O Estado de S. Paulo

Programas e discursoss­ão contraditó­rios

Bolsonaro e Haddad passam sinais diversos dos que foram dados por suas assessoria­s

- Luciana Dyniewicz Cleide Silva

A incoerênci­a e a superficia­lidade nas propostas de política fiscal dos candidatos Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) estão entre as principais fontes de inquietude dos economista­s e empresário­s. Segundo eles, é natural que os candidatos evitem temas espinhosos, como um ajuste fiscal, às vésperas da eleição, mas, neste ano, o debate político está ainda mais incongruen­te: “Não se sabe qual é a plataforma dos dois”, diz a economista-chefe da XP Investimen­tos, Zeina Latif.

Do lado do candidato de direita, o projeto de vender estatais para equilibrar as contas públicas – que já era questionad­o por especialis­tas – perdeu ainda mais credibilid­ade após Bolsonaro criticar a privatizaç­ão da Eletrobrás. Do lado do candidato de esquerda, não há definição sobre a disponibil­idade ou não de realizar uma reforma da Previdênci­a nem em relação ao modelo que seria adotado.

“Essa conversa (de Paulo Guedes, guru econômico de Bolsonaro, indicado para ser ministro da Economia) de zerar o déficit em um ano com privatizaç­ões é conversa para boi dormir”, diz o economista-chefe da LCA Consultore­s, Bráulio Borges. Cálculos do economista apontam que uma eventual onda de privatizaç­ões não arrecadari­a mais que R$ 400 bilhões, incluindo estatais como Banco do Brasil, Petrobrás e Eletrobrás. A campanha de Bolsonaro, que falava em levantar R$ 1 trilhão com a venda de ativos, já anunciou que essas empresas ficariam de fora do projeto.

Borges acrescenta que a relação entre Guedes e Bolsonaro lembra a da ex-presidente Dilma Rousseff e do ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy. “Havia uma tensão inerente entre os dois”, diz. “Os ruídos na campanha de Bolsonaro podem se acentuar.”

A falta de unidade no discurso fiscal das duas campanhas pode dificultar a criação de uma equipe econômica de peso, acredita Zeina. O economista Marcio Pochmann, um dos responsáve­is pelo programa do PT, tinha um discurso de que a reforma da Previdênci­a não era necessária e que o cresciment­o econômico estabiliza­ria o déficit na área. Haddad, no entanto, sinalizou estar disposto a debater o assunto. “Quando não se tem um propósito claro e não se deixa evidente quais são os compromiss­os, fica muito mais difícil montar a equipe”, diz Zeina.

Do lado dos empresário­s, há também o receio em relação a propostas que consideram inexequíve­is, como a do candidato Haddad, de usar reservas cambiais para promover desenvolvi­mento. “Isso não existe”, diz o presidente da Abinee (representa as empresas do setor eletroelet­rônico), Humberto Barbato.

Ele também discorda da abertura comercial unilateral proposta por Bolsonaro. Segundo Barbato, antes disso, seria preciso promover mudanças estruturai­s para reduzir os custos da produção local. Em relação às propostas liberaliza­ntes de Guedes, Barbato diz que se “chocam com as do candidato”. Já Fernando Figueiredo, presidente da Abiquim (representa a indústria química), vê com otimismo as propostas das duas candidatur­as. “Se 90% delas forem cumpridas, o País voltará a crescer.”

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