, mas tem uma vantagem sobre Alckmin e Marina: não caiu. Assim, se torna a opção mais à mão em caso de uma onda pelo “voto útil” de centro, contra os extremos.

Marina insiste numa campanha considerad­a elegante por uns e ingênua por outros, enquanto perde votos principalm­ente para Haddad. Ao contrário, Alckmin acordou, deu um pulo da cama e partiu para a guerra contra Bolsonaro e, no rastro, também contra Haddad. Suas peças na TV agora são duras, com cenas fortes, fazendo até conexão entre o Brasil e a Venezuela e entre Bolsonaro e Chávez. E foram reforçadas por uma carta de Fernando Henrique Cardoso contra a polarizaçã­o.

Parece improvável que a guinada reverta a favor de Alckmin, mas pode quebrar a convicção antecipada de que a eleição será entre Bolsonaro e Haddad. No mínimo, é um alerta sobre o que pode vir por aí.

Lula manda em Haddad, Bolsonaro tenta mandar em Mourão e Guedes

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