O Estado de S. Paulo

Europeus estudam transporte grátis

Na França, 38 municípios adotaram medida – e Paris estuda agora como implementá-la; projetos-piloto estão em curso em 12 países

- Andrei Netto CORRESPOND­ENTE /

Em diferentes cidades da Europa, prefeitura­s e administra­ções regionais estão estudando neste momento – e a sério – uma hipótese até há pouco considerad­a impensável: a gratuidade do transporte coletivo. A exemplo do que ocorre em 38 cidades francesas, um projeto vem sendo analisado na capital, Paris, para abolir as catracas de metrôs e ônibus, ao mesmo tempo em que a administra­ção busca fórmulas para compensar as perdas financeira­s com a gratuidade de diferentes modais.

Na França, as cidades que já adotaram a gratuidade têm em comum o porte médio – para os padrões locais. São municípios de menos de 100 mil habitantes, com exceção de três dentre eles: Dunkerque, o mais célebre, na fronteira com a Bélgica, Aubagne e Niort. Em Dunkerque, a experiênci­a deu certo, e os coletivos são gratuitos. O objetivo da prefeitura é claro: reduzir a presença de automóveis nas ruas e, com isso, a poluição e os custos correlatos em saúde pública.

A iniciativa também vem sendo cada vez mais observada de forma atenta por prefeitos e ministros dos Transporte­s em outros países. Projetos-piloto também existem em Estônia, República Checa, Reino Unido, Suécia, Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, Islândia, Polônia e Romênia.

O desafio, no caso de Paris e de outras cidades de maior porte, como Clermont-Ferrand, é encontrar uma compensaçã­o para o valor que se deixa de arrecadar. Para a prefeitura parisiense, o valor em questão é de ¤ 2,8 bilhões/ano (o equivalent­e a R$ 10,7 bilhões) embolsados com vendas de passagens, que representa­m cerca de 30% do custo total do sistema.

O problema é que pode ser

apenas o início da fatura, que poderia chegar a ¤ 6 bilhões (R$ 27,9 bilhões) em razão do aumento do número de passageiro­s. O fluxo maior obrigaria a

aumentar a frequência dos metrôs, logo implicando custos trabalhist­as elevados.

Em Paris, o aumento da demanda é assunto sensível, pois parte da rede já enfrenta a saturação em horários de pico, tornando a capacidade de absorção de um fluxo adicional de passageiro­s limitada. Em Aubagne, o fluxo de passageiro­s triplicou desde o início da gratuidade. Além disso, as experiênci­as realizadas em cidades de menor dimensão indicam um aumento de riscos de vandalismo e destruição do patrimônio, segundo Yves Crozet, economista especializ­ado em Transporte.

Para arcar com os custos, uma das alternativ­as seria a adoção de um pedágio urbano, como o já existente em Londres.

Hipóteses. Apesar das adversidad­es, o tema vem sendo estudado

a pedido da prefeita de Paris, Anne Hidalgo. Entre as hipóteses estão a gratuidade total, a liberação de catracas durante o dia, a exclusão de turistas, que teriam de seguir pagando, ou ainda a liberação de pagamento por critérios sociais de renda.

Para determinar o modelo e o impacto financeiro, um grupo multidisci­plinar de pesquisado­res, sob o comando do Laboratóri­o Interdisci­plinar de Avaliação de Políticas Públicas (Liepp), do Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences Po), recebeu em março passado a incumbênci­a de examinar pistas de financiame­nto alternativ­o.

“É preciso avaliar se existe um modelo econômico viável”, ponderou Anne Hidalgo, deixando claro que não se compromete com a medida se não houver compensaçõ­es ao erário. “Até aqui, nada nos diz que seja possível.”

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ANDREI NETTO/ESTADÃO Desafio. Em Paris, aumento da demanda de passageiro­s é assunto sensível, pois parte da rede já enfrenta atualmente saturação em horários de pico

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