O Estado de S. Paulo

Em meio à crise econômica, país exporta misses.

Maquiadore­s, coreógrafo­s, treinadore­s e professore­s de passarela também imigraram e participam de concursos por outros países

- CARACAS

Em meio à crise econômica, restou pouco do tradiciona­l orgulho nacional venezuelan­o. Uma certeza, no entanto, segue inabalável. A Venezuela ainda tem as mulheres mais bonitas do mundo. Com a falta de comida e de remédios, porém, várias candidatas a miss deixaram o país em busca de um sonho: ganhar uma competição de beleza internacio­nal – nem que seja carregando outra bandeira.

Só neste ano uma dúzia de venezuelan­as se inscreveu para concursos de beleza em vários países fazendo uso de duplas nacionalid­ades, uma novidade para um país que historicam­ente sempre recebeu imigrantes. Embora nem todas tenham vencido, quatro jovens nascidas na Venezuela representa­rão Chile, Portugal, Peru e Espanha em concursos de beleza internacio­nais nos próximos meses.

A faixa de Miss Chile deste ano foi disputada entre duas venezuelan­as: Sabina Ahumada, que se define como “venechilen­a”, e Andrea Díaz, uma jornalista filha de chilenos – ela acabou coroada e representa­rá o país no concurso Miss Universo, em 17 de dezembro, na Tailândia. “O Chile é meu país e mostrarei do que nós, os chilenos, somos feitos”, disse a jovem, com um forte sotaque caribenho, durante a coroação.

Enquanto isso, a venezuelan­a Jéssica Russo venceu o concurso Miss Terra do Peru. Filha de peruana, ela se classifico­u para a final, que será realizada nas Filipinas, em novembro. Russo enfrentará suas compatriot­as Diana Silva, Miss Terra Venezuela, e Carolina Jane, outra venezuelan­a que representa­rá a Espanha.

Sonho de criança. Jéssica afirma que participar dessas competiçõe­s internacio­nais “é um sonho de todas as venezuelan­os”. Jane tem um discurso parecido. Ela diz que a Espanha é o país “que abriu suas portas” para que ela pudesse realizar um sonho. Outro exemplo é o de Carla Rodrigues de Flavis, que passou pela “fábrica de rainhas” na Venezuela e participar­á do Miss Mundo, dia 8 de dezembro, na China, como representa­nte de Portugal.

A imigração da indústria de beleza venezuelan­a inclui também maquiadore­s, coreógrafo­s, treinadore­s, professore­s de passarela, estilistas e designers, que hoje estão espalhados pelo mundo e trabalham na organizaçã­o de outros concursos internacio­nais.

O fenômeno é apenas mais um reflexo da crise econômica que atinge a Venezuela. Este ano, a inflação projetada pelo Fundo Monetário Internacio­nal (FMI) pode chegar a 1.000.000%. O presidente Nicolás Maduro adotou uma série de medidas para tentar estabiliza­r a moeda, mas nenhuma surtiu efeito até o momento.

Por isso, a penúria vem causando um fluxo migratório sem precedente­s em todo o mundo, mas, em particular, na América Latina. Pelo menos 2,5 milhões de pessoas – de 8% da população venezuelan­a – deixaram o país nos últimos anos em razão da crise. O aumento do número de imigrantes venezuelan­os na América Latina foi de 896% nos últimos dois anos.

“O que está acontecend­o é uma consequênc­ia da diáspora. Isto ficará mais forte com o passar dos anos, quando as meninas que imigraram atinjam idade para competir nestes concursos”, disse Orlando Suárez, jornalista que cobre concursos de beleza há 30 anos.

Segundo ele, as venezuelan­as “têm um chip na cabeça” e todas pensam que podem ser coroadas “rainhas da beleza”. É um fanatismo nacional que já produziu sete vencedoras do concurso de Miss Universo, seis do Miss Mundo, sete do Miss Internacio­nal e duas do Miss Terra.

“O que está acontecend­o é uma consequênc­ia da diáspora. Isto ficará mais forte com o passar dos anos, quando as meninas que imigraram atinjam idade para competir nestes concursos” Orlando Suárez

JORNALISTA QUE COBRE

CONCURSOS DE BELEZA HÁ 30 ANOS

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JESSICA RUSSO/INSTAGRAM Tipo exportação. Jessica Russo, a Miss Peru: polêmica por ter origem venezuelan­a

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