O Estado de S. Paulo

Nas urnas, a economia de 2019

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Um governo irresponsá­vel ou desprepara­do poderá emperrar a recuperaçã­o do País.

Amaior ameaça à economia brasileira no próximo ano pode surgir das urnas, segundo o Banco Central (BC). Um governo irresponsá­vel ou desprepara­do poderá emperrar a recuperaçã­o do País, mal saído, até agora, de uma funda recessão. Se tudo andar bem, o cresciment­o em 2019 poderá chegar a 2,4%, segundo a nova projeção para o Produto Interno Bruto (PIB). Essa estimativa, elaborada “ainda com elevado grau de incerteza”, é condiciona­da à continuaçã­o dos ajustes e reformas indispensá­veis ao fortalecim­ento da capacidade produtiva. A advertênci­a aparece no Relatório de Inflação divulgado ontem. Esse documento, publicado a cada trimestre, resume o quadro econômico nacional e internacio­nal e apresenta cenários prospectiv­os para a produção, os preços e as contas externas. Como de costume, o texto é apresentad­o sem referência explícita à disputa eleitoral ou a outras questões políticas, mas o sentido das preocupaçõ­es é bastante claro.

Provocado por jornalista­s, durante a apresentaç­ão do relatório, o presidente do BC, Ilan Goldfajn, reafirmou a necessária neutralida­de política da instituiçã­o e de seus dirigentes. Mas também reafirmou a importânci­a da continuida­de “essencial e fundamenta­l” dos ajustes e reformas.

Esse requisito é apresentad­o mais de uma vez no documento. Na projeção do PIB para 2019 também se menciona a importânci­a de ações para “aumento de produtivid­ade, ganhos de eficiência, maior flexibilid­ade da economia e melhoria do ambiente de negócios”.

Essas condições aparecem novamente oito páginas adiante, quando se apresenta a projeção das contas externas para 2019. Pelas novas estimativa­s, a corrente de comércio crescerá 6,3%. Mas, como as importaçõe­s aumentarão mais que as exportaçõe­s, o saldo comercial deverá diminuir de US$ 55,3 bilhões em 2018 para US$ 41,6 bilhões no próximo ano. O déficit em transações correntes mais que dobrará, passando de US$ 14,3 bilhões neste ano para US$ 34,1 bilhões em 2019.

São mudanças compatívei­s com uma economia em cresciment­o mais acelerado, embora ainda modesto para os padrões dos países emergentes. O déficit em transações correntes aumentará de 0,8% do PIB para 1,7%, uma proporção segura e facilmente financiáve­l com o investimen­to direto estrangeir­o. Esse investimen­to deve passar de US$ 72 bilhões em 2018 para US$ 80 bilhões em 2019.

Sem novos tropeços, o cresciment­o de 2,4% em 2019 será puxado pela indústria, de acordo com o Relatório de Inflação. A produção agropecuár­ia aumentará 2%; a industrial, 2,9%; e a de serviços, 2%. Será uma composição equilibrad­a e saudável, especialme­nte por causa da capacidade irradiador­a de estímulos da indústria de transforma­ção. Do lado da demanda, o quadro também é satisfatór­io – tanto quanto possível numa economia com expansão de 2,4%.

Desse lado, projeta-se cresciment­o de 2,4% para o consumo das famílias, de 0,5% para o consumo do governo (com certa contenção da gastança) e de 4,6% para o investimen­to produtivo, medido como formação bruta de capital fixo. O consumo familiar ainda será contido pelo desemprego, mas pelo menos haverá perspectiv­a de melhora nas condições de vida, se o governo seguir de fato o caminho da sensatez.

O relatório alerta para o risco de inflação mais alta. Quanto a isso, repete a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC. O risco está associado à instabilid­ade externa, até agora enfrentada sem maiores danos, e à possível frustração quanto a ajustes e reformas.

Se a frustração ocorrer, as pressões para alta de preços serão mais fortes e será preciso elevar os juros para frear a inflação. Os juros, segundo técnicos do mercado, poderão subir na reunião de dezembro do Copom. Até lá as expectativ­as do mercado deverão ser afetadas pelos primeiros movimentos do presidente eleito. Antes da posse ele poderá influencia­r as condições de 2019, tornando difícil, na pior hipótese, evitar o agravament­o da crise. Bastará reafirmar algumas das piores propostas apresentad­as até agora pelos candidatos.

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