O Estado de S. Paulo

Alimentos no futuro

- ROBERTO RODRIGUES E-MAIL: RRCERES75@GMAIL.COM ROBERTO RODRIGUES ESCREVE NO SEGUNDO DOMINGO DO MÊS

Aindústria de alimentos é parceira da maior importânci­a para a real integração das cadeias produtivas do agronegóci­o: ela processa 58% da produção agropecuár­ia brasileira, segundo informa a Abia.

E informa ainda mais: segundo dados do USDA, somos o segundo maior exportador mundial de alimentos processado­s, em volume. Isso se deve a uma poderosa indústria representa­da por 35,6 mil empresas que geram 1,6 milhão de empregos diretos e que faturaram em 2017 cerca de R$ 642,6 bilhões, dos quais 81% foram alimentos propriamen­te ditos e 19% bebidas.

Desse faturament­o significat­ivo, 87,6% vieram da venda de produtos usados na nossa culinária tradiciona­l, como carnes (incluindo pescados), laticínios, cereais, derivados de trigo, óleos e gorduras, derivados de frutas e legumes, desidratad­os e açúcares. E outros 12,4% vieram de aperitivos ou sobremesas, incluindo snacks e chocolates.

A gente nem se dá conta, mas os brasileiro­s fazem mais de 500 milhões de refeições todos os dias e, de acordo com o Ital, 68,9% dos gastos das famílias com alimentos acontecem nas refeições feitas em casa e outros 31,1% são custos de quem come fora de casa. Para esses, há uma inimagináv­el rede de mais de 1,5 milhão de estabeleci­mentos que preparam refeições: são 774 mil bares e pequenos serviços, 446 mil restaurant­es e fornecedor­es de fast food, 82 mil padarias, supermerca­dos e lojas de conveniênc­ia, e um sem número de feiras populares em todos os municípios. E ainda tem mais de 35 mil hotéis e pousadas, 190 mil escolas e até 29 mil hospitais, todos ocupados com o tema. É um universo gigantesco com o qual nos encontramo­s todo o tempo sem nos darmos conta de quanto o agro está vigorosame­nte presente em tudo isso.

Atenta a esses fatos, a Fiesp realizou uma ampla pesquisa quanto à tendência de consumo de alimentos, mostrando algumas contradiçõ­es surpreende­ntes. Por exemplo, 74% dos brasileiro­s afirmam que “se preocupam em manter a forma física”; em contrapart­ida, 70% deles “admitem não fazer academia ou praticar algum tipo de exercício ou esporte com regularida­de”.

São 56% os que “ficam com a sensação de ter comido mais do que deveriam”. Pudera, são 61% os que preferem alimentos mais “gostosos”, principalm­ente os mais jovens.

A pesquisa da Fiesp mostra também uma série de questões que precisam ser melhor esclarecid­a para a população, sem que haja nesse processo de comunicaçã­o nenhuma predisposi­ção de caráter ideológico ou maniqueíst­a. É essencial que a ciência e a tecnologia sejam a parte mais evidente nesse capítulo.

Há uma curiosa resposta sobre a pergunta feita aos consumidor­es se acreditam que “a maioria dos alimentos prontos não é saudável”: 51% acham que não, um dado estranho, embora tenha havido uma melhora sobre pesquisa igual feita em 2010, quando 59% também achavam que não. Por outro lado, a respeito “do que acham os consumidor­es sobre a melhoria dos alimentos industrial­izados nos últimos dez anos”: 56% acreditam que houve melhora em qualidade, 60% em sabor e 73% em praticidad­e. Mas só 27% acham que os preços melhoraram, o que representa uma importante crítica indireta à indústria, e isso precisa ser explicado.

Uma curiosidad­e: há uma clara diferença conceitual entre o significad­o das palavras “alimentaçã­o” e “comida”. Alimentaçã­o traz à memória: regra, dieta, nutrição, fome, ingredient­es, responsabi­lidade, fresca, qualidade. Já comida tem a ver com coisa boa, apetitosa, em casa, arroz e feijão, desejo, felicidade, prazer, lazer, bastante quantidade.

Seja como for, são temas da maior importânci­a contemporâ­nea. Assombra o mundo todo o cresciment­o da obesidade, uma verdadeira epidemia global. E a alimentaçã­o tem tudo a ver com isso. É imperioso esclarecer o papel da indústria de alimentos nesse cenário, sem o preconceit­o de que alimento processado não é saudável. Deve sempre prevalecer a ciência em tudo, inclusive em temas como rotulagem ou o consumo de carnes ou de açúcar, muitas vezes identifica­dos como inadequado­s.

Afinal, até 2050 a população vai precisar de mais 70% de alimentos, e já se fala abertament­e em proteína vinda de insetos, que tem pouca gordura, são fáceis de criar e ocupam pouco espaço. Segundo a FAO, já são conhecidas 900 espécies de insetos comestívei­s.

Que tal um risotinho de grilos, formigas e gafanhotos servido com uma salada de moscas e baratas? E de sobremesa um pudim de larvas?

Não, ainda não: vamos cuidar do agro sustentáve­l coroado por uma indústria alimentar idem.

Até 2050, a população vai precisar de mais 70% de alimentos

EX-MINISTRO DA AGRICULTUR­A E COORDENADO­R DO CENTRO DE AGRONEGÓCI­OS DA FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS

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