O Estado de S. Paulo

Voto petista resiste no interior do País

Sigla teve maior perda de votos nas grandes cidades em comparação com localidade­s com até 10 mil habitantes, principalm­ente do Nordeste

- Cecília do Lago Adriana Ferraz / COLABORARA­M ANA BEATRIZ ASSAM e CARLA BRIDI

Petismo resiste no interior

Partido venceu nas cidades com menos de 10 mil habitantes, a maioria no Nordeste, nas quais obteve 70% dos votos.

O PT, partido que nasceu nos grandes centros urbanos do País e cresceu junto à classe operária, hoje vê seu desempenho desidratar mais nas cidades médias e grandes. Nos municípios com mais de 100 mil eleitores, o partido perdeu em 2018 metade do eleitorado conquistad­o na média histórica de 2002 a 2014. Nas localidade­s com menos de 20 mil votantes, o recuo foi bem menor, cerca de 15%.

Quanto maior o porte do município, maior foi a perda de participaç­ão no total de votos válidos. Na faixa de cidades com 20 mil a 50 mil eleitores, o presidenci­ável petista Fernando Haddad teve recuo de 23%. Nas localidade­s com eleitorado de 50 mil a 100 mil, a queda foi de 41%. Acima disso, a perda média foi de 52%.

Na comparação com o desempenho médio de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, Haddad teve menor proporção de votos em 4.201 municípios, ou seja, três em cada quatro das cidades brasileira­s. Ele conseguiu superar ou igualar os antecessor­es em 1.369 municípios (25% do total).

Em 183 localidade­s, por outro lado, Haddad bateu o recorde histórico entre presidenci­áveis petistas – isso equivale a 3% dos municípios brasileiro­s. São cidades pequenas, cujo eleitorado não ultrapassa 10 mil – 153 delas estão localizada­s no Nordeste (veja quadro). Neste nicho, o petista obteve 70% dos votos, patamar não alcançado nem nas eleições de Lula e Dilma.

A migração do voto petista de cidades menores e mais pobres, na avaliação do cientista político Carlos Melo, do Insper, é reflexo da recessão econômica na vida dos brasileiro­s, especialme­nte os de origem mais humilde. “O eleitor sempre vota de acordo com a sua realidade. Vota no candidato que acredita ser capaz de lhe trazer vantagens, sejam elas econômicas ou não. Ele é racional em relação a seus interesses e valores”, disse.

Desde 2006 existe uma relação inversa entre o Índice de Desenvolvi­mento Humano (IDH) dos municípios e o voto de seus eleitores em candidatos petistas. O PT tem melhor desempenho nas localidade­s mais pobres. Isso ocorre no Brasil inteiro, mas a intensidad­e do fenômeno é marcada pela geografia. No Nordeste, região em que Haddad teve melhor desempenho, Jair Bolsonaro (PSL) teve melhor votação nas capitais, onde o IDH é maior, que no interior.

Já o apoio do Sudeste hoje deixa de ser realidade, na avaliação do professor da USP Lincoln Secco. “O PT, no passado, conseguiu os votos da direita que apoia governos populistas. É o espectro que consegue disputar com a esquerda nas camadas populares. Hoje, essa figura está concentrad­a no Bolsonaro.”

O professor Aldo Fornazieri, da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, atribui a tendência aos trabalhado­res do setor de serviços, predominan­tes em grandes cidades e mais afetados pela crise. “Essas famílias procuram uma perspectiv­a de mudança.” São Paulo. Mesmo dentro dos Estados, a relação inversa entre IDH e votos petistas se mantém. Na capital paulista, Haddad teve um desempenho melhor em algumas das zonas eleitorais com menor IDH – caso de Parelheiro­s, no extremo sul, que tem o segundo menor índice de desenvolvi­mento humano da cidade. Lá, quem depende dos serviços públicos tende a apoiar candidatos petistas.

A ambulante Maria Marques da Silva, de 50 anos, que vende cachorro-quente em frente ao inacabado Hospital Municipal de Parelheiro­s – obra iniciada na gestão Haddad – foi eleitora de Luiz Inácio Lula da Silva, condenado e preso na Lava Jato, e afirmou que votaria de novo no petista. “O PT ajuda mais quem é da periferia. Eu sempre votei no Lula e votaria de novo se pudesse.”

“O eleitor sempre vota de acordo com a sua própria realidade. Vota no candidato que acredita ser capaz de lhe trazer vantagens, sejam elas econômicas ou não. Ele é racional em relação a seus interesses e valores”. Carlos Melo

CIENTISTA POLÍTICO

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FABIO BOUZAS/ESTADAO Teodoro Sampaio. Município baiano tem maioria dos eleitores petista
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