Problemas dos pais afetam as crianças, dizem pediatras
Segundo pesquisa, médicos percebem isso nas consultas, mas têm dificuldade de tratar temas
Em pesquisa feita pela editora americana Sage Publishing com 200 pediatras, mais de 150 dos profissionais ouvidos revelaram que os pais, no momento da consulta, apresentam pelo menos um problema de saúde que afeta diretamente o bem-estar das crianças. Publicados no Clinical Pediatrics e no Journal of Pediatrics, nos Estados Unidos, os dados destacam que questões como depressão materna ou uso de tabaco pelos pais, porém, não são tratadas nas consultas, porque muitos médicos não se sentiam à vontade para abordar os temas com as famílias. Tais problemas podem, assim, influenciar o comportamento dos filhos.
Os médicos encontram dificuldades para abordar os problemas dos pais por diversas razões, como falta de tempo na consulta e dificuldade no encaminhamento dos pais às especialidades necessárias. “O serviço público, por exemplo, tem prazo (tempo de consulta) para atender e tanta coisa para falar que, por vezes, fica difícil de tratar com os pais. Quando você atende um recém-nascido na primeira consulta, a depressão pós-parto é um quadro bem presente e importante, mais do que se imagina, e pode determinar o sucesso da amamentação. Se a gente não tem espaço para abordar, resolve de forma superficial”, afirma o pediatra e homeopata Moises Checinski, autor do blog #EuApoioLeite Materno. A pesquisa abordou seis questões de saúde que envolvem os pais: depressão materna e uso de tabaco lideram o ranking dos problemas, seguidos por violência sofrida pelo parceiro, status de imunização para dTpa (tétano, difteria e coqueluche – tríplice acelular), status de seguro de saúde e planejamento familiar. “Acredito que, se o mesmo trabalho fosse realizado no Brasil, os dados obtidos seriam diferentes, até mesmo por questões culturais. O pediatra é, classicamente, um dos especialistas de maior empatia com seus pacientes e familiares, e dinâmica familiar, hábitos e saúde dos pais são itens obrigatórios em nossas consultas”, comenta Ricardo Luiz Affonso Fonseca, coordenador médico do prontosocorro pediátrico do Hospital Sírio-Libanês.
Mas Fonseca reconhece algumas dificuldades encontradas pelos profissionais no momento da consulta. “Claro que, em uma consulta de rotina, esses aspectos (problemas
dos pais) devem ser abordados, mas, muitas vezes,pela falta de tempo ou de enfoque, por exemplo no pronto-socorro, essas questões são deixadas em segundo plano.”
Hábitos. Para Moises Checinski, a questão da alimentação é um dos aspectos agravantes para a saúde dos filhos. Neste caso, segundo ele, toda a família teria de passar por uma reeducação alimentar. “Se falamos de obesidade, por exemplo, não conseguimos interferir na alimentação da casa, da escola, não adianta. Ou a família se envolve, ou a crianças sofre as consequências”, explica Checinski. “Nós deveríamos ter um tempo adequado na consulta, independentemente de onde estamos. No meu consultório, reservo uma hora. Mas alguém que atenda em ambulatório ou pelo plano de saúde até pode dedicar tempo, mas acaba interferindo no dia desse profissional de Saúde.” / GABRIEL NAVAJAS, ESPECIAL PARA O ESTADO