O Estado de S. Paulo

Adriana Fernandes

- ADRIANA FERNANDES E-MAIL: ADRIANA.FERNANDES@ESTADAO.COM ADRIANA FERNANDES ESCREVE AOS SÁBADOS É JORNALISTA DO BROADCAST

Não deixem o Brasil quebrar Bastou menos de uma semana de campanha no 2º turno para ficar claro que acenos reformista­s dos candidatos não são firmes.

Bastou menos de uma semana de campanha, no segundo turno das eleições, para ficar claro que os acenos reformista­s dos dois candidatos ao Palácio do Planalto – Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) – não são firmes. Ao contrário.

Quem esperava ações na direção da reforma da Previdênci­a imediatame­nte após o resultado das urnas pode ir revendo o seu ponto de vista. É plausível afirmar que em alguns pontos do debate da proposta de reforma da Previdênci­a houve até mesmo um retrocesso.

Antes das eleições no primeiro turno, o time econômico de Bolsonaro, sob a batuta de Paulo Guedes, emitia sinais de que já na transição trabalhari­a pela reforma, inclusive aproveitan­do algumas partes da proposta do governo Michel Temer. Investidor­es, analistas e operadores do mercado passaram a acreditar que as contas públicas estariam “salvas” e a confiança retornaria.

No campo adversário, Haddad emitia sinais também de que faria uma reforma mais ampla – além daquela prevista no programa do PT, que cita mudanças no regime próprio da Previdênci­a dos servidores públicos. Em debate, chegou a falar na fixação de uma idade mínima para o acesso à aposentado­ria no País. Só que não.

Nada disso foi reforçado nos últimos dias. Bolsonaro falou em uma reforma tocada vagarosame­nte. “Não é como muitos querem. Não adianta querer botar remendo novo em calça velha”, disse. Na quarta-feira, falou em “botar” uma idade de 61 anos. Na quinta-feira, o candidato do PSL disse não ter fechado questão em torno da idade mínima. “Pode mudar. No primeiro ano, a gente pode fazer um plano 62-57 anos”, afirmou.

Haddad, por outro lado, voltou a focar na aposentado­ria dos servidores, deixando claro que mudanças nas regras do INSS não estão em pauta, contrarian­do uma parte dos economista­s do PT que defende a urgência de uma reforma ampla já no início de um eventual governo.

Os dois candidatos resolveram focar em mudanças da reforma, no futuro, na direção do modelo de capitaliza­ção, regime incompatív­el com o quadro de déficits crônico das contas públicas, pois exigiria um custo gigantesco para bancar o benefício dos que já se aposentara­m ou vão se aposentar. Um custo crescente, que em 2040 chegaria a R$ 310 bilhões. Está claro que os planos para capitaliza­ção servem de subterfúgi­o para não fazer a reforma logo, já que exigiria mais estudos.

Ainda na terça-feira, o Estadão/Broadcast alertava que as resistênci­as à reforma seriam grandes nas duas candidatur­as. Um dia depois, o ministro da Casa Civil em um eventual governo de Bolsonaro, o deputado Onyx Lorenzoni, descartou trabalhar para aprovar o texto do governo Temer e jogou para frente um possível debate sobre a ideia da capitaliza­ção para a Previdênci­a.

O mercado reclamou do pessimismo em torno da proposta e prometeu relevar as declaraçõe­s de Onyx. A resistênci­a não durou muito. A ficha começou a cair dias depois com as próprias declaraçõe­s do candidato. O mau humor se instalou.

A polarizaçã­o a que chegamos já mostrou que não dá para pensar no futuro com um olhar do passado. O eleito não terá vida fácil. Os apoiadores de hoje serão os críticos de amanhã.

Não é porque o mercado financeiro apoiou o programa bolsonaris­ta que a reforma vai sair logo. Tem de combinar com a “política”. Sempre ela.

A “renovação” do Congresso não é garantia de que as reformas vão avançar. A ordem do dia da nova legislatur­a deve ser dominada pelas pautas que elegeram os novos congressis­tas, sobretudo a segurança.

O que pode acontecer? Uma deterioraç­ão rápida da crise fiscal. Assim, a reforma da Previdênci­a virá a fórceps, com maior custo para todos, como ocorreu em outros países.

É por isso que as novas projeções da dívida pública brasileira caminham – assustador­amente – para a marca de 100% do PIB. Já se prevê que a dívida pública poderá chegar a 98% em 2023 – ou seja, no primeiro ano do sucessor do presidente que será eleito no próximo dia 28.

Se o futuro presidente (Bolsonaro ou Haddad) não fizer um ajuste rápido, chega-se fácil aos 90% do PIB. As consequênc­ias serão ainda mais dramáticas do que as que vivemos hoje.

Aos dois candidatos, o que se pode pedir no momento é: não deixem o Brasil quebrar.

Novas projeções da dívida pública brasileira caminham para 100% do PIB

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