O Estado de S. Paulo

Voto preferenci­al: uma ideia

- GUSTAVO H.B. FRANCO ✽ EX-PRESIDENTE DO BANCO CENTRAL E SÓCIO DA RIO BRAVO INVESTIMEN­TOS. ESCREVE NO ÚLTIMO DOMINGO DO MÊS

Ninguém duvida que há muito o que melhorar no nosso sistema político-eleitoral. Muito se fala da reforma política, sempre lembrada como a mãe de todas as outras, mas, infelizmen­te,éa reforma que mais parece obe de cerà máxima enunciada no clássico de Giuseppe di Lampedusa: “Para que as coisas permaneçam iguais, é preciso que tudo mude”.

É fato que nossas últimas reformas políticas parecem desenhadas para proteger o status quo, e a sociedade não está propriamen­te satisfeita com o que temos. Pelo contrário, existe grande predisposi­ção a considerar inovações, e há uma, talvez particular- mente “disruptiva”, cuja adoção vem se multiplica­ndo mundo afora, e sobre a qual deveríamos refletir.

Éo chamado“votopr eferencial ”, ou “voto ordenado ”, também conheci docomo“segundo turno instantâne­o ”.

Trata-se de um sistema que procura aprofunda rumai de iaque resultou consagrada­no País, a eleição em dois turnos. O Brasil adotou esse sistema nas eleições presidenci­ais de 1989 e, desde então, é como se sempre tivesse existido.

O segundo turno serve para que a eleição aponte um vencedor com maioria de votos, portanto, um tipo de pleito que dá um passaporte mais seguro para a governabil­idade do eleito.

O “voto preferenci­al” é uma variante mais elaborada da mesma ideia, eque funciona da seguinte maneira: diante da urna, os eleitores não escolhem apenas o seu candidato favorito, mas também indicam qual seria sua segunda opção, terceira, quarta, assim em diante.

Encerrada a votação, contam-se apenas as primeiras opções de cada voto. Se algum candidato ultrapassa­ra marca de 50%, é declarado vencedor. Não havendo ganhador, elimina-se o candidato com pontuação mais baixa e seus votos passam para a segunda opção de seus eleitores. É feita uma nova apuração. Se ainda não houver vencedor, repete-se o processo de eliminação do menos votado e de recontagem até que um candidato ultrapasse os 50% dos votos.

É claro que isso seria impossível de se praticar numa eleição não eletrônica, tanto que métodos como esse, que envolvem vários escrutínio­s, acham utilização frequentem­ente em colégios eleitorais pequenos, como por exemplo, na escolha para o Oscar de melhor filme ou nas eleições de membros da Academia Brasileira de Letras.

Há muitas variações e modalidade­s de voto preferenci­al e inúmeras experiênci­as bem-sucedidas mundo afora. Sua primeira utilização documentad­a foi na Austrália, onde o método é usado hoje para eleger membros do Legislativ­o. No Canadá ena Nova Zelândia, ométodoé us adoem eleições provinciai­s e para prefeitura­s. Nos EUA, o Estado de M aine e a cidade de São Francisco, utilizamo sistema para eleição de seus respectivo­s governador e prefeito. Apenas a Irlanda usou o método para eleições presidenci­ais diretas. A Índia o faz para a eleição indireta do presidente, pelo Parlamento. Como seria o uso desse método no Brasil?

Bem, para começar, uma boa providênci­a, seria eleger presidente e governador na primeira data, 7 de outubro, e membros dos Legislativ­os federal e estadual na segunda data, 28 de outubro. Seria como na França, onde se escolhe o Parlamento já com o presidente e os governador­es eleitos e ativos na eleição do Legislativ­o.

Para a eleição dos chefes do Executivo, na primeira data, o eleitor teria diantede si uma cédula em que ter iaque ordenar suas preferênci­as par aos 13 candidatos, podendo, se quiser, indicar apenas o seu preferido.

Se, no entanto, possui um desafeto e quer registrar sua rejeição, pode colocá-lo na 13.ª posição, porém, tendo de indicar suas preferênci­as intermediá­rias. A rejeição passa a ser um item a ser trabalhado expressame­nte pelos candidatos, sendo certo que o sistema tende a beneficiar os menos rejeitados.

Esse método reduz considerav­elmente as distorções provocadas pelo “voto útil”, bem como o incentivo às campanhas negativas. O sistema preferenci­al estimula a participaç­ão política e previne as polarizaçõ­es, pois os candidatos também devem se preocupare­m subir na listados eleitores de outros partidos. O voto por convicção em candidatur­as menores nãoé mais visto como desperdiça­do. A preocupaçã­o em expressar sua real preferênci­a fica valorizada­s em prejuízo da revelação de seus desafetos.

Há muitas variações do voto preferenci­al e inúmeras experiênci­as bem-sucedidas

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