‘Traidor eu não sou’, diz Alckmin
Tucanos discutiram durante reunião em que ex-prefeito cobrou mais verbas para candidatos que, como ele, vão disputar o 2º turno
Geraldo Alckmin (ao centro, na foto) interrompeu fala do candidato do partido ao governo de SP, João Doria, em reunião da Executiva Nacional do PSDB, em Brasília. ‘Temerista’ e ‘traidor eu não sou’, disse Alckmin. Na campanha, Doria se distanciou do padrinho e se aproximou de Bolsonaro. O ex-prefeito afirmou não ter ‘ressentimentos’. PSDB ficará neutro no 2º turno.
Dois dias após amargar o quarto lugar na corrida ao Planalto, o presidente nacional do PSDB, Geraldo Alckmin, criticou o candidato do partido ao governo de São Paulo, João Doria, durante reunião da Executiva Nacional da sigla, na tarde de ontem em Brasília. Em áudio obtido com exclusividade pelo Estado, o ex-governador interrompe a fala de Doria por duas vezes. Na primeira, o chama de “Temerista” e, na segunda, insinua que o ex-prefeito o traiu: “Traidor eu não sou”, diz Alckmin. Procurado, Doria afirmou que não guarda “ressentimento”.
O ex-prefeito de São Paulo cobrava do partido mais ajuda financeira às campanhas dos candidatos a governos estaduais que passaram para o segundo turno – ele vai disputar o Palácio dos Bandeirantes com o sucessor de Alckmin no cargo, Márcio França (PSB).
“Não posso imaginar que um partido da dimensão do PSDB não tenha projetado a existência de um segundo turno, seja para Presidência da República, seja para os governos. Se não fez, errou”, diz, pouco antes da primeira intervenção de Alckmin. Ele cita as campanhas de Antonio Anastasia (MG) e Eduardo Leite (RS) para criticar a falta de repasses.
Em seguida, Doria continua sua fala e afirma que o partido deve se concentrar na eleição de seus seis representantes que passaram para o segundo turno. “Terminada a eleição, aí sim fazermos, de forma dedicada, uma avaliação completa sobre erros, acertos, sobre equívocos, pontos onde o PSDB não cumpriu seu papel. De uma forma mais incisiva, reconheço, mas não podemos fugir dessa avaliação. Teremos de fazer novamente”, afirma o ex-prefeito.
Nesse momento, Alckmin afirma a Doria: “O ‘Temerista’ não era eu não, era você”. E diz na sequência: “Você, você”, numa associação com o governo federal marcado pelo alto grau de impopularidade. Alckmin era contrário ao ingresso do PSDB no governo.
Doria rebate, dizendo que Alckmin estava diante de dois ex-ministros de Temer e que, por isso, não poderia desrespeitá-los. Ele cita o senador José Serra, que foi ministro das Relações Exteriores, e o deputado federal Bruno Araújo, que comandou a pasta de Cidades. Ambos fazem parte da Executiva. Também ressalta que o senador Aloysio Nunes segue no governo. “Vamos ter discernimento em relação a isso, calma e equilíbrio.” Alckmin então diz: “Traidor eu não sou”. E outra pessoa, não identificada, completa: “Nem falso”.
Apoio. Sem alteração na voz, Doria pede novamente calma e equilíbrio. “Não vou entrar nesse mérito em respeito a você, mas volto a dizer que nós precisamos ter uma posição definida pelo partido para o segundo turno com os seis candidatos que aqui estão e que precisam do apoio para vencer as eleições. Geraldo, compreendo evidentemente sua situação e o ideal era que você pudesse ter vencido as eleições, não há dúvida, mas agora temos de preservar e salvar o PSDB nos seis Estados.”
Procurado, Doria disse que a discussão não vai abalar sua relação com o ex-governador. “Geraldo teve um momento de dissabor pessoal, da minha parte tem o meu perdão. Nada que possa abalar as nossas relações”, disse. “Quando se sai da campanha com resultado inesperado, isso abala emocionalmente, gera sofrimento pessoal”, emendou ele. “Minha manifestação não foi bem recebida, mas eu relevo.”
Ele estava ao lado do prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando, que no dia da eleição pediu que Alckmin deixasse a presidência do PSDB. Ao ser questionado se também defendia a saída do ex-governador, Doria não respondeu.
Alckmin não quis pôr mais lenha na fogueira, mas também deu estocadas na direção de Doria. “Mario Covas já dizia que não se faz política pela imprensa”, afirmou. “Se outros fazem, eu não o farei.”