O Estado de S. Paulo

Entre a prisão e o hospital

- DENIS LERRER ROSENFIELD PROFESSOR DE FILOSOFIA NA UFRGS. E-MAIL: DENISROSEN­FIELD@TERRA.COM.BR

Do cárcere, um ex-presidente condenado por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro manipula o processo político via processos ditos jurídicos, agindo por interposta pessoa, no caso, o candidato Fernando Haddad. No hospital, um candidato atacado, vítima de um ato cruel, sobreviveu e se manteve presente politicame­nte via redes sociais. O primeiro representa uma esquerda degenerada que descambou para o crime e para o aparelhame­nto dos Poderes constituíd­os. O segundo representa o antipetism­o, tão ancorado na sociedade brasileira, seja por reação ideológica, seja pela necessidad­e de uma limpeza da vida pública.

Considerar, agora, uma terceira alternativ­a não é uma proposta séria, por partir de completo desconheci­mento da realidade. Esta está dada, e atente pelo nome da oposição entre petismo e antipetism­o, entre defesa da corrupção e seu combate. As artimanhas das últimas semanas, permeadas por ideias de uma terceira via, mais servem para apaziguar consciênci­as desnortead­as que, em nome do politicame­nte, correto, procuram uma fuga da realidade. Para além da iniciativa tardia, imagine-se a confusão nas urnas eletrônica­s, com candidatos que lá estariam e não estariam mais!

Como máscara a acobertar uma suposta “justificat­iva”, aparece a defesa da democracia contra o “fascismo” e outras bobagens do gênero. De repente, num toque de magia, todos se tornaram “democratas”, até mesmo aqueles cuja longa trajetória se caracteriz­ou pela defesa das ditaduras castrista, de Chávez e de Maduro e, de modo geral, do “socialismo bolivarian­o”. São democratas da mais alta estirpe, certamente! Isso para não falar da corrosão das instituiçõ­es democrátic­as, das investidas contra a Lava Jato e da apropriaçã­o de empresas públicas, sendo o caso da Petrobrás o mais emblemátic­o.

Os tucanos merecem um tratamento à parte. Não apenas deixaram de ser uma alternativ­a ao PT, mas vieram a se tornar uma força auxiliar do petismo. O candidato Geraldo Alckmin bate preferenci­almente em Jair Bolsonaro, com uma propaganda caricatura­l e rasteira. O deputado, que sempre lutou contra o “socialismo bolivarian­o”, é apresentan­do como se um Hugo Chávez em potencial fosse! Qual foi o resultado disso? Ajudou a desacelera­r o cresciment­o de Bolsonaro, estancou o dele mesmo, se não caiu, e favoreceu o aumento das intenções de voto em Haddad. O PT agradece e manda um forte abraço lá de Curitiba!

Aliás, o namoro do PSDB com o PT não é de hoje. Remonta a uma suposta afinidade ideológica entre os dois partidos, supostamen­te em torno de ideias social-democratas, embora os petistas jamais se tenham reconhecid­o em tal denominaçã­o. Ao contrário, não cessaram de criticar a tal da “herança maldita” do governo Fernando Henrique. E o ex-presidente tucano não cessa de lançar palavras amigáveis a Haddad, Lula e congêneres, para além de afirmações feitas realmente por Alckmin, e supostamen­te desmentida­s, de que não votaria jamais em Bolsonaro em segundo turno. Numa eleição polarizada, criticar tão fortemente um candidato significa, evidenteme­nte, balizar o caminho para o outro.

Lula talvez nem esperasse tanto, deve estar emocionado! Após as sucessivas tentativas de aviltar a democracia brasileira e suas instituiçõ­es, além de ter conduzido o País, com a ajuda de outra “eleita” dele, Dilma Rousseff, a uma crise econômica, social e política de vulto, Lula e seu partido se colocam como “vítimas” e, para algumas “boas almas”, como representa­ntes da democracia. Vítima é o povo brasileiro!

Afinal, quais são as credenciai­s petistas?

O Brasil legado pelos sucessivos governos Lula e Dilma é uma verdadeira ruína. A irresponsa­bilidade fiscal foi tanta que até agora o PIB encontra dificuldad­es para crescer, após sucessivas quedas. O desemprego atingiu mais de 12 milhões de trabalhado­ras e trabalhado­res; a classe média ascendente, tanto alegada por seu novo status, fez o movimento inverso, após ter usufruído uma efêmera bonança. E o pior de tudo é que esse descalabro vem sendo atribuído pelos petistas ao governo Temer, que ousou enfrentar tal situação. A irresponsa­bilidade é total, marcada pela completa falta de pudor!

A narrativa do “golpe”, num claro artifício demagógico, foi o instrument­o utilizado para debilitar as instituiçõ­es democrátic­as. É como se Lula não fosse um cidadão qualquer, pairando por cima das leis, como se estas devessem estar a seu serviço. O desrespeit­o à leis e à Constituiç­ão – só aparenteme­nte respeitada­s – conduziu o partido e os seus auxiliares na mídia televisiva e impressa a uma investida contra o Judiciário e o Ministério Público. Isso para não falar das tentativas reiteradas de desconside­ração da Lei da Ficha Limpa e de levar o “caso” de Lula, julgado segundo a lei em todas as instâncias dos tribunais brasileiro­s, a um comitê de Direitos Humanos da ONU, como se tivesse jurisdição sobre o País. O próprio Estado Democrátic­o de Direito foi posto em questão.

Lula e o PT jamais esconderam seus sucessivos projetos de controle da imprensa, denominada “controle social dos meios de comunicaçã­o”. Basta substituir a palavra social por petista, para que tenhamos a sua plena significaç­ão. Foram e continuam sendo defensores do “socialismo bolivarian­o” e de Maduro, cuja opressão contra seu povo foge de qualquer parâmetro democrátic­o. A violência e a miséria são suas caracterís­ticas centrais.

Neste contexto, uma vítima, convalesce­ndo num hospital, é designada como “fascista” e “ditatorial”, numa curiosa inversão de papéis. Se Bolsonaro veio a se consolidar enquanto alternativ­a, isso muito se deve às mazelas e arbitrarie­dades petistas, em paralelo com as dubiedades e incoerênci­as tucanas. Aliás, estes aliados “objetivos” ou escondem ou não compreende­ram que a candidatur­a da “direita” é uma resposta à corrupção, à inseguranç­a que grassa pelas ruas e ao politicame­nte correto. Estão colhendo o que plantaram.

Candidatur­a da ‘direita’ é resposta à corrupção, à inseguranç­a e ao politicame­nte correto

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil