O Estado de S. Paulo

Na SPFW, desfiles investem em ativismo grifado

Em busca de relevância e engajament­o, marcas levantam bandeiras e sofisticam discurso em torno das coleções

- Maria Rita Alonso Sergio Amaral

Em tempos de palavras de ordem, hashtags políticas e manifestaç­ões nas ruas e nas redes, marcas de moda buscam causas e bandeiras para chamar de suas. Na segunda-feira, 22, abrindo os desfiles da São Paulo Fashion Week, em seu novo QG na Vila Leopoldina, a Osklen trouxe a questão da sustentabi­lidade e da preservaçã­o dos oceanos para a passarela. “Criamos uniformes para o ativismo de uma forma romântica, às vezes sexy, às vezes streetwear. O conceito se des dobra em toda a coleção”, afirma o diretor criativo Oskar Metsavaht. “São peças para pessoas urbanas que se manifestam em prol dos oceanos. Roupas com um misto do mergulhado­r, do surfista, do pescador, entre outras referência­s ao universo náutico. Fizemos até uma homenagem a Jacques Cousteau.”

Na prática, as roupas primaram por leveza, amplitude e conforto, em peças de construção aparenteme­nte simples. Materiais nobres de origem natural, como a seda e o linho, foram a base de tudo, ao lado do algodão reciclado, do tricô manual de corda, das fibras sustentáve­is feitas com pet reciclado e dos acessórios em palha, ráfia e couro de pirarucu. Em parceria amarrada com jovens artistas da periferia de Santa Luzia de Itanhy, no Sergipe, surgiram estampas inspiradas nos mangues, berçário da vida marinha.

Faltando menos de uma semana para as eleições presidenci­ais, Metsavaht define a coleção como “política lato sensu”. “Não estamos falando da eleição em si, mas esse desfile representa uma cobrança à sociedade e ao Estado em relação à preservaçã­o das áreas marítimas”, diz ele, que é embaixador da Unesco e integrou, em 2017, a delegação do Ministério do Meio Ambiente para a Conferênci­a da ONU sobre os oceanos.

Na sequência, a estilista carioca Patricia Viera fez seu desfile levantando a bandeira do trabalho artesanal. Tendo o couro como principal matéria-prima de sua marca, colocou um grupo de artesãs realizando bordados em plena passarela. Em sua coleção de inverno, ela recorre à riqueza de cores e texturas encontrada­s no Peru. O clima é de extravagân­cia e drama, com vestidos metalizado­s justíssimo­s e curtinhos, assim como outros na altura dos joelhos com mosaicos florais construído­s com pequenos recortes de couro. Uma das jaquetas, segundo a estilista, levou mais de 13 dias para ficar pronta. Uma das maiores experts em couro no Brasil, ela destaca sua preocupaçã­o com a origem do material usado em suas roupas. “Couros exóticos não entram em nosso ateliê. Utilizamos apenas o de gado de corte, isto é, aqueles abatidos para virar alimento”, afirma a estilista.

Uma das jovens integrante­s do evento, a marca masculina Torinno trouxe o top Marlon Teixeira e a atriz Deborah Secco para sua apresentaç­ão. Inspirada em uniformes e com uma pitada de militarism­o, mostrou um guarda-roupa completo, que tem de moletons e conjuntos de plush para curtir o sofá de casa a peças de alfaiatari­a para ocasiões formais. É uma imagem mais conectada com a vida real e menos ligada a ideias mirabolant­es – a moda com estética conceitual, por sinal, está ameaçada de extinção no Brasil.

Em meio a um mar de desfiles comerciais neste segundo dia, foi um sopro de frescor a apresentaç­ão da Modem, outra integrante da nova guarda fashion nacional. Sob o comando do estilista André Boffano, fez uma das apresentaç­ões mais bacanas do dia, equilibran­do boas ideias de design, execução preciosa

e tino comercial. Pensando numa mulher madura, urbana e empoderada, desenhou uma coleção que foge dos lugares-comuns com jogos de assimetria­s, desconstru­ções e misturas de texturas inesperada­s (metalizado, jeans, couro e tricôs elaborados). “A cliente Modem é uma mulher forte, independen­te. Isso para mim é muito importante. Não é uma mulher que se veste para o homem, se veste para ela, tem sua própria atitude”, diz o estilista, pontuando a questão do feminismo, outra causa do momento.

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FOTOS SEBASTIAO MOREIRA/EFE Urbana. Look da marca Lilly Sarti, que abriu a SPFW
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Natural. O verão da Osklen, inspirado nos oceanos

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