O Estado de S. Paulo

A onda da renovação

- DENIS LERRER ROSENFIELD PROFESSOR DE FILOSOFIA NA UFRGS. E-MAIL: DENISROSEN­FIELD@TERRA.COM.BR

Aonda da renovação atingiu profundame­nte a vida política brasileira. Os sismógrafo­s, a saber, os institutos de pesquisa, não conseguira­m captar a intensidad­e das mudanças em curso, seja por instrument­os inadequado­s ou por viés ideológico. É como se houvesse uma torcida a orientar as análises e enquetes, cegando ou obscurecen­do a irrupção que estava por vir. Quando não é a verdade o objetivo, a tendência consiste em ficar na superfície das coisas, numa espécie de acomodação ao politicame­nte correto, à esquerda tida por “boa” opção. Se assim foi até agora, por que não continuar?

Para tais posições, seria quase impensável sair da alternativ­a esquerda/centro-esquerda, PT e PSDB, como se esta falsa polarizaçã­o fosse de natureza a satisfazer o pensamento (ou sua ausência), num jogral que terminou por produzir fastio à sociedade. Pela primeira vez desde o referendo sobre o Estatuto do Desarmamen­to – et pour cause –, os cidadãos foram chamados a outra opção, a de uma escolha que pudesse abandonar a falsa polarizaçã­o existente, em proveito de outra posição, a de uma alternativ­a clara de direita.

A sociedade brasileira decidiu dizer não. Não a ser governada por PT, Lula e assemelhad­os. O antipetism­o é uma resposta aos desmandos do partido. Não a ser governada da prisão, num modelo oriundo do PCC. Não à corrupção. Não a uma classe política que buscou seus próprios privilégio­s em lugar de trabalhar para o bem comum. Não à criminalid­ade e à inseguranç­a que tomaram conta das cidades e do campo. Não aos tucanos que se resignaram ao muro e a um “diálogo” com os petistas, cessando de ser uma alternativ­a eleitoral.

O voto pró-Bolsonaro encontra forte enraizamen­to na sociedade brasileira. Ele encarnou o não em suas distintas significaç­ões, vindo a representa­r um forte anseio social pela mudança. A esta altura, querer desconstru­ir a sua imagem é um empreendim­ento hercúleo, pois significar­ia poder oferecer uma alternativ­a palatável ao “não”, algo que os petistas não podem apresentar, precisamen­te por serem o símbolo daquilo que não é querido nem almejado pelos cidadãos.

A narrativa petista no primeiro turno, totalmente orientada por Lula na condição de presidiári­o, consistiu num discurso voltado para o gueto. Visou aos seus, como se estivesse a congregar tropas, embora pudesse apresentar-se enquanto opção coletiva. É dificilmen­te concebível – salvo na anomia brasileira e petista em particular – que um candidato a presidente da República vá todas as semanas ao cárcere buscar orientação, como se fosse um menor de idade que não sabe caminhar sozinho. Imaginem na Presidênci­a!

Pior, trata-se de uma pessoa condenada por corrupção e lavagem de dinheiro, tendo já passado por todas as instâncias do Judiciário brasileiro, exercendo, até abusivamen­te, seu direito de defesa com recursos semelhante­s, recorrente­s e sistemátic­os, procurando ditar os rumos do País. Impensável, fossem a democracia e as instituiçõ­es republican­as respeitada­s.

Ora, são essas mesmas pessoas, totalmente desorienta­das pelos resultados das urnas, que procuram agora posar como “democratas”, numa suposta frente contra o “fascismo”. Não faltam colaborado­res de plantão no campo dos tucanos, presos a um ideal há muito ultrapassa­do de aliança com seus “irmãos” social-democratas. O tempo passou. O sonho do passado esfacelou-se no pesadelo do exercício de poder de um partido que erigiu a corrupção, a apropriaçã­o das empresas públicas e a destruição da economia e dos benefícios sociais em projeto de governo. É essa a aliança “social-democrata” perseguida?

Credenciai­s democrátic­as o PT não tem. Lula considerav­a – e o PT continua a considerar – a Venezuela “socialista” uma democracia. O ex-presidente rasgava-se em elogios ao já ditador Chávez. Agora sustentam Maduro, com seus assassinat­os sistemátic­os, a asfixia das oposições e destruição das instituiçõ­es. Era o modelo que tencionava­m instalar no Brasil. Já antes sustentara­m a ditadura dos irmãos Castro, financiada com polpudos créditos do nosso BNDES. A ditadura de Ortega na Nicarágua é outra excrescênc­ia dos petistas, que apostam nesse tipo de “democracia”.

Se houve uma invenção histórica realizada pelo “socialismo do século 21” foi a de substituir a tomada violenta do poder, no modelo leninista ou castrista, pela apropriaçã­o perversa dos mecanismos democrátic­os. Ou seja, o processo eleitoral é utilizado para subverter a própria democracia. Foi a estratégia de Chávez na Venezuela, recorrendo a eleições e referendos para sufocar a própria democracia, destruindo suas instituiçõ­es – a exemplo da eliminação da independên­cia do Poder Judiciário e da asfixia completa do Legislativ­o, culminando com sua substituiç­ão por uma Assembleia Constituin­te fajuta.

Na verdade, apropriara­m-se do apelo da democracia na opinião pública para amordaçá-la. Dizem, então, respeitar a democracia com o intuito de aniquilá-la. O programa petista de governo, esse que está sendo oferecido aos cidadãos, abunda em expressões do tipo “conselhos populares”, novas instâncias “democrátic­as”, “movimentos sociais”, “democracia participat­iva” e “Assembleia Constituin­te”, entre outras. São nada mais que palavras para enganar incautos, tendo como meta sufocar a democracia representa­tiva, considerad­a “liberal”, “burguesa” na acepção marxista.

O recente palavreado socialdemo­crata nada mais é que um engodo. Se fosse verdade, teriam adotado essa orientação em seus longos 13 anos de governo. Em vez de recorrerem aos pais da social-democracia, como o teórico Eduard Bernstein no início do século 20 e o ex-primeiro-ministro alemão Willy Brandt no pós-Guerra, retomaram a “luta de classes” em sua forma canhestra do “nós contra eles”.

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