O Estado de S. Paulo

‘Se quiser uma chance, Haddad terá de se colocar acima do PT’

Rafael Cortez diz que desafio será retomar capacidade de gerar coalizões para tomar decisões importante­s

- Renée Pereira

Para o analista político da Tendências Consultori­a Integrada, Rafael Cortez, o segundo turno vai exigir um esforço muito maior do candidato do PT Fernando Haddad do que de Jair Bolsonaro (PSL), que teve maioria dos votos ontem. “Haddad tem de se colocar como líder acima do partido se quiser ter alguma chance.”

• Como o sr. vê segundo turno? Vejo uma dinâmica eleitoral muito peculiar porque vão se contrapor duas forças com uma rejeição muito alta. Ainda que Bolsonaro já esteja no limiar da vitória, a eleição ainda é muito competitiv­a. Do ponto de vista do PT, que tem o desafio de recuperar um déficit grande em relação ao Bolsonaro, vai ser justamente a capacidade de fazer uma união com forças distintas do petismo. Uma parcela dessa votação no Bolsonaro é o eleitorado punindo o PT pelo desempenho ao longo do governo Dilma e, depois, por causa dos desdobrame­ntos da Operação Lava Jato. Então, para tirar um pouco essa marca negativa de associação com o PT, o Haddad tem de se colocar como um líder acima do partido, se quiser ter alguma chance relevante.

• É uma tarefa difícil diante do cresciment­o do antipetism­o? Sim. O eleitorado antecipou um movimento esperado par o segundo turno. O antipetism­o estava razoavelme­nte disperso enquanto não havia o cresciment­o do Haddad. Na medida que ele emergiu, o antipetism­o veio a galope. Daí a necessidad­e de ele se colocar como uma liderança multiparti­dária. Se ficar simplesmen­te como continuida­de do Lula, provavelme­nte não vai ter resultado.

• Ele fez isso no primeiro turno? Sim, e entendemos a razão. O PT fez uma campanha apostando num nome (de Lula) que não teria condições legais de disputar a eleição e o cresciment­o do Haddad, num curto espaço de tempo, teria de vir por essa identifica­ção. De fato, isso ocorreu, mas não é suficiente para gerar uma vitória quando a competição é de dois turnos e com esse sentimento antipetism­o muito elevado.

• E o Bolsonaro? Acredito que ele vai tentar trazer algum elemento que não ficou destacado no primeiro turno, como atrair o baixa renda do Nordeste. Mas o Bolsonaro tem uma vantagem não só por ter desempenho positivo no pri- meiro turno, mas pelo papel que se coloca na campanha. Ele é resultado de uma dupla rejeição: ao PT e ao governo Temer/política tradiciona­l. O fato de o Bolsonaro representa­r um descolamen­to maior do sistema torna a relação dele com o eleitorado mais livre e com menos constrangi­mento

• Como o País sai dessa eleição? O Brasil conseguiu preservar a democracia. Contudo, o desafio é superar o questionam­ento da legitimida­de de algumas institui- ções que são fundamento­s da democracia e especialme­nte a capacidade do sistema político brasileiro de gerar coalizões está- veis, que foi algo que esteve ausente nesse último período 2015/2018. Estabilida­de de coali- zão significa que o mecanismo da cooperação ainda é positivo, em que os conflitos são canaliza- dos pelos partidos políticos e eles não impedem tomadas de decisões importante­s, como as reformas. Temos um quadro so- cial muito complicado por causa da crise econômica e a não reso- lução dos problemas tem consequênc­ias

sociais sérias.

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AMANDA PEROBELLI/ESTADÃO–11/6/2018

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