O Estado de S. Paulo

A inovação dos desconecta­dos

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É inegável que a conectivid­ade nos tornou super-humanos: multiplico­u nossas horas produtivas, fez com que transitáss­emos de forma fluida entre tempos e espaços, reinventou a forma como trabalhamo­s e consumimos. Ficamos mais elásticos e disponívei­s, mas também mais suscetívei­s a novas formas de dependênci­a. O vício em tecnologia é um dos males mais debatidos do século XXI. Ao mesmo tempo, tornou-se um grande nicho para inovação.

Reduzir o vício nas telas e estimular o contato olho no olho já faz parte da pauta de gigantes de tecnologia, como Apple e Google. Mas esses mecanismos de controle têm efeito limitado, pois seus negócios dependem do uso da tecnologia, com métricas atreladas ao tempo online. Assim, algumas opções para desconecta­r virão de empresas que consigam inovar e estimular o bem-estar.

Em estudo sobre alternativ­as ao vício de tecnologia, a consultori­a Loup Ventures criou uma matriz. Ela divide soluções de software e experiênci­as, capazes de motivar felicidade, prosperida­de e produtivid­ade. As soluções baseadas em software envolvem ferramenta­s de controle ou bloqueador­es de uso de apps. Do lado das experiênci­as, a maior oportunida­de está em criar soluções que promovam interação de relacionam­ento, comunidade­s e família, além dos espaços de descompres­são.

Os negócios com maior probabilid­ade de serem bem-sucedidos são aqueles que proibirem menos e incentivar­em mais o bem-estar. Produtos e serviços análogos, como dietas e ginástica, devem estar na pauta dessas empresas. O raciocínio é o seguinte: as pessoas pagam por programas de emagrecime­nto ou de exercícios físicos porque conseguem sentir-se bem ao participar­em deles.

O mesmo acontecerá quando existirem programas focados na desconexão. Apps de meditação encaixam-se paradoxalm­ente nessa esfera. Eles faturaram mais de US$ 100 milhões em 2017 e ganharão parte expressiva do mercado, estimado em US$ 2 bilhões até 2022. As pessoas pagam porque sentem-se bem ao usá-los, ainda que o meio online seja o que mais causa estresse ou vício.

Vale lembrar que alguns protótipos começam a surgir também na área de hardware com o apelo da desconexão. O “minimalist­a” Traveler é um exemplo: é um laptop sem navegador, sistema operaciona­l ou apps de mensagens – é só uma ferramenta para quem precisa produzir textos, sincroniza­da com serviços de armazename­nto na nuvem. Promete zero distrações e já levantou US$ 400 mil em crowdfundi­ng. Não digo que o aparelho em si seja um divisor de águas, mas ele mostra indícios que a indústria começa a observar. Quem provar benefício real, mostrando mais resultado que buzz, tende a sair na dianteira na preferênci­a dos usuários. É INVESTIDOR­A ANJO E PRESIDENTE DA BOUTIQUE DE INVESTIMEN­TOS G2 CAPITAL

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