O Estado de S. Paulo

NA 25 DE MARÇO, CAMELÔS VENDEM ‘LANTASER’ NA RUA

Itens são procurados principalm­ente por mulheres para defesa pessoal

- Leonardo Zvarick ESPECIAL PARA O ESTADO

Lanternas que disparam choques elétricos são vendidas livremente por ambulantes na região da Rua 25 de março, centro de São Paulo. Na travessa Comendador Afonso Kherlakian, conhecida pelo comércio de eletrônico­s, é possível ouvir os estalos de longe. “Compre aqui seu ‘lantaser’, cabe na bolsa e derruba bandido na hora”, anunciam aos gritos os vendedores.

Os itens são procurados principalm­ente por mulheres interessad­as em defesa pessoal. “Este aqui tem muita procura, já saíram mais de 20 hoje”, diz um dos ambulantes. Os valores variam de R$ 50 a R$ 100, a depender do modelo. Alguns vendem também spray de pimenta, pelo preço médio de R$ 60.

A cerca de 100 metros, uma dupla de policiais militares não intimida o comércio informal. “A nossa orientação é apreender e encaminhar para a delegacia, mas se a gente tenta chegar perto eles correm ao menor sinal”, disse um dos PMs.

Segundo o ex-comandante­geral da PM de SP, Benedito Roberto Meira, cabe à polícia fiscalizar e reprimir o comércio desse tipo de item, tanto por ser produto de descaminho (quando a mercadoria atravessa a fronteira sem nota fiscal) quanto por se tratar de armas. “Portar ou vender se caracteriz­a como contravenç­ão penal.”

Ele também desestimul­a o uso das lanternas de choque como ferramenta de defesa pessoal. “Muita gente se ilude, acha que vai ficar mais segura, mas, estatistic­amente, pessoas que andam armadas e reagem têm 88% mais chance de serem agredidas em um assalto”, diz, citando análise de 2015 do Centro de Estudos em Criminalid­ade e Segurança Pública da Universida­de Federal de Minas Gerais.

Os produtos, que vêm acompanhad­os de caixa e manual de instruções, são fabricados na China. Segundo os manuais, bastante resumidos, a voltagem chega a 15 mil V e a amperagem a 2,5 A. Apesar de os vendedores alardearem que a arma pode matar, o cardiologi­sta do Incor Sérgio Timerman desmente. “Com essas especifica­ções, o alcance do choque normalment­e vai no máximo à camada dos músculos, com ação local e sem maiores danos.”

Em caso de denúncia, a Polícia Militar e a Polícia Civil comparecem ao local e executam os procedimen­tos de verificaçã­o e apreensão.

Lei. De acordo com o Estatuto do Desarmamen­to (Lei 10.826/2003), é atribuição do Comando Logístico do Exército fiscalizar produção, exportação, importação e o comércio de armas e produtos controlado­s, ou seja, de uso restrito a pessoas legalmente habilitada­s.

Pistolas de choque que lançam dardos (como os modelos Taser e Spark) e spray de pimenta são classifica­das como produtos controlado­s. Seu uso é autorizado somente por órgãos de segurança pública. A máquina de choque de contato, no entanto, não passa pelo controle do Exército – sua posse, portanto, não configura crime.

Para o ex-secretário nacional de Segurança Pública, coronel José Vicente, é um erro não controlar a venda desses produtos. “Essa divisão do Exército regulament­a uma série de produtos, até blindagem de carro. É absurdo que não haja nada específico sobre essas armas.”

Em nota, a Assessoria de Comunicaçã­o Social do Exército Brasileiro disse que a venda ilegal de produtos controlado­s pode acarretar processo criminal.

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WERTHER SANTANA/ESTADÃO Demonstraç­ão. Valores variam de R$ 50 a R$ 100; ordem policial é para apreender e consultor defende lei mais rígida

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