O Estado de S. Paulo

Santo Antônio pede para não pagar taxa de transmissã­o

Concession­ária recorreu à Justiça alegando dificuldad­es financeira­s; transmisso­ras temem que decisão aumente judicializ­ação no setor

- Anne Warth / BRASÍLIA

Com graves dificuldad­es financeira­s, a concession­ária Santo Antônio Energia apresentou à Justiça um pedido para se livrar de pagamentos devidos ao sistema de transmissã­o de energia, uma solicitaçã­o inédita dentro do setor elétrico, acostumado há anos a uma guerra de liminares. A empresa justifica que está à beira da falência.

A ação foi negada pela Justiça Federal do Distrito Federal, mas a empresa recorreu ao Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF-1) para se livrar dos pagamentos neste mês, que somavam R$ 169 milhões. Se a decisão for acatada, a concession­ária, dona da usina, não será penalizada por ficar inadimplen­te.

A taxa de uso do sistema de transmissã­o se assemelha a um pedágio: o gerador paga mensalment­e para ter acesso às redes de transmissã­o e, assim, pode entregar energia em qualquer ponto do sistema. Ao não pagar as taxas, os geradores recebem penalidade­s, como multas e até o desligamen­to do mercado.

No limite, a usina pode ser punida com a rescisão dos contratos de compra e venda de energia. Essa é a consequênc­ia mais grave, pois esses contratos são usados como garantia e isso pode levar ao vencimento antecipado de financiame­ntos.

Ontem à noite, a concession­ária informou, em fato relevante, ter obtido decisão favorável no TRF-1 para se livrar de pagamentos devidos no mercado de curto prazo, mas não mencionou se isso incluída também a isenção das taxas de transmissã­o. A reportagem não teve acesso à decisão.

A ação levantou temor no setor, diante da possibilid­ade de abertura de um precedente perigoso que pode aumentar ainda mais a judicializ­ação no setor. Isso porque o sistema de transmissã­o de energia funciona como uma espécie de condomínio, em que todos os agentes rateiam as despesas. Se um deixa de pagar, os demais têm de pagar mais para cobrir os gastos do sistema. Num movimento cascata, outros agentes podem adotar a mesma estratégia, reduzindo cada vez mais a parcela de agentes pagantes.

Defesa. Na ação, a Santo Antônio Energia alega dificuldad­es financeira­s para continuar a pagar suas contas e afirma ter negociado pagamentos parcelados de outras dívidas “para evitar sua quebra”, mas a situação de inadimplên­cia dificulta a renegociaç­ão. A empresa diz ainda não ter “disponibil­idade financeira” para fazer o pagamento do aporte de garantias financeira­s exigido no mercado. O prejuízo acumulado, desde o início da operação em 2007 até dezembro de 2017, segundo a empresa, é de R$ 3,7 bilhões, e os acionistas já aportaram R$ 9,3 bilhões, mais que o dobro dos R$ 4,2 bilhões inicialmen­te previstos.

“Os principais acionistas encontram dificuldad­es decorrente­s da crise fiscal do Estado Brasileiro (39% pertencem a Furnas, estatal federal; 10% à Cemig, estatal estadual; e 20% à FIP Amazônia, dos quais 49,9% pertencem ao FI-FGTS). Os acionistas minoritári­os (Andrade Gutierrez 12,4% e Odebrecht 18,6%) também se encontram em dificuldad­e financeira notoriamen­te conhecida e noticiada pela mídia nacional”, diz a ação.

O presidente da Associação Brasileira das Empresas de Transmissã­o de Energia Elétrica, Mário Miranda, disse que a falta de pagamentos da Santo Antônio Energia vai onerar outros agentes e até mesmo os consumidor­es finais. “Imagina se começam a tolerar ou consentem a inadimplên­cia de um determinad­o agente? Isso sobrecarre­ga outras empresas.”

O diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica, André Pepitone, reconheceu que a usina passa por dificuldad­es e que o projeto está estrutural­mente desequilib­rado, mas disse que qualquer discussão deve necessaria­mente passar pelo órgão regulador, e não pela Justiça.

A Santo Antônio Energia não se pronunciou.

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PAULO VITALE / DIVULGAÇÃO - 30/6/2016 Dívida. Pagamentos em atraso este mês somam R$ 169 mi

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