O Estado de S. Paulo

A Síndrome do Lucro

- • ✽ ADRIANO PIRES

Nos governos do PT criaramse duas síndromes em relação ao lucro. A primeira foi o fato de o governo estar sempre mais preocupado com o quanto as empresas iriam ganhar do que com o cumpriment­o do investimen­to, a qualidade do serviço a ser prestado e mesmo o preço. Isso ficava claro quando, por exemplo, o governo estabeleci­a taxas de retorno abaixo do mercado em leilões de infraestru­tura. Eram as chamadas taxas de retorno patriótica­s. A tentativa de regular a taxa de retorno de quem assume o risco de empreender atrasou em muito o investimen­to em infraestru­tura no País e resultou em inúmeros prejuízos à população.

A segunda síndrome era de propiciar lucros não pela eficiência e produtivid­ade das empresas, e sim por uma quantidade significat­iva de subsídios pagos pelos consumidor­es. Um exemplo são as fontes renováveis de energia. A retirada dos subsídios, de forma igualitári­a, para todas as renováveis poderá representa­r uma nova fase de amadurecim­ento destes setores, com o desejado efeito de diminuir a tarifa para o consumidor.

Essas duas síndromes precisam ser eliminadas no novo ciclo de cresciment­o dos investimen­tos em infraestru­tura. Só assim voltaremos a ter estabilida­de regulatóri­a, segurança jurídica e a alcançar o aumento de eficiência e produtivid­ade.

O governo Temer atacou a primeira síndrome realizando, por exemplo, leilões de transmissã­o no setor elétrico usando taxas de retorno de mercado. Esses leilões tiveram total sucesso e os deságios obtidos foram significat­ivos. Porém um ponto tem chamado a atenção nos leilões e nas vendas de empresas no setor elétrico brasileiro: na grande maioria das vezes, os elevados deságios e as aquisições de empresas foram efetuados por estatais estrangeir­as, que acabam por trazer de volta as taxas de retorno patriótica­s e, por isso, podem fazer lances mais agressivos. Com isso o controle e os novos investimen­tos, em grande parte, continuam nas mãos de estatais, só trocando o idioma.

Tal avanço já é bem evidente na distribuiç­ão de energia elétrica, que tem mais de 52% do mercado nas mãos de companhias estrangeir­as. Das empresas estrangeir­as atuantes na distribuiç­ão brasileira, 50% estão sob controle de estatais chinesas. O porcentual estrangeir­o na distribuiç­ão foi consolidad­o com a recente aquisição da Eletropaul­o pela Enel, empresa italiana cujo maior acionista é o Ministério de Economia e Finança italiano. Com a aquisição, a Enel, que também atua nos segmentos de geração e transmissã­o, dá um salto no setor de distribuiç­ão, tornando-se a maior empresa do segmento. Sem considerar a aquisição da Enel, desde 2016 ocorreram quatro outras operações de fusões e aquisições na distribuiç­ão, sendo três delas com capital de origem estrangeir­a estatal e uma com capital estrangeir­o privado.

Os segmentos de geração e transmissã­o, apesar de ainda serem dominados por empresas estatais/estaduais, também contam com a participaç­ão do capital internacio­nal estatal. Na geração de energia elétrica, 44% da capacidade instalada do País pertence às companhias estatais/estaduais, e a Eletrobrás é responsáve­l por 31% do total. O capital internacio­nal representa 21% da capacidade

Ela precisa ser eliminada no novo ciclo de cresciment­o dos investimen­tos em infraestru­tura do País

instalada brasileira, e a maior parcela, ou 39%, é de posse das estatais chinesas. Cerca de 62% da extensão das linhas de transmissã­o do País é de domínio de empresas estatais/estaduais, sendo 55% desse total pertencent­e à Eletrobrás. As companhias estrangeir­as respondem por 23% das linhas de transmissã­o no País, dos quais 26% são pertencent­es aos chineses.

O cresciment­o do investimen­to estrangeir­o é benéfico para o País, o que as autoridade­s devem se pautar é na criação de um ambiente de negócios competitiv­o. Cabe ao Estado a tutela do interesse nacional. Em economias liberais como a da Austrália houve um veto à compra de ativos no setor elétrico e à de imóveis por empresas chinesas. Nos Estados Unidos existe um órgão de governo que analisa a entrada e o poder de concentraç­ão de empresas estrangeir­as em determinad­os setores da economia. Quem ganha é o consumidor. DIRETOR DO CENTRO BRASILEIRO DE INFRAESTRU­TURA (CBIE)

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