Inversão de escolas
Ao assumir a liderança do Campeonato Brasileiro (à frente do Internacional pelo saldo de gols), o Palmeiras chega à posição que naturalmente poderia, ou deveria, ter ocupado há mais tempo na tabela. Afinal, em praticamente todos os campeonatos por pontos corridos os elencos com maior investimento ficam à frente.
O dinheiro pesa. Mas nem sempre isso acontece no Brasil. Os motivos? Trabalhos ruins de comissões técnicas encabeçadas por treinadores superestimados, jogadores que não valem tanto quanto por eles se paga, atraso técnico e tático, nivelamento por baixo. São os mais claros problemas da bola que rola pelo País. E que nem sempre rola em meio a tantos chutões e cruzamentos. Certame curioso o Brasileiro, até ontem liderado pelo time com menor número de passes trocados, o São Paulo de Aguirre, que se encaixa no perfil “reativo”, para usarmos expressão da moda. Ou seja, joga fechado e pelo contragolpe, com pouco tempo de posse de bola. Sim, ela pode ficar por mais tempo com o rival, isso faz parte da estratégia.
Nos campeonatos mais importantes da Europa na temporada passada, praticamente todos os times que ergueram os troféus tiveram mais posse de bola. Foi o caso do Manchester City na Inglaterra, Bayern na Alemanha, PSG na França e Barcelona na Espanha. Exceção foi a Juventus na Itália, atrás do Napoli de Maurizio Sarri, hoje técnico do Chelsea, um ortodoxo adepto da posse de bola. Todos venceram os certames de seus países com o elenco mais caro, ou um dos maiores investimentos. E é raríssimo que um time que tem pouco apreço pela redonda chegue à frente nessas ligas, como aconteceu com o Leicester.
O campeão inglês de 2016 tinha o 19.º investimento em atletas entre 20 clubes. Detalhe: o São Paulo, que perdeu a liderança, é o sexto no ranking.
E os novos líderes não adotam filosofia diferente, pelo contrário, tanto que o Palmeiras é 13.º em passes trocados sob o comando de Luiz Felipe Scolari. O Inter, 12.º no período. O time paulista era oitavo com o técnico anterior. E quem liga para isso? Importa é vencer, seja como for, mesmo que seu investimento permita alcançar tantas ou mais vitórias jogando melhor.
O fracasso de Roger Machado, seus tropeços ante rivais inferiores e o discurso minimizando maus resultados, não apenas levaram à degola como pavimentaram o caminho para o retorno do jogo rústico. Um estilo ainda eficaz por aqui, com a bola que (não) se joga (mais) em nosso País. Não por acaso a liderança muda de dono, não de estilo.
O torcedor comemorará resultados, para ele os fins justificarão os meios. Ao analista de futebol, cabe discutir as entranhas do jogo, questionar estilos e (falta de) qualidade. Até porque o torneio ainda não chegou ao fim e embora a liderança venha se revezando entre equipes que não fazem muita questão da bola, há quem dela goste e ainda lute pelo título. Os passes acumulados pelo Palmeiras equivalem a 74% dos somados pelo Grêmio, que na comparação com o São Paulo vê o índice cair a 62%. Outrora time de força, raça e jogo duro, o campeão da Libertadores virou representante do velho estilo brasileiro. Nessa inversão de escolas, a boa notícia é que ainda não chegou o dia no qual todos entrarão em campo oferecendo a pelota ao adversário.
Alguns dos líderes do Nacional não são times que mais ficam com a bola
Copa do Brasil. O demasiado respeito ao indolente e caro time do Flamengo no Maracanã se confirmou desnecessário quando o Corinthians venceu em Itaquera. Como Jair armou retranca no Rio, a conclusão de muitos foi de que a ojeriza à bola é marca do clube desde outros treinadores. Um erro, pois o Corinthians é o terceiro que mais troca passes na Série A. Em 2017, ganhou o Brasileiro liderando tal ranking.