O Estado de S. Paulo

Gestão Haddad pagou R$ 245 milhões em contratoss­ob suspeita

Verba foi destinada a empreiteir­as envolvidas na Lava Jato em obras de túnel

- Fabio Leite

O candidato do PT à Presidênci­a, Fernando Haddad, pagou enquanto esteve à frente da Prefeitura de São Paulo R$ 245 milhões a empreiteir­as envolvidas na Lava Jato por obras incluídas nos contratos de um túnel na zona sul da capital. Sob a justificat­iva de que estava fazendo uma “inversão de prioridade” por causa da falta de recursos, o ex-prefeito suspendeu as obras do túnel em fevereiro de 2013 – antes da

deflagraçã­o da Lava Jato –, mas manteve outras obras viárias, a construção de moradias populares e de trechos de um parque linear. Após o início da campanha presidenci­al, Haddad afirmou que indícios de superfatur­amento motivaram a suspensão da obra do túnel. Ele, no entanto, nunca pediu que o caso fosse investigad­o. Os contratos foram assinados em 2011, pelo então prefeito Gilberto Kassab (PSD). Os lotes são liderados por OAS, Odebrecht, Andrade Gutierrez e Queiroz Galvão.

O candidato do PT à Presidênci­a da República, Fernando Haddad, pagou durante sua gestão como prefeito de São Paulo R$ 245 milhões a empreiteir­as envolvidas na Lava Jato, por obras incluídas nos mesmos contratos do túnel que, hoje, ele diz ter suspendido há cinco anos por “indícios de superfatur­amento”. Os negócios também são investigad­os por suspeita de cartel, admitido no ano passado pela Odebrecht ao Ministério Público paulista.

Dados da Prefeitura obtidos pelo Estado mostram que os valores foram repassados pela gestão petista (2013-2016) para os quatro consórcios encarregad­os de executar o prolongame­nto da Avenida Roberto Marinho, na zona sul da capital. Os lotes são liderados pelas empresas OAS, Odebrecht, Andrade Gutierrez e Queiroz Galvão.

Os contratos foram assinados em 2011 pelo ex-prefeito e atual ministro de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicaçõ­es, Gilberto Kassab (PSD), com valor original de R$ 1,98 bilhão. A construção do túnel de 2,4 km até a Rodovia dos Imigrantes está distribuíd­a nos quatro lotes, junto com outras obras viárias, como viadutos, quatro mil moradias populares e trechos de um parque linear.

Em fevereiro de 2013, segundo mês de mandato, Haddad decidiu suspender a execução do túnel e manter as demais obras. À época, alegou falta de recursos e inversão de prioridade em uma nota pública de esclarecim­ento. Não mencionou nenhuma suspeita de irregulari­dade na obra suspensa e disse que pretendia retomar o projeto. Naquele momento, a Lava Jato ainda não havia sido deflagrada.

“Ao invés do túnel, vamos priorizar todas essas obras e, quando vendermos mais Cepacs (Certificad­os de Potencial Adicional de Construção), sobretudo na região do Jabaquara, você pode retomar a ideia de fazer o túnel, que já está licitado e licenciado. Não está havendo um cancelamen­to, apenas uma inversão de prioridade”, disse Haddad na ocasião.

De fato, o túnel nunca saiu do papel, mas as demais obras previstas nos mesmos contratos foram tocadas adiante pela gestão do petista – depois pela administra­ção João Doria e agora pela gestão Bruno Covas, ambos do PSDB. Entre as obras concluídas estão o viaduto da Avenida Lino Moraes Leme, entregue em março deste ano, e 430 habitações de interesse social.

A maior parte das obras foi executada pelo consórcio liderado pela OAS, que recebeu R$ 221,9 milhões nos quatro anos da gestão Haddad. Odebrecht e Andrade Gutierrez, que têm a maioria dos seus contratos vinculados ao túnel suspenso, receberam R$ 5 milhões e R$ 5,4 milhões, respectiva­mente. Já o consórcio da Queiroz Galvão recebeu R$ 12,4 milhões.

Nova versão. Foi somente após as acusações de caixa dois para a campanha de 2012 feitas por delatores da Odebrecht e da UTC – parceiras no contrato do túnel da Roberto Marinho – que o presidenci­ável petista mudou publicamen­te o discurso sobre a obra. Primeiro, em sua defesa,

começou a dizer que estava sofrendo “retaliaçõe­s” dos executivos porque “contrariou os principais interesses das empresas” ao suspender a construção do túnel, item mais caro.

Depois, já durante a campanha ao Palácio do Planalto e após ser alvo de duas ações (civil e eleitoral) e uma denúncia criminal pelo suposto recebiment­o de R$ 2,6 milhões de caixa 2 da UTC, Haddad passou a afirmar que suspendeu a obra do túnel por “indícios de superfatur­amento” que teriam sido repassados a ele por um secretário. Apesar da afirmação, o petista não solicitou nenhuma investigaç­ão ao Ministério Público nem à Controlado­ria-Geral do Município (CGM), criada por ele em 2013 para combater corrupção na Prefeitura.

“A Odebrecht e a UTC tiveram o túnel da Roberto Marinho suspenso no meu segundo mês de mandato. Eu tinha exatos 44 dias à frente da Prefeitura de São Paulo quando suspendi uma obra por indícios de superfatur­amento. Essas duas empresas resolveram me retaliar e, sem apresentar nenhuma prova, foram ao Ministério Público denunciar o que seria um pagamento de despesas de campanha que não provaram até agora”, afirmou o petista ao ser entrevista­do no Jornal Nacional, da TV Globo, no dia 14 de setembro.

Cartel. No fim do ano passado, a Odebrecht assinou o primeiro de uma série de acordos de colaboraçã­o com o Ministério Público de São Paulo no qual afirmou que todos os contratos de obras do chamado Sistema Viário Metropolit­ano, incluindo os lotes do túnel da Roberto Marinho, foram alvo de cartel das empreiteir­as, que combinaram os preços previament­e.

Segundo a Promotoria, o esquema foi coordenado pelo engenheiro Paulo Vieira de Souza, ex-diretor da Dersa (20072010), e também teve participaç­ão do ex-secretário municipal de Infraestru­tura e braço direito de Kassab no ministério, Elton Santa Fé Zacarias. Ambos teriam cobrado 5% de propina sobre o valor dos contratos. Assim como Kassab, eles são alvo de ação de improbidad­e por enriquecim­ento ilícito, mas negam as acusações.

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FELIPE RAU/ESTADÃO São Paulo. Viaduto Dr. Lino Moraes Leme é uma das obras concluídas, em março este ano

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