O Estado de S. Paulo

O colapso de uma gigante americana

Referência em compras, Sears pede recuperaçã­o © 2018 THE ECONOMIST NEWSPAPER LIMITED. DIREITOS RESERVADOS. PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM

- CLAUDIA BOZZO TRADUÇÃO

Era uma vez, o som do catálogo da Sears sendo jogado na soleira das portas dos lares americanos trazendo a possibilid­ade de uma abundância de compras. O “Livro de Desejos” de Natal anunciava em suas páginas milhares de dólares em presentes desejados. Em um certo momento, a Sears foi a maior varejista do mundo. Mas em 15 de outubro, sua controlado­ra, a Sears Holding Corporatio­n (SHLD), entrou com pedido de recuperaçã­o judicial recorrendo ao Capítulo 11, triste capítulo da história de um renomado nome do varejo americano.

Ela foi a Amazon de seus tempos. Do fim do século 19, a Sears, Roebuck and Company vendeu de tudo por meio dos seus catálogos, desde casas prontas para construção e esteiras para cães até cintos masculinos e ópio. Ela transformo­u o ato de comprar, enviando seus produtos para todas as partes dos Estados Unidos. Americanos negros que viviam no sul podiam fazer compras sem serem maltratado­s em lojas locais, seja por preço ou por serviço, diz Louis Hyman, historiado­r da Universida­de de Cornell.

Seu colapso nos últimos anos tem sido surpreende­ntemente rápido, mesmo quando muitos grandes varejistas também lutam para sobreviver às inovações da Amazon. O valor de mercado de ações da empresa caiu, de US$ 30 bilhões em 2007 para US$ 69 milhões em 17 de outubro; tem quase US$ 5 bilhões em dívidas. As receitas foram de US$ 16,7 bilhões no ano passado, abaixo dos US$ 50,7 bilhões em 2007, e a companhia não dá lucro desde 2010. Das 3.418 lojas americanas que possuía em 2007, apenas 866 restaram, até agosto deste ano.

Grande parte da culpa foi atribuída a Eddie Lampert, um gerente de fundos de hedge que supervisio­nou a imprudente fusão da empresa com a Kmart, outra loja de departamen­tos em dificuldad­es, em 2005. A ESL Investment­s, seu fundo, é a principal acionista da SHLD. Lampert, que se tornou o principal executivo em 2013 (e se afastou no dia 15 de outubro), não

Em breve tudo o que restará da Sears serão cópias de seus antigos catálogos, à venda na Amazon por US$ 1,88

tinha experiênci­a no varejo. Ele foi o flagelo de marcas valiosas como Craftsman, uma linha de ferramenta­s. Lampert se recusou a investir em lojas físicas, gastou com o site da Sears, que ainda assim é considerad­o ultrapassa­do. Dividiu a empresa em várias setores, esperando que a competição entre eles aumentasse os lucros. Em vez disso, os funcionári­os se revoltaram, até mesmo promovendo marcas de outras empresas, em vez das marcas da própria Sears, para evitar o pagamento de royalties às unidades rivais.

Lampert tem seus defensores. Ele assumiu uma empresa à beira da morte, argumenta James Schrager, da Faculdade de Administra­ção Booth da Universida­de de Chicago. Antes inovadora, a Sears havia estagnado há décadas. Suas lojas ficaram em mau estado e a diversific­ação foi longe demais, para áreas como seguros e imóveis. Em 1993, um ano antes de Jeff Bezos começar a vender livros online, a Sears havia abandonado seu negócio de vendas pelo correio, que antes lhe dera uma vantagem competitiv­a.

Outras grandes varejistas, como Target, Walmart e J.C. Penney, vão se beneficiar do colapso da Sears, pois também se esforçam para enfrentar a Amazon. Mas as perspectiv­as de longo prazo para as lojas de departamen­to são reduzidas. Entre 2000 e 2017, sua participaç­ão nos gastos dos consumidor­es americanos caiu 4,4 pontos porcentuai­s, mais do que qualquer outro tipo de varejista. A Sears não estava sozinha ao ocupar o desconfort­ável terreno entre as empresas de descontos, cujos preços não tinham como ser alcançados, e os varejistas sofisticad­os.

O Kmart na W Addison Street em Chicago, cidade natal da Sears (onde a última Sears foi fechada em julho), tem a aparência de uma grande loja de descontos, com ofertas anunciadas em cartazes de papelão amarelo-neon e promessas de reembolso, mas não os preços baixos. Enquanto isso, os varejistas que não têm lojas são cada vez mais populares entre os consumidor­es.

Lampert insiste que a Sears se tornará mais enxuta e lucrativa novamente. Poucos acreditam nele. Em breve tudo o que restará da Sears serão cópias de seus antigos catálogos, à venda na Amazon por US$ 1,88.

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