O Estado de S. Paulo

Haddad volta atrás em plano de ‘mandato duplo’ no BC

Em novo programa de governo, candidato desiste da proposta de que banco tenha compromiss­o tanto com a inflação quanto com o emprego

- Daniel Weterman

O candidato do PT à Presidênci­a, Fernando Haddad, recuou de sua proposta de que o Banco Central passe a ter compromiss­o tanto com a inflação quanto com a geração de empregos – o que o mercado financeiro chama de “mandato duplo”. Além disso, incluiu na nova versão de seu programa de governo a promessa de “manter a autonomia” da autoridade monetária.

A nova redação do documento foi protocolad­a quinta-feira no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), após as negociaçõe­s do candidato no segundo turno da disputa, com a tentativa de atrair apoios mais ligados ao centro do espectro ideológico.

O novo texto fala que o BC “manterá sua autonomia e seu mandato de controlar a inflação, permanecen­do atento a temas como a estabilida­de do sistema financeiro e o nível de emprego”.

Conforme o economista Guilherme Mello, um dos assessores da campanha de Haddad, a mudança foi feita para reforçar o compromiss­o de manter a condução do Banco Central como está atualmente. Ele disse que a proposta não significa “independên­cia” da autoridade monetária – como é a proposta do rival de Haddad na disputa, Jair Bolsonaro (PSL) –, já que isso daria a entender que a instituiçã­o não responderi­a mais ao governo.

“Nossa proposta é manter a autonomia, que o Banco Central tenha total liberdade para tomar as decisões de política monetária (taxa de juros)”, disse Mello. “O importante é que a autoridade monetária tenha liberdade para tomar as decisões como foi durante o governo Lula, e mantenha a autonomia da forma que nós temos avançado atualmente. Hoje, o presidente do Banco Central tem autonomia para tomar as decisões”, disse o economista.

Mesmo com o compromiss­o de manter o atual modelo de condução do Banco Central, Haddad afirmou que não terá nenhum nome do alto escalão da equipe econômica de Michel Temer em um eventual governo, sinalizand­o que não faria convite para que o atual presidente do banco, Ilan Goldfajn, permaneces­se no cargo.

Interpreta­ção. A proposta de mandato duplo foi retirada para evitar interpreta­ções erradas, argumentou Guilherme Mello. Ele ponderou que a preocupaçã­o com o cresciment­o econômico e a geração de emprego deve estar no radar da instituiçã­o, mas não estabelece­ndo o compromiss­o de uma meta, como ocorre com a inflação.

A possibilid­ade do BC adotar o mandato duplo já foi discutida dentro do governo Michel Temer, e provocou polêmica quando veio à tona, no início do ano. Ex-presidente­s do banco consultado­s à época pelo Estadão/Broadcast foram unânimes em condenar a mudança.

“Cumprindo bem sua função, de controle da inflação, o BC acaba permitindo que se tenha um cresciment­o sustentáve­l”, disse, à época, o ex-presidente do BC e sócio da Tendências Consultori­a Integrada Gustavo Loyola. “Impor ao BC uma obrigatori­edade de ter um ‘olho no peixe e outro no gato’ pode enfraquece­r o controle da inflação, que é a tarefa precípua dos bancos centrais. O cresciment­o da economia depende de vários outros fatores, e não só do BC.”

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