O Estado de S. Paulo

FAMÍLIAS SE ALOJAM SOB VIGA DO MONOTRILHO

Área, no Brooklin Paulista, fica ao lado do que foi a Favela Buraco Quente, desapropri­ada há 5 anos

- Priscila Mengue COLABOROU BRUNO RIBEIRO /

“Fé em Deus”, diz a inscrição na entrada de um terreno a poucos metros da futura estação Jardim Aeroporto, no Brooklin Paulista. Ali, sete famílias vivem em barracos debaixo das vigas do que será a Linha 17-Ouro do Metrô. “Perdemos tudo em um incêndio no (Morro do) Piolho. A gente construiu aqui com o que achou em caçamba”, diz a dona de casa Rosângela Filgueiras, a Zana, de 49 anos.

O local é uma área estreita entre dois muros: o que o separa da calçada da Rua Palmares, próximo do cruzamento das Avenidas Washington Luís e Jornalista Roberto Marinho; e o do conjunto habitacion­al Estevão Baião, iniciado pela Prefeitura

em 2011 e com entrega prevista para o próximo ano.

No cadastro do Imposto Predial e Territoria­l Urbano (IPTU), o local é parte de um lote único de propriedad­e municipal. Imagens do sistema Google Street View mostram que estava vazio em 2015, apresentan­do apenas quatro placas do conjunto Estevão Baião. Hoje, essas mesmas sinalizaçõ­es são utilizadas pelos moradores para proteger a entrada dos barracos.

A área fica ao lado do que foi a Favela Buraco Quente, desapropri­ada pelo Estado há cinco anos para a construção do conjunto habitacion­al Campo Belo. Enquanto a obra não é iniciada, antigos moradores da favela, como Zana, recebem auxílio-moradia. “R$ 400 não dá para nada. Por isso que tem de morar em um lugar desses. Sem emprego, sem qualificaç­ão e vivendo de bico, não tem como pagar aluguel”, diz ela, que vive com o marido, José Luís dos Santos, de 55 anos.

A menos de um quilômetro de distância, próximo do Aeroporto de Congonhas, uma viga do monotrilho caiu há quatro anos, matando um operário. Uma estrutura desse tipo pode pesar até 95 toneladas. Zana não teme, contudo, um novo incidente e descreve o dia a dia por lá como “calmo”.

No local, também vive Angelina Nunes de Souza, de 27 anos. A dona de casa mora com a filha de 6 anos e 8 meses e com o marido, Edvaldo Pereira da Silva, de 38 anos, que hoje trabalha com coleta de material reciclável e faz bicos de carpinteir­o. Segundo ela, a família se mudou para debaixo do monotrilho há cerca de um ano, poucos meses após Silva ser demitido de um emprego na obra da própria Linha 17Ouro. “Não tinha mais como pagar aluguel.”

As obras da Linha 17-Ouro foram iniciadas em 2012, com previsão de entrega do trecho inicial, de oito estações, para a Copa do Mundo de 2014. Hoje, a nova estimativa é para o segundo semestre de 2019.

Monotrilho. O governo do Estado estima que a obra custe R$ 4,8 bilhões e que, ao fim, ligue o Jabaquara ao Morumbi, passando por uma estação no Aeroporto de Congonhas, na zona sul. Por meio de nota, a Companhia do Metropolit­ano de São Paulo disse que a área foi utilizada “apenas temporaria­mente para a implantaçã­o de um pilar e das vigas que o acompanham”.

“Todos os canteiros de propriedad­e do Metrô utilizados para a construção da Linha 17-Ouro são isolados por tapumes e contam com seguranças uniformiza­dos que realizam rondas constantes por toda a extensão da obra”, ressaltou a companhia.

De acordo com o governo do Estado, o conjunto habitacion­al Campo Belo está em fase de aprovação de projetos na Prefeitura e não tem prazo estabeleci­do para início da obra. O governo informou, ainda, que o auxílio-moradia “serve para incrementa­r a renda das famílias”.

Já a Prefeitura alega não ser responsáve­l pela área ocupada. “As famílias citadas pela reportagem estão em área de instalação dos pilares do monotrilho, faixa das obras da Linha 17 do Metrô.”

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JF DIORIO / ESTADÃO-15/9/2018 Ocupação. Prefeitura alega não ser responsáve­l pela área; residencia­l continua sem prazo

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