O Estado de S. Paulo

Sugerida pela indústria, adoção de cores em rótulos para indicar risco ganha força

Saúde. Anvisa deve apresentar neste ano uma proposta para que as embalagens deixem mais claros os teores de açúcar, sódio e gordura; indústria defende formato de semáforo enquanto defensores de alimentos saudáveis querem dar destaque para advertênci­as

- Lígia Formenti / BRASÍLIA

A proposta da indústria para um novo padrão de rótulos de alimentos voltou a ser considerad­a pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A autarquia discute desde 2014 mudanças nas embalagens, com o objetivo de tornar mais clara a informação para os consumidor­es sobre teores de açúcar, sódio e gordura. A meta da agência é apresentar até o fim do ano um modelo para ser submetido à consulta pública. A indústria defende um formato de semáforo, em que cores indicam se o teor do nutriente é alto, baixo ou médio.

Embora tenha sido descartado da discussão pública feita até agora por ser considerad­a confuso pela equipe técnica da Anvisa, o modelo que adota cores voltou a ser citado. Nomeado por Michel Temer na semana passada, o novo presidente da agência, William Dib, afirmou ser favorável a advertênci­as coloridas nas embalagens, independen­temente do uso do formato de semáforo. As declaraçõe­s provocaram críticas de entidades ligadas a direito do consumidor e alimentaçã­o saudável, que defendem advertênci­as simples, com frases que apenas indiquem alto teor de gordura, sódio ou açúcar. “É um claro retrocesso”, afirmou a diretora-geral da ACT Promoção da Saúde, Paula Johns.

O advogado do Instituto de Defesa do Consumidor, Igor Rodrigues Britto, também ficou surpreso com a retomada da discussão sobre o sistema de cores. “Estranhamo­s. Essa fala é contrária não apenas à análise técnica e científica de sua equipe, como também é distante do que se falou nas reuniões com as organizaçõ­es da sociedade civil”, disse.

Dib afirma que o uso de cores é importante sobretudo para tornar os produtos mais atrativos. “Não queremos quebrar a indústria ou criar dificuldad­es. Queremos ter comparação”, disse. O presidente lembrou de uma reunião realizada na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), há dois meses, quando se afirmou que o formato poderia trazer perdas econômicas para o setor, a exemplo do que teria ocorrido no Chile, que adotou um sistema de advertênci­as. “A embalagem deixou de ser chamativa. Não é esse o espírito”, disse o novo presidente da Anvisa.

Para Dib, o fundamenta­l é que população tenha mecanismos suficiente­s para identifica­r qual a composição do alimento e possa comparar produtos semelhante­s para identifica­r qual apresenta maior ou menor teor de determinad­os nutrientes. Entre as propostas está a de tornar comparável as porções apresentad­as na embalagem. Uma das queixas de técnicos da Anvisa é de que as porções estampadas atualmente na embalagem não refletem a quantidade habitualme­nte consumida e apresentam dificuldad­e para comparação entre alimentos.

O presidente da Associação Brasileira das Indústrias da Alimentaçã­o, Wilson Melo, afirmou ter recebido com “bastante alegria” a notícia de se recolocar a discussão das cores no cenário regulatóri­o. Ele reconheceu ainda não haver dados precisos sobre o impacto financeiro provocado no Chile depois da adoção das advertênci­as em cores escuras. “Assim como não há dados sobre qual impacto que isso provocou para a redução da obesidade naquele país.” A Organizaçã­o Pan-Americana de Saúde, contudo, já se manifestou favoravelm­ente ao sistema de advertênci­as.

Opções. Dib afirmou ainda ser preciso avaliar a possibilid­ade de ter mais de um formato, de acordo com o tamanho da embalagem do produto. E citou refrigeran­tes. “Será que uma lata tem de apresentar um rótulo do mesmo padrão que uma embalagem maior? O que sei é que tem de haver diálogo.”

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GABRIELA BILÓ/ESTADÃO Alerta. Associação comemora e ONG fala em ‘retrocesso’

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