Meninas lidam melhor com economia diária
Ensino. Pisa mede habilidades como a leitura de boleto e a interpretação de mensagens sobre uma conta bancária; nota delas é de 397,5, enquanto que a deles fica em 389,2. Para especialistas, explicação passa por organização familiar e aspectos emocionais
Estudantes brasileiros de 15 e 16 anos que participaram do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), realizado pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), têm, em geral, baixo desempenho na área que mede o letramento financeiro. Mas a nota delas ultrapassa a deles, apesar do desempenho pior das garotas em Matemática. Isso mostra que as meninas têm mais habilidade para lidar com o dinheiro.
Um estudo elaborado pelo Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede) compilou dados de 23.141 estudantes brasileiros que fizeram a prova em 2015 – segundo ano em que o teste de letramento financeiro foi aplicado pelo Pisa. A nota média das meninas é 397,5, enquanto que a dos meninos cai para 389,2. Ambos, porém, estão abaixo do nível mínimo adequado (400 pontos).
A avaliação do Pisa mede habilidades como a leitura de um boleto e a interpretação de mensagens sobre uma conta bancária. Para especialistas ouvidos pelo Estado, a diferença de desempenho entre os gêneros expõe uma característica da área: o letramento financeiro não depende apenas do domínio de cálculos matemáticos – para o qual as meninas, historicamente, recebem menos incentivo.
Segundo Ernesto Faria, diretor do Iede, o aspecto emocional ajuda a explicar o resultado. “Algumas avaliações socioemocionais já apontam as meninas melhores em conscienciosidade, em buscar tomar consciência para decisões.”
Outra hipótese está na organização das famílias: as jovens estariam mais habituadas ao manejo com o dinheiro por serem envolvidas, desde novas, em atividades domésticas das quais os meninos são culturalmente apartados. “Muitas são responsáveis por coisas em casa e, com isso, são obrigadas a administrar”, diz Ana Rosa Vilches, diretora pedagógica da DSOP Educação Financeira, que faz capacitações em escolas.
Mudança de hábito. A educação financeira é vista como forma de oferecer ferramentas para que os estudantes adotem estratégias de consumo conscientes no futuro. “O brasileiro poupa pouco e não se planeja para o consumo”, diz Luís Gustavo Mansur, chefe do Departamento de Promoção da Cidadania Financeira do Banco Central.
O tema foi incluído na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que vai definir a aprendizagem de todo o ensino básico. A ideia é que a educação financeira seja trabalhada de forma transversal, em disciplinas como Ciências e Matemática. O estudo do Iede mostrou que um em cada três estudantes já teve o conceito nesses moldes. Procurado, o Ministério da Educação não quis comentar o estudo.
Para Amarildo Melquíades da Silva, professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e especialista no tema, é importante que as estratégias nas escolas levem em conta a realidade socioeconômica dos alunos. “Uma educação financeira nas públicas pode formar crianças e adolescentes para ajudar os pais. Para as classes altas, gostaríamos de trabalhar conceitos de sustentabilidade e respeito em termos salariais aos seus empregados.”